ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL A TARDE EM 2010
E nossa cultura popular? Alguém
pode informar qual órgão se dedica especificamente a ela? Apostamos que não.
Não existe, em todo o estado da Bahia, um único espaço reservado à documentação,
memória e resgate das expressões culturais do povo baiano. Em exposição
encontrar-se-ão, talvez, umas poucas peças de caráter comercial no Instituto
Mauá, muitas vezes sem especial relevância e com total deficiência de pesquisa.
A italiana arquiteta Lina Bô Bardi bem que tentou constituir, no início dos
anos 60, um acervo de qualidade. A ditadura militar, o evidente desinteresse
dos governantes locais por qualquer coisa que não tivesse o glamour europeu ou norte-americano,
relegou o acervo aos porões do Solar do Unhão, e não se falou mais nisso.
Temos
algo comparável à pernambucana Fundação Joaquim Nabuco, ao carioca Museu do
Folclore Edson Carneiro, ao mineiro Museu de Artes e Ofícios? Nada! A coleção Pardal de carrancas hoje pertence a
um colecionador português.
A maioria dos centros de olaria do
Recôncavo e do interior, fossilizada, está sobrevivendo no ostracismo, as
rendeiras de Saubara só podem contar com uma Márcia Ganem, dentro de seu
potencial de mercado.
E os outros? Os que fabricam brinquedos, apetrechos de
couro, cestas, mocós e balaios, montarias para jegues e cavalos, ferramentas? E
as expressões e iniciativas privadas, que podemos rotular de artes espontâneas:
gravadores, escultores e pintores que, sem o mínimo apoio, acabam massificando
a produção para o predador mercado de turismo?
Precisamos documentar, sem mais
demora, as danças, as procissões, as rezadeiras, as festas de largo, os
curandeiros, os fazedores de máscaras, as lendas e crenças, o cancioneiro dos
morros, das praias e da caatinga, os carnavais, as receitas tradicionais – passando
por conventos, mosteiros, ocas e terreiros - as pinturas dos caminhões e
carroças, o delicado e forte emaranhado dos vendedores ambulantes, tanto urbano
como interiorano, os garimpeiros, pastores e boiadeiros.
Temos um material tão
rico e tão ignorado! Respeitar um povo é também respeitar suas expressões. Sua
essência.
Dimitri
Ganzelevitch Salvador, 21 de maio de 2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário