Salvador e o enredo
das demolições consumadas.
O centro histórico sangra
Foto: Mídia NINJA
Por Ninja
O maior centro negro do mundo fora da África, erguido por mãos negras escravas e hoje ocupado por seus descendentes, vive, ironicamente, um processo de faxina étnica. 31 imóveis localizados nas Ladeiras da Conceição, da Preguiça e da Montanha, incluindo os tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), já foram demolidos. Com conivência e apoio da Prefeitura e do próprio Iphan – orgão responsável por preservar, divulgar e fiscalizar os bens culturais brasileiros -, o Plano de revitalização implantado para o centro antigo da cidade, viabiliza práticas excludentes e possui pilares racistas.
Esse Plano, idealizado e construído pelo Governo do Estado e sem a participação da população, tem mostrado um claro intuito de embranquecimento do local, na tentativa de expulsão de comunidades negras que ocupam locais estratégicos no centro da cidade. R$300, ameaças, portas arrombadas e armas de fogo é o apoio social dado às famílias que têm suas casas demolidas.
Foto: Mídia NINJA
A Superintendência do IPHAN na Bahia, dirigida por Carlos Amorim, por sua vez, alega a responsabilidade dos proprietários dos imóveis para com sua preservação e manutenção, e afirmou que busca a identificação destes para responder, através de ação judicial, por danos irreparáveis ao patrimônio histórico cultural. Ora, é de conhecimento do Instituto que os casarões estão abandonados há décadas e que as famílias que habitam essas propriedades estão ali justamente por não terem condições de arcar com despesas inerentes a locação imobiliária.
O assessor especial do Ministério da Cultura, Armando Ferreira de Almeida Junior, esteve presente durante o ato realizado no dia 31 de maio – em defesa do Centro Antigo de Salvador -, na Ladeira da Conceição, para dialogar com moradores e movimentos sociais presentes. Em entrevista à Mídia NINJA, Armando alegou que estados e municípios, e não só a União, têm responsabilidades na preservação do patrimônio histórico. E reconheceu que, até hoje, esse patrimônio brasileiro não teve a devida prioridade. Na certeza de que ações precisam ser tomadas, o assessor se mostrou favorável à proposta de realizar uma audiência pública sobre as remoções e a especulação imobiliária da primeira capital do Brasil Colônia, e colocou os serviços do Ministério da Cultura à disposição.
Já a Prefeitura – atualmente sob o comando de Antônio Carlos Peixoto de Magalhães Neto, do DEM (Democratas) -, se mantém no descaso; aguarda catástrofes (como as chuvas de maio¹) para colocar em prática seus interesses políticos.
Esse território tem dono
Foto: Mídia NINJA
A ferida pulsa e sangra no coração histórico de Salvador. Os becos e ladeiras chegaram até aqui em condições precárias, marginalizados pelo governo, e vivo graças à força criativa de quem o habita(ou). O processo de revitalização colocado em prática possui evidentes interesses no mercado imobiliário.
Sobre a nova Salvador, tememos a dizer: ironicamente racista, irresponsavelmente excludente, defensora de políticas elitistas, segregada e fatalmente mais violenta. Sem diálogo e sem respaldos técnicos legítimos o Iphan comete um crime irreparável à cultura histórica da Bahia e, consequentemente, do Brasil.
Na veia das diferenças sociais, apenas mais uma questão: para onde vão essas pessoas?
¹ – Salvador recebeu, no mês de maio, um dos maiores volumes de chuva dos últimos 20 anos, que deixou mil famílias desabrigadas e o total de 21 mortes – além de 12 desabamentos de imóveis e 90 deslizamentos de terra, segundo dados do Iphan.
Fonte: Mídia NINJA
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