Depois de quase um ano longe daqui, retornei à Covilhã e à UBI, para mais um período como Catedrático Visitante.
Europa em crise? Portugal no fundo do poço? De fato, fala-se em crise quase o tempo todo. A crise salta dos jornais e revistas, é gritada na televisão, contamina as conversas, entra sem ser convidada nos restaurantes, infiltra-se nas salas de aulas, toma carona nos taxis. Mas uma coisa também é certa: de hospitalidade e afeto não há crises. A cordialidade de sempre, a eficiência de sempre das equipes de apoio técnico e administrativo, o calor humano temperando a reintegração na labuta acadêmica do Departamento de Comunicação e Artes. E agora ainda mais fácil, pois além de colegas somos amigos.
Uma semana aqui e já estou plenamente integrado no trabalho, como se daqui não houvesse nunca saído. Trabalhando com os estudantes de doutoramento em Seminários Temáticos, oferecendo atendimentos personalizados, enfronhando-me em seus projetos, suas ideias, suas dificuldades. E compartilhando com os colegas daqui os debates, a preparação de relatórios, os planos para produção de artigos conjuntos, a participação em sessões de concursos de agregação, em bancas de doutoramento, nas quais a toga é essencial e uma me é sempre emprestada para que eu possa compor os júris. Vou acabar comprando a minha! Mas, para fazer isso nos conformes, terei que ir a Liverpool, pois cada um participa com a toga da Universidade onde se obteve o doutorado. E lá elas são caríssimas!
No primeiro fim de semana uma ida ao mercado municipal. E lá estavam as mesmas senhoras vendendo suas couves, suas cenouras, ovos de quintal, azeitonas artesanais, colhidas nas oliveiras de suas quintas e até ( Dona Merkel e os fiscais sanitários da Comunidade que não nos leiam!) seus coelhos recém-esfolados. E os queijos, e os chouriços, morcelas e alheiras, e os pães, e os vinhos. Para não falar nos doces, pois então já estaríamos em terrenos de Perdição. Na calma e sentimento de segurança absoluta que a Covilhã inspira, só um enorme perigo ronda os visitantes: engordar, cedendo às muitas tentações gastronômicas que se oferecem a cada esquina.
Saio do mercado. Uma senhora passa por mim, reconhece-me e cumprimenta-me:
-Bons dias, professor. Como tem passado?
Pânico! Quem é? Quem é?
- Bons dias, senhora…
Ah, agora reconheço-a. É a senhora da lavandaria.
E imediatamente me vem à mente Pessoa e os versos finais da Tabacaria:
“Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu”.
Bem haja!
marcos palacios
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