A vulnerabilidade do corpo
A nudez na obra de Lucien Freud repele a idealização e abraça a ideia da mortalidade.
Lucian Freud morreu em 20 de julho de 2011, aos 89 anos, e dedicou sua longa carreira à pintura de figuras humanas e retratos da vida, ignorando todas as tendências do mundo da arte de sua época.
Muitas de suas imagens são de pessoas e/ou animais em sua cama, preparados para o sono ou para uma longa noite de insônia. Ele sempre pintou com modelos vivos, preferindo amigos ou membros da família à profissionais. Ele trabalhava bem devagar, de forma que as poses para dormir eram uma forma de descanso para os modelos.
O que impressiona na verdade, é a intensidade do conflito presente nas imagens de pessoas relaxadas em camas e sofás. Talvez esse sentimento de agitação surja da luta incansável de Freud para ver mais profundamente e capturar na pintura a intensidade de sua própria experiência visual. Para Freud, cada tela era uma luta contra um poderoso inimigo.
A carnalidade de sua pintura pode ser uma distração, mas vai muito além da sexualidade que se espera da nudez. Ele trata a figura como uma paisagem a ser explorada longamente pelo toque e movimento.
Freud amava os animais e muitas vezes usou seus próprios cães comos modelos. Ele disse a William Feaver, que escreveu um livro sobre a obra de Freud: "Eu estou realmente interessado em pessoas como animais. Parte do meu gosto de trabalhar com o nu é por esse motivo. Porque eu posso ver mais, e também é muito emocionante ver as se formas repetindo através do corpo e muitas vezes na cabeça também. Eu gosto de pessoas com um olhar tão natural e tão fisicamente à vontade como animais, como Plutão meu whippet. "
A pintura abaixo é uma das obras mais conhecidas de Freud - um record do maior preço pago por uma pintura à um artista vivo. Ele foi vendido na Christie em 2008, por 33,6 milhões de dólares.
Observe como a modelo parece mais velha, obesa e cheia de marcas na pintura do que na fotografia. Os retratos feitos dos modelos de Freud mostram que a sua visão estava além da matéria. Muitos pintores figurativos faziam exatamente o oposto, omitindo contusões, calos e veias visíveis, sutilmente idealizando do corpo. Os mais sensíveis podem até se sentirem repelidos pelas figuras retratadas por Freud, com a sua sexualidade e mortalidade tão descaradamente exibidas. Mas este é justamente do trabalho que lhe dá o poder espiritual. É a essência da condição humana.
Lucian Freud era neto de Sigmund Freud, o progenitor da psicanálise. Assim como Sigmund Freud que passou centenas de horas com seus pacientes deitados em um sofá, tentando penetrar em suas mentes e interpretando seus sonhos, Lucian Freud também passou centenas de horas com seus modelos deitados em um sofá, mas ele manteve um intenso foco na superfície. Provavelmente ele sentiu que o corpo físico, visto de forma verdadeira, poderia revelar profundezas ocultas.
Freud disse: "Meu trabalho é puramente autobiográfico ... É sobre mim e sobre o meu entorno. Eu trabalho com pessoas que me interessam, com quem me preocupo, em salas que eu conheço."
Além da enorme quantidade de tempo gasto com seus assistentes, ele só viria a trabalhar com pessoas de quem ele realmente gostava - ainda assim, evitou qualquer sentimentalismo ou idealização.
Os modelos de Freud deveriam aceitar que ele retrataria cada uma de suas falhas, revelando assim, sem pesar ou arrependimento, a mortalidade de cada um.
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