sexta-feira, 25 de setembro de 2015

ALGO ERRADO NO INHOTIM

Caros amigos. 
Na quarta-feira desta semana, vários amigos entraram em contato para 
saber sobre a história que se segue e se eu tinha algo a ver com isso. 
O site diz tudo por conta própria, sigam o link: 


Em 2009, fui convidado para trabalhar no Instituto Inhotim. 
Até então, era um lugar belíssimo, com um museu de arte contemporânea e o interesse em gastar para estruturar uma coleção de plantas. 
Percebi que era o momento perfeito de tentar criar um novo jardim botânico, com dinheiro e força política para alavancar os outros Jardins Botânicos no cenário brasileiro. 
Eu acredito em Jardins Botânicos ! 
Envolvi-me profundamente na empreitada e conseguimos (eu, minha esposa e vários parceiros idealistas) estabelecer um jardim botânico com uma estrutura incomum, mesmo para padrões internacionais. 
Quando escrevi pessoalmente cada palavra da missão que consta no site oficial, cristalizei aquilo que pensei ser a missão do jardim botânico perfeito. 
Instituímos uma área de pesquisa, contatamos outros jardins, intercambiamos plantas e trabalhamos em importantes projetos de resgate em áreas sujeitas a supressão de vegetação. 
Em 2010, lançamos o Jardim Botânico Inhotim, com uma bela cerimônia e presença da Rede Brasileira de Jardins Botânicos (e muitos de vocês...). 
Em 2011, sediamos a própria reunião da RBJB. Era um sonho concretizado. 
Mas nem tudo são flores... 
Quando cheguei para trabalhar no Inhotim, o Sr. Bernardo Paz (o proprietário) costumava comprar plantas retiradas da natureza sem autorização, em grandes quantidades. 
Por mais que tentássemos convencê-lo a mudar esta prática (pois sabemos que existem alternativas sustentáveis) não consegui mudar esta cultura. 
Achei que a criação do Jardim Botânico simplesmente traria outras possibilidades para a obtenção legítima de material botânico. 
Nós da área de meio ambiente esclarecemos aos diretores (executivo, financeiro e jurídico) que a simples conversão do Instituto a Jardim Botânico obrigaria a suspensão destas práticas. 
A proposta foi prontamente apoiada por estas instâncias, por dois motivos. 
Sair da ilegalidade e redução de gastos (cada carreta de palmeiras custava R$ 50.000,00 e isso abalava as contas do instituto). 
Sugerimos um termo de ajuste de conduta, para "zerar" o passivo. 
Mas não adiantou... 
Então expliquei que, era possível retirar plantas da natureza, desde que em pequena quantidade (de preferência na forma de sementes) e com autorização. 
Falei sobre resgate de flora, como forma de obter exemplares adultos. 
Mostrei que existia o SisBio e todo o protocolo. 
Nós, os curadores, chegamos a escrever cartas tanto de alerta quanto de repúdio (envio a quem quiser ver) em relação a estas práticas. 
Mas foi em vão. 
Hoje, vejo o jardim botânico que visceralmente ajudei a criar, usando autorizações "oficiais" para retirar três carretas de palmeiras, ainda mais em uma área de vereda, que são protegidas por lei por serem APPs. 
Sei que ninguém do ICMBio (em sã consciência) daria autorização para tal empreitada. 
Para multiplicar esse material, bastava apenas três a cinco plantas adultas e bem cuidadas, desde fossem escolhidas plantas geneticamente distantes. 
Sempre achei que jardins botânicos deveriam ter autorização absoluta de coleta, pois ninguém mais que nós sabe como podemos retirar plantas para conservação ex situ sem destruir uma população. 
Hoje vejo uma instituição usando os recursos legais (que eu e outros mostramos) para extrair plantas da natureza para fins pouco nobres, como completar o paisagismo. 
Para isso, existem viveiros comerciais, que multiplicam legalmente seus plantéis. 
Hoje biólogos e outros profissionais são usados de "laranjas" e o ICMBio usado como "parceiro". 
É o mais autêntico caso de Greenwashing que eu conheço.. 
Devo explicar-me. 
Até então, calei-me por questões contratuais, mas descobri recentemente com advogados que não preciso me calar sobre questões de ilegalidade. 
Não sou mais curador do Inhotim e nunca compactuei com estas ações. 
Mas devo satisfações a vocês, que me ajudaram quando eu tinha um sonho na cabeça. 
Eu ajudei a criar um monstro e posto aqui o meu mea culpa. 
Atenciosamente, 
Eduardo. 


Prof. Dr. Eduardo Gomes Goncalves 
Depto. de Botânica, ICB, UFMG 
Av. Antonio Carlos, 6627, Pampulha 
31.270-901, Belo Horizonte, MG, Brasil 
Fone: (31) 3409-2689 
Fax: (31) 3409-2684 

eduardog@ufmg.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts with Thumbnails