Mais um escândalo na República!
Corrupção e baixarias de caso que envolve Rosemary e Lula deixam outros escândalos pequenos: quarenta volumes de inquérito policial e processo judicial podem revelar escárnio com opinião pública
WELLITON CARLOS
DIÁRIO DA MANHÃ
10/12/2012 às 21h3
Esqueça o escândalo da mandioca, os anões do orçamento, mensalão, caso Cachoeira. Tudo fica pequeno frente a uma série de fatos que envolvem Rosemary Noronha (ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo), Lula e José Dirceu, além, claro, de inúmeros envolvidos (como Paulo Vieira, ex-diretor da Agência Nacional das Águas (ANA) e um dos interlocutores dos rolos tornados públicos por Rose).
Muito ainda deve ser divulgado nas próximas semanas, conforme a estratégia conta-gotas da Polícia Federal (PF) em revelar os bastidores do que pode ser o maior escândalo da história da República. É tudo cinematográfico: existem poucas gravações telefônicas, mas muitas fotos, e-mails e depoimentos que devem esquentar os bastidores da política brasileira. A fotonovela tem uma história de amor, drama político (se Dirceu será preso ou não) e potencialmente bandidos espalhados em diversos órgãos públicos. Cerca de 40 volumes de documentos foram entregues para a Justiça, que prepara os procedimentos iniciais para julgar o caso.
Os documentos emanados pela Operação Porto Seguro, que mantém completamente emudecidos os petistas, podem tornar pequenas as cifras e questões criminais referentes aos escarcéus que abalaram a República nas últimas décadas. Além de um suposto romance tórrido nos céus do Brasil e do mundo, inúmeras abordagens da corrupção realizada dentro da gestão de Lula e que ainda ecoavam na era Dilma Rouseff serão tema de um processo judicial que deve começar ainda este ano. O processo tornará público o que a Polícia Federal é obrigada a manter em sigilo, devido a característica de sigilo do inquérito policial.
Os novos desdobramentos devem lançar luzes ainda mais potentes na personagem central, a amiga ‘íntima’ de Lula e no próprio ex-presidente. Quem diria, Rose, que ninguém conhecia, era capaz de agendar encontros com ministros como José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luis Adans (ministro da Advocacia Geral da União), interferir em licitações, ajudar juiz a virar desembargador e mexer com a testosterona do presidente Lula.
Conforme Carlos Alberto Di Franco, diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciência Sociais (IICS), a imprensa não costuma tratar das relações amorosas paralelas de políticos brasileiros. "O jornalismo brasileiro, ao contrário da imprensa norte-americana, por exemplo, tende a preservar a intimidade dos homens públicos. As escapulidas dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek e João Figueiredo, conhecidas e comentadas nas rodas de jornalistas, nunca migraram para as manchetes dos jornais", afirma em artigo.
Contudo, ele diz que o "caso Lula" é diferente: "Segundo a Polícia Federal, Rose conseguiu, entre outras coisas, colocar, em postos estratégicos do governo, amigos corruptos, que vendiam pareceres jurídicos favoráveis a empresários."
Mundo privado no público
De acordo com o cientista político e doutor em política pela Universidade de São Paulo (USP), Itami Campos, o caso é mais uma demonstração da invasão da vida privada na pública: "O Estado mistura a vida privada com a pública, as relações familiares migram para dentro da administração. No Brasil, é forte a cultura política do clientelismo, entre as famílias", diz.
Itami diz que o caso é diferente da relação que Fernando Henrique Cardoso teve em pela gestão da presidência. "Naquele momento, a esposa do FHC exigiu que a repórter Miriam Dutra se mudasse para Europa. Foi diferente", disse.
Aqui foi realmente diferente. Lula é que adotou a estratégia de sair do Brasil, para evitar a pressão da imprensa quanto ao escândalo. Nesta semana, as revistas semanais voltaram a repercutir o episódio com força total. A Veja trata de "Poder Paralelo" o que se passa no Brasil, tendo uma descrição minuciosa de um esquema que envolve banhos na praia tendo ao lado José Dirceu e Rose, tentativas de intimidação e inúmeras promiscuidades públicas.
Oficialmente, Rose é considerada "amiga íntima" de Lula. Até certo ponto, a libertinagem seria organizada. Reportagens da Folha de S.Paulo identificam que ela não participou de nenhuma viagem, por exemplo, quando a mulher de Lula, Marise, estava na comitiva presidencial. No entanto, bastava Marise Letícia não estar no grupo para Rose ser convidada e ter livre acesso ao endereço presidencial no Aerolula. O relacionamento teria gerado extremo mal-estar entre Lula e Marise, incluindo toda a equipe que realizava o cerimonial do ex-presidente.
Procurado pela reportagem, a assessoria do Instituto Lula disse que ele não comentará assuntos particulares. Conforme Reinaldo Azevedo, em um dos blogs mais populares do Brasil, "Lula e Rosemary, no centro de novo escândalo, eram amantes desde 1993".
Conforme os analistas políticos, o poder de Rose se deve exatamente à relação ‘íntima’ que manteve com Lula por quase duas décadas. No governo, dizem que ela mandava e intrometia mais do que a esposa do ex-presidente – dona Marise.
Nesta semana, novos documentos revelam a capacidade dela se articular no grupo. Uma foto revela Rose na Bahia tomando banho com José Dirceu em plena explosão de penas do mensalão. A imprensa fez questão de computar o ‘custo’ da imagem: a bermuda de José Dirceu, da marca francesa Vilebrequim tem valor próximo a R$ 600. A namorada de Dirceu, por sua vez, usava óculos Prada, também de valor inacessível para integrantes de um partido que se diz dos 'trabalhadores'.
No grupo, Rose desempenha um papel peculiar: psicóloga amiga de criminoso. Em certo momento teria levado José Dirceu – tenso com o julgamento do mensalão – para comprar roupas. "Fiquei feliz. Levei ele ao Ricardo Almeida à tarde para fazer umas roupas que ele estava precisando, e achei ele melhor, porque ultimamente ele andava muito nervoso. Achei um astral melhor", disse Rosemary a Paulo Vieira, um dos agentes públicos envolvidos até a alma com as acusações apuradas pela Polícia Federal.
Um diálogo interceptado pela Justiça e Polícia Federal mostra que Rose se achava uma espécie de ideóloga do PT. No caso, ela conversava com Paulo Vieira.
Paulo – Esse pessoal da direita só quer ferrar com a gente. O certo agora sabe o que deveria ser? (...) Nós tínhamos que fazer um protesto pela transparência na Justiça, pelo tratamento uniforme (...). Está na hora de parar o Brasil. Isso o PT sabe fazer. O PT se intimidou (...).
Rose – Vou falar (com o Lula). Vou escrever um e-mail para ele.
No diálogo, Rose e Paulo tramam contra as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que condenou inúmeros petistas históricos a penas de detenção e reclusão com o episódio de compra de apoio de parlamentares.
Não é à toa que logo após a divulgação das penas, um grupo de petistas começou a articular um possível protesto contra a prisão de aliados históricos, como José Dirceu.
Polícia investiga compras de pareceres
O centro das investigações da Polícia Federal é a venda de pareceres de órgãos federais para beneficiar empresas privadas. Tal negócio pode ter movimentado bilhões de dólares. Rosemary Noronha prestava serviços para um grupo que 'fabricava' esses pareceres. Estava na chefia de gabinete do presidente Lula à pedido de Lula. A ex-funcionária pública foi indiciada por tráfico de influência e corrupção passiva.
Os parlamentares querem que ela seja inquirida no Congresso Nacional, onde pode falar mais sobre sua relação com os petistas históricos. Já é fato público que o mentor do esquema seria , na verdade, Paulo Vieira, que atuava na ANA. O grupo fazia de tudo, inclusive, segundo a Veja, tentar promover uma juíza federal ao cargo de desembargadora do Tribunal Regional Federal (TRF), da 4ª Região.
O fato mais marcante até agora é que a promoção realmente aconteceu, em outubro deste ano. A presidenta Dilma Rouseff teria assinado a promoção da magistrada após o trabalho realizado por Paulo e Rose. Em um e-mail, a amiga íntima de Lula diz: "Caro Paulo, tarefa cumprida."
Paulo é suspeito, por exemplo, de facilitar um negócio do ex-senador Gilberto Miranda (PMDB-AM), que adquiriu duas ilhas no litoral paulista. Na ocasião, Paulo era presidente do Conselho Fiscal da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp).
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