quarta-feira, 16 de setembro de 2015

INIMIGOS DA SAÚDE

                                                 FREQUENTAM NOSSA MESA

Avião pulveriza plantação de soja no Piauí. Foto: Marcio Fernandes/Estadão (2006)


Na sociedade contemporânea, praticamente não há ninguém que não tenha um conhecido, um amigo ou um parente padecendo de males como Alzheimer, Parkinson ou autismo. Apesar de todo o avanço científico, esses problemas continuam definidos como incuráveis. Você sabia que um dos agentes geradores desses sofrimentos pode estar todo dia à sua mesa, nas refeições que você prepara? O coordenador geral do Centro de Pesquisa Mokiti Okada e diretor industrial da Korin, Luiz Carlos  Demattê Filho, médico-veterinário e com doutorado em Ecologia Aplicada pela ESALQ, identifica esse vilão e mostra po que o CPMO, em parceria com a Korin, vem desenvolvendo um esforço que já granjeou reconhecimento nacional e internacional.

IZUNOME: Qual a situação do Brasil no panorama agrícola mundial?

O Brasil figura entre os maiores produtores num mundo cada vez mais globalizado. Grande parte da produção (no ano-safra 2014/2015 foram colhidas mais  de 200 milhões de toneladas de grãos), alcança o mercado externo. Isto nos torna também o maior consumidor de agrotóxicos e o segundo maior produtor de grãos geneticamente modificados, atrás apenas dos EUA em termos de área agrícola e de produção total.

A liberação do plantio transgênico não mudou essa realidade?

Pelo contrário. A relação entre essa liberação, em março de 2005, e o aumento acentuado de agrotóxicos que se seguiu a ela é um fato bastante conhecido, francamente contrapondo-se ao discurso de  que os transgênicos, uma vez autorizados, iriam gerar redução do uso de agentes químicos.
O aumento é tão expressivo, que hoje somos líderes mundiais no consumo de agrotóxicos, mesmo considerando que nossa produção é menos da metade da safra norte-americana. Infelizmente, o Brasil caracteriza-se por ser extremamente permissivo e tolerante no uso e aplicação de agrotóxicos.

Qual o impacto dessa situação no cotidiano das pessoas?

É obvio que isso traz consequências à saúde, não apenas das pessoas mas também dos animais e do meio ambiente em geral.
Algumas destas graves consequências já são bem conhecidas, como é o caso das intoxicações agudas em trabalhadores rurais, passando pelos problemas de fertilidade que cada vez mais afetam os jovens. Outras, no entanto, são muito menos conhecidas e relacionam-se intimamente com o aumento das áreas de transgênicos.

Pode citar um exemplo?

As plantas transgênicas foram desenvolvidas para resistir aos herbicidas, substâncias que matam o mato, como o glifosato, que é o produto mais utilizado. Ele entra nas células das plantas e impede seu processo normal, o que acaba por matá-las. Os fabricantes dizem que o glifosato não é tóxico para homens e animais, pois obviamente n~~ao somos feitos de células vegetais.

Isso é verdade?

É e não é. O que ocorre é que as bactérias que habitam nosso intestino possuem os mesmos mecanismos das células vegetais, ou seja, são, sim, afetadas pelo glifosato. O resultado é semelhante ao que acontece com o uso de antibióticos. Um tipo de microrganismo é destruído, enquanto outros não são afetados, e isso altera o equilíbrio bacteriano. O problema é que eles são fundamentais para a nossa nutrição e saúde.

O contato, seja pela aplicação ou pela ingestão desse tipo de agente, causa algum tipo de doença?

Pesquisas avançadas relacionam nossa exposição ao glifosato com o aumento descomunal do autismo, assim como de outras doenças de origem neurológica como o Alzheimer e a doença de Parkinson. Para ilustrar, dados dos EUA mostram que, em 2007, havia uma a cada 150 crianças inseridas no espectro do autismo; em 2009, já era uma a cada 100, e uma a cada 50 em 2013, o que leva à tenebrosa previsão de que, em 2025, em cada duas crianças, uma estará inserida no contexto do autismo.
De que forma o glifosato atua no organismo humano?

A teoria que relaciona o evento do autismo ao glifosato é igualmente complexa, mas vale a pena entender um pouco. As pessoas pensam nas bactérias sempre nos seus aspectos negativos. Hoje, sabemos: elas são imprescindíveis à nossa vida.
Alguns aminoácidos, sobretudo os que possuem enxofre em sua molécula, são sintetizados no intestino pela ação de bactérias. É o caso da tirosina, do triptofano e  da metionina. A tirosina é essencial para a síntese de dopamina, adrenalina e da melanina.  O triptofano é indispensável à síntese da serotonina e da melatonina; esta última, fundamental ao sono. E a metionina é um aminoácido imprescindível, com uma ampla utilização em nosso organismo.
A serotonina, a dopamina, a melanina e a melatonina são substâncias naturais em nosso organismo e vitais para a saúde de nosso cérebro e de nossa dimensão emocional. O desequilíbrio dessas substâncias leva à depressão, à agressividade, à hiperatividade, à insônia, à obesidade e, finalmente, às doenças neurológicas que citei anteriormente.

Um problema puxa o outro?

Exato. Uma inflamação crônica do intestino, por exemplo, resultado da alteração microbiana, acaba levando à deficiência na produção de neurotransmissores, que são importantes para a nossa saúde. Um efeito talvez nunca pensado, mas que estudos e pesquisas científicas avançadas têm-nos forçado a reconhecer.

Como modificar essa realidade?

Ao observar a relação entre o uso de antibióticos na produção animal e o de herbacidas na produção de grãos, constatamos que ambos causam deanos irreparáveis ao equilíbrio que devemos buscar com todos os seres da Natureza; nestes casos, simples bactérias sem as quais não existiríamos. É nessa convivência cooperativa que o Criador fundamentou nossa sobrevivência e nossa felicidade nesse planeta. Cabe a nós, portanto, buscar formas de produzir e colocar à disposição da sociedade alimentos em consonância com tais leis universais. Nisso reside o  profundo significado da Agricultura Natural.

Fonte: Revista IZUNOME nº 90 – Agosto / 2015, p.24/25
Fundação Mokiti Okada– CPMO (Centro de Pesquisa Mokiti Okada)


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