Meu rei, tô indo, que eu não aguento mais Salvador
Bruno Athayde, da VOCÊ S/A
São Paulo - No mês passado, algumas imagens das ruas de Salvador foram parar no Facebook. As cenas urbanas mostravam prédios degradados, lixo pelas calçadas — tinha até cavalo morto na guia — e trânsito intenso em diversos pontos da cidade, da Igreja do Bonfim ao Farol de Itapuã, dois extremos que estão separados por quase 40 quilômetros.
As imagens foram feitas pelo sistema de mapeamento do Google, o Google Street View. O que se seguiu à pulverização das imagens na rede social foi uma avalanche de comentários — muitos negativos e alguns defendendo as riquezas culturais e naturais da cidade.
"Não há nenhuma novidade nas fotos e a obviedade dos problemas não poderia deixar de aparecer", resumiu o engenheiro carioca André Lemos, de 47 anos, professor da Universidade Federal da Bahia, que há anos mora na cidade.
O episódio reacendeu questões que vêm incomodando os moradores de Salvador. A capital baiana está entre as piores do Brasil em quesitos que afetam a vida do trabalhador soteropolitano, mostra uma pesquisa divulgada em julho pela ONG Proteste.
O estudo ouviu 2.200 homens e mulheres com idade de 18 a 74 anos — a maior parcela tem entre 35 e 54 anos, alto índice de escolaridade e pertence à classe média, afirmam os coordenadores do levantamento. O objetivo do trabalho foi comparar a qualidade de vida de 21 capitais brasileiras, de acordo com a percepção de residentes dessas cidades.
Salvador foi a mais mal avaliada nos quesitos habitação, que mede a oferta de moradia, e mobilidade, que leva em conta a qualidade do transporte público e da infraestrutura viária. A capital baiana ficou na segunda pior posição nos quesitos segurança, emprego e saúde. No item educação, Salvador ficou com a terceira pior colocação.
De acordo com a pesquisa do Proteste, esses problemas já incomodam os profissionais mais jovens, que vão buscar oportunidades de trabalho em outras cidades.
Segundo RHs e recrutadores locais, ainda não existe um êxodo de profissionais e de empresas de Salvador, como aconteceu no Rio de Janeiro em meados de 2000, quando IBM, CSN, Aracruz, Claro e Peugeot trocaram a Cidade Maravilhosa por outras paragens. Porém, as questões que motivaram a saída de companhias e dos cariocas são as mesmas que incomodam os baianos: falta de segurança e baixa perspectiva de carreira.
Sete de cada dez moradores de Salvador evitam sair à noite ou chegar muito tarde em casa por causa da criminalidade. Seis de cada dez deixam de ir a certos bancos e caixas eletrônicos com medo de ser roubados. Os dados são de uma sondagem realizada com 75 000 pessoas, de 2009 a 2010, pelo Datafolha.
Em julho, Salvador perdeu para Recife, capital de Pernambuco, a liderança do ranking do desemprego, elaborado pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). A capital baiana saiu da primeira para a segunda posição, com 20,4% de desempregados.
"Esse é o primeiro mês em que isso acontece [desde julho de 1997, então é muito cedo para dizer que é permanente", diz a economista Vânia Moreira, da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. A economista Ana Margaret Simões, do Dieese, acrescenta que, embora Recife tenha uma taxa de desemprego maior (21,6%), as empresas da capital pernambucana geraram mais postos de trabalho.
"Lá, foram 19.000 vagas em julho, enquanto em Salvador foram 4.000. Em Recife houve um crescimento da população economicamente ativa e aqui ficou estável", diz.
Recife tem uma economia mais pujante que a de Salvador. A grande estrela da região metropolitana da capital pernambucana é o Porto de Suape, que atrai investimentos nacionais e internacionais. As cidades do Nordeste atraíram 93 projetos estrangeiros entre 2007 e 2011, vindos de investidores dos Estados Unidos, da Inglaterra, do Japão e da França.
Mais de 50% desses empreendimentos tiveram Suape como destino, mostra a pesquisa Brazil Attractiveness Survey 2012, realizada pela Ernst & Young Terco. Salvador depende do desempenho dos setores de óleo e gás e turismo.
Mesmo assim, as taxas de ocupação dos hotéis estão em queda. A de julho, ante o mesmo mês de 2011, foi negativa em 3%, segundo estudo com 25 hotéis da capital baiana. Nem o lazer e a boa festa têm dado alegria aos soteropolitanos.
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