terça-feira, 6 de maio de 2014

ODEBRECHT E A PETROBRAS

Petrobras é suspeita de ter violado normas internas para assinar contrato com a Odebrecht nas eleições de 2010

Uma auditoria interna da estatal revela que o documento foi assinado cinco dias antes do segundo turno, por funcionário sem poderes para isso; lobista diz que a operação rendeu 8 US$ milhões à campanha de Dilma

MARCELO ROCHA E DIEGO ESCOSTEGUY
06/05/2014 16h32 - Atualizado em 06/05/2014 19h02
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Uma auditoria da Petrobras, obtida por ÉPOCA, revela que os diretores da estatal tiveram pressa para fechar um contrato com a Odebrecht, no valor de US$ 826 milhões, durante o segundo turno das eleições de 2010. Segundo a auditoria, normas da Petrobras foram violadas para que o contrato fosse assinado o quanto antes. Segundo o lobista João Augusto Henriques, que supervisionava as operações da Diretoria Internacional, naquele momento ocupada pelo PMDB, a pressa devia-se ao segundo turno das eleições presidenciais. Se o contrato não fosse assinado até o dia 31 de outubro de 2010, a Odebrecht não pagaria o equivalente a US$ 8 milhões para a campanha de Dilma Rousseff, do PT, diz João Augusto. O contrato foi assinado cinco dias antes das eleições.
Como revelou ÉPOCA em sua última edição, há suspeitas de irregularidades no contrato com a Odebrecht, que previa a prestação de serviços de segurança, meio ambiente e saúde no Brasil e no exterior. De acordo com uma auditoria preliminar da Petrobras, o contrato fora assinado por empregado sem poderes para tal. O funcionário indicado pela Diretoria Executiva para essa providência estava em missão externa. "O contrato foi assinado em 26/10/2010 por um dos coordenadores da Área Internacional, sem que houvesse/haja evidência qualquer de delegação de poderes para assinar o contrato. Em 27/10/2010, ou seja, um dia após a assinatura do contrato, o titular já havia retornado”, afirmaram os auditores.

Relatório da auditoria realizada na Petrobras a que ÉPOCA teve acesso com exclusividade (Foto: Reprodução)

O lobista João Augusto Rezende Henriques revelou a ÉPOCA que, como o contrato foi assinado a tempo, a doação da Odebrecht para a campanha de Dilma aconteceu como previsto. "Todo mundo recebeu", disse João Augusto. Segundo ele, "todo mundo" incluía, além da campanha de Dilma, o então diretor Internacional da Petrobras, Jorge Zelada, funcionários da área e deputados do PMDB.  João Augusto disse a ÉPOCA que "montou" o "projeto Odebrecht". "Eu escolhi a Odebrecht. Ela tinha que ganhar. Pelo padrão." A confissão do lobista é corroborada pelos achados da auditoria interna da Petrobras, que apontou evidências de que a licitação fora dirigida à Odebrecht.
Na edição desta semana, ÉPOCA revelou trechos das duas auditorias feitas pela Petrobras nesse contrato - somente parte da auditoria mais recente viera a público, no começo deste ano. A primeira auditoria, contudo, contém evidências mais consistentes de irregularidades. A contratação da Odebrecht é alvo de investigações na Polícia Federal, no Ministério Público e no Tribunal de Contas da União. Os auditores apontaram uma série de irgularidades: a Petrobras errou no perfil das empresas convidadas a participar da disputa e estabeleceu prazo reduzido para a apresentação das propostas. A auditoria identificou no orçamento da Odebrecht a manipulação de preços e quantidade de serviços, de forma irregular, para elevar gastos, sem que houvesse uma contestação da estatal, prática conhecida como jogo de planilha. Descobriu-se, ainda, a falta de autorização por parte da diretoria executiva da Petrobras para a realização de gastos adicionais no montante de US$ 20,3 milhões para estender o contrato à refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. “Sob tais circunstâncias, o processo licitatório deveria ter sido interrompido”, concluiu Marise Feitoza, gerente de Auditorias Especiais.
Apesar de todas as restrições, a presidente Graça Foster decidiu, em janeiro de 2013, manter o contrato, reduzindo-o a US$ 480 milhões. ÉPOCA mostrou bastidores dessa decisão. Após a primeira versão da auditoria, João Augusto e a Odebrecht pressionaram a presidente da estatal, Graça Foster, para que o contrato fosse mantido. Aprovou-se, em seguida, uma versão mais amena da auditoria: uma solução intermediária para que a contratação não fosse cancelada.
Outro trecho do primeiro relatório reforça a conclusão dos auditores de que a Petrobras tinha pressa em fechar o negócio. Em 11 de novembro de 2010, menos de um mês depois de assinar com a Odebrecht, a estatal contratou a Atnas Engenharia, por R$ 29 milhões, para realizar estudos para "a implantação dos serviços de segurança, meio-ambiente e saúde". Ou seja, a Atnas foi contratada dias depois para fazer uma análise que antecederia o contrato com a Odebrecht. O diagnóstico da Atnas foi de que "apenas 19,5% dos projetos contemplavam as informações necessárias à perfeita execução dos serviços já contratados com a CNO (Odebrecht)".

Relatório da auditoria realizada na Petrobras a que ÉPOCA teve acesso com exclusividade (Foto: Reprodução)

Procurada na semana passada, a Petrobras informou que não se manifestaria. Em nota, a Odebrecht afirma: “A Odebrecht nega veementemente a existência de qualquer irregularidade nos contratos firmados com a Petrobras, conquistados legitimamente por meio de concorrências públicas. Esclareça-se que a redução no valor do mencionado contrato para a execução de serviços em instalações da Petrobras fora do Brasil foi única e exclusivamente consequência da diminuição do escopo deste contrato. Em decorrência do plano de desinvestimentos da Petrobras no exterior, a prestação dos serviços elencados no contrato, originalmente prevista para ocorrer em nove países, foi reduzida para quatro. A Odebrecht desconhece questionamentos feitos em auditoria interna da Petrobras e as conclusões dessa mesma auditoria. A empresa está à disposição de qualquer órgão de fiscalização para fornecer informações sobre o mencionado contrato, cujas obras previstas já foram concluídas e entregues.”

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