quarta-feira, 22 de junho de 2016

NO AZUL DO CÉU, O PRECONCEITO


O avião não saía da pista do Santos Dumont. Iríamos aguardar, por motivo desconhecido, ainda uma boa meia-hora antes de voar para Salvador. Aproveitei a porta aberta e a escada ainda colada ao aparelho para respirar um ar de pureza duvidosa na pequena plataforma metálica. Nunca me acostumei ao ar condicionado / ar morto. Um conhecido político baiano negro já lá se encontrava, encostado ao corrimão. Nos cumprimentamos, estabelecendo efêmero diálogo. Mas eu não iria deixar passar a relativa intimidade do momento sem abordar um assunto que me incomoda há anos e que muitos leitores já devem ter notado. Porque as companhias aéreas brasileiras nunca contratam negros como comissários de bordo ou aeromoças? À medida que ia desenvolvendo meu questionamento, constatei o sorriso circunstancial do político desaparecendo, o olhar ficando mais distante até o homem, sem a mínima cerimônia, virar as costas sem mais me dirigir uma única palavra.

Entendi então porque, apesar de bom preparo acadêmico, o tal não havia tido uma trajetória mais relevante, pulando, aos acasos dos ventos ideológicos, de partido em partido como pardal em jardim público. Se, na questão sempre atual da descriminação, um homem que poderia – e deveria - levantar a bandeira da luta contra o preconceito, fugia com absurda covardia de tão escancarada manifestação de racismo, quem iria enfrentar o lobby de nossas companhias?

Mas estas têm um inesperado cúmplice no preconceito: La Cubana de Aviación, como averiguei durante os dois voos que fiz com aquela companhia. Aliás, durante as duas semanas passadas na ilha dos Castro, mais de uma vez pude constatar que o racismo lá também é banal e corriqueiro.

Até que, em princípio de abril, me deparei no Espaço do Leitor deste jornal, com o oportuno protesto “Além do caso de Érico Brás”, assinada pelo longínquo amigo, sociólogo Johannes Augel. Evidenciava exatamente o mesmo e inadmissível problema. Até quando, este atestado de burrice?


Um comentário:

  1. Essa é uma questão que penso será eterna, a luta do branco x negro x negro x branco x branco x mulato ....
    Será que alguém, algum dia ai conseguir acabar?

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