A cada vez mais vasta criatura empresarial a que o jornal El País, esta semana, chamou “Rainha de África” e “Imperatriz de Portugal” (estes espanhóis ainda a têm entalada, preocupem-se é com a Catalunha, por este andar nem com uma OPA hostil a seguram…) é famosa por ser discreta. Os artigos de imprensa sobre Isabel dos Santos dizem sempre que pouco se sabe sobre os seus hábitos. Um dos seus maiores hábitos, como se vê, é dar origem a artigos vagos.
Aos 41 anos, a mulher mais rica
de África tem uma existência simples e límpida como a maior parte dos
seus súbditos. Nega, com razão, que o sucesso nos negócios se deva à
protecção e influência do pai, o Presidente Eterno
de Angola, José Eduardo dos Santos.
O êxito explica-se porque trabalha
“sete dias por semana” e porque estudou “Matemática e Engenharia” no King’s College de Londres, como qualquer garota de
musseque. E não esquecer que veio ao mundo em Baku, na ex-República Socialista Soviética do
Azerbaijão, em Abril de 1973, com uma cabeça estratégica herdada da sua mãe,
Tatiana Kukanova, campeã soviética de xadrez, situação banal entre as
lavadeiras do mercado do Roque Santeiro.
A
sua vida simples é finalmente revelada em exclusivo mundial: muito cedo de manhã,
ainda antes da abertura da bolsa de Wall Street, Isabel levanta-se, toma
o pequeno-almoço e telefona ao pai, José Eduardo dos Santos (conhecido em meios
populares e monárquicos como “Eduardo, o Povoador”), e
pergunta-lhe se aquele negócio é para avançar.
Ele só diz - Sim,
filha, mas acordaste-me.
porque
fala pouco. Ela acaba a torrada com manteiga de leite de palanca, se é que isso há, deve haver. A seguir, Isabel faz uma série de
levantamentos com pesos dourados, confere cotações nas telecomunicações,
lembra-se de uma coisa e telefona ao pai para ver se ele concorda com aquele
investimento na Namíbia, ai perdão, no Algarve, e o pai diz
—
Sim, filha, mas estava a meio de um sonho bonito
porque
é muito reservado. A seguir, Isabel mergulha e refresca a cara num discreto
pote de diamantes da Lunda-Norte, que um dia (já que as pessoas que os extraem
de sol a sol não ligam muito a coisas vãs), enfeitarão o pescoço de mulheres da
Europa, da Rússia, dos EUA, que partilham o gosto pelos luxos simples da vida.
Mesmo assim, estas senhoras não conseguirão casar-se no Palácio da Presidência
de Luanda em cerimónia que em 2002 terá custado quatro milhões de dólares. Nem
toda a gente pode ser dona de entre três a quatro mil milhões de dólares
(cálculos da revista Forbes) como a engenheira Isabel.
Dizem que só nos
talheres e cutelarias da boda se gastou um milhão, mas é com certeza mais
mentira dos opositores, dos que atacam a elite angolana e o regime. Quem?... Os
opositores do regime. Quem?... Os opositores do regime! Mas quem, afinal? Os
opositores do reg... ora, deixe lá, não vale a pena, adiante.
Mais
tarde no dia de trabalho, Isabel irá a despacho, por coincidência com o pai.
Ele já falou tudo o que tinha a dizer num dia inteiro. Só franze as
sobrancelhas quando pede a alteração de uma alínea dos estatutos da
administração de uma nova holding criada, sem qualquer interferência ou empurrão
dele, pela filha super-empresária.
José
Eduardo dos Santos nunca facilita. É público e notório que ele não é Miguel
Relvas, basta ver uma fotografia dos dois.
A
seguir, “cansada mas satisfeita” como um clássico lead de jornal diário, Isabel
janta à luz de candeeiros alimentados a petróleo de Cabinda. Um ambiente
refinado, típico de lounges, hotéis, restaurantes e discotecas finas em que a
sua engenharia empresarial foi investindo aqui e ali e acolá, num xadrez
matemático ao longo dos anos.
É
por isso que é falsa, falsa, falsa a acusação recente da revista Forbes (a
mesma revista dos mais ricos a fazer uma desfeita destas): “Tanto quanto
podemos investigar, todos os grandes investimentos angolanos detidos por
(Isabel) dos Santos vêm ou de ficar com uma parte de uma empresa que quer fazer
negócios no país ou de uma assinatura presidencial que a inclui na acção.” E a
filha do Presidente é “uma janela rara para a mesma e trágica narrativa
cleptocrática que estrangula os países ricos em recursos em todo o mundo”.
Nesse
caso como se explica que o talento de Isabel dos Santos esteja a construir em
Portugal um império que envolve o BIC (herdeiro do nosso saudoso BPN), a Galp,
o BPI de Fernando “aguenta ai aguenta” Ulrich?
E
que agora, depois de já ter na mãos as telecomunicações da NOS, em parceria com
a Sonae de Paulo de Azevedo, se atire a uma OPA sobre a PT SGPS, apoiada pela
Caixa Geral de Depósitos e com planos para salvar a PT Portugal de franceses e
americanos — a PT Portugal que aliás é brasileira! Pertence à Oi por causa das
barracadas de Zeinal Bava e Henrique Granadeiro com o amigo Ricardo Salgado do
BES! —, e agora é que o engenheiro Belmiro se vinga daquela OPA falhada sobre a
Portugal Telecom, há uns tristes anos, vai-se ver que é agora.
Há
dúvidas sobre a matéria, não perceberam bem estes números? Tirassem Matemática
e Engenharia no King’s College.
Quanto
a ver a NOS e a MEO nas mesmas mãos... Bem, é parecido com juntar a
“plataforma” MPLA com a “plataforma” UNITA. Isto é que vai ser alta tecnologia com
cenas a andar para trás e para a frente, com o comando ninguém vai perder a
melhor parte do filme. As acções da PT começaram a subir, essa é que é essa. E
os irmãos brasileiros a tremerem de medo e raiva. A proposta de Isabel é
“inaceitável”. Qual a estratégia futura para a PT e a MEO? Os Gato Fedorento
foram vistos esta semana a descer o Chiado disfarçados de músicos negros do
Caribe. A resolução da OPA vai meter salsa, rumba e chachachá?
Calma
e ponderada, Isabel faz o seu percurso próprio. Outros descem a Avenida da
Liberdade em Lisboa com sacos de compras, outros ainda atravessam a vida em
Angola com dois dólares por dia.
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