quinta-feira, 22 de maio de 2014

O BRASIL DOS CONTRÁRIOS

SAMUEL CELESTINO

O Brasil atravessa um momento que, como os fatos demonstram, ninguém se entende. O País do futebol desdenha a Copa do Mundo e protesta contra ela. Ao invés da “paixão nacional”, hoje nem tanto quanto antes, prefere que o festival de gastos efetuados à larga fosse feitos em benefício da população, em especial direcionados à educação e à saúde. Vale dizer que, neste aspecto, o País amadureceu e o governo se perdeu no atraso da gastança desenfreada, como desenfreada é a corrupção. De outro modo, a violência se espraiou de tal modo que, como consequência, a Copa do Mundo fará mais mal do que bem ao Brasil. Mesmo antes dos jogos espraia-se no exterior uma imagem perversa do Brasil real, que não parece preparado para receber turistas do mundo inteiro.

Nas ruas das principais capitais, as manifestações contrárias à Copa ganharam força. Prédios públicos, privados e lojas foram e são depredados por vândalos. Ateiam-se fogo em transportes coletivos em prejuízo da própria população. Os sindicatos decretam greve ou não decretam e as greves acontecem da mesma forma, conturbando a paz pública, se é que existe paz. O governo da União e os governos estaduais ficam atônitos e pouco resolvem. Os políticos, não todos, evidentemente, estão mais norteados para o que podem desviar e enriquecer, e com as eleições de outubro, onde, como sempre, a renovação dos quadros ficará a desejar.

Se no Executivo e no Legislativo é assim, no Judiciário, terceiro poder da República, as decisões dos magistrados se confundem. Até no Supremo Tribunal Federal. Num dia, o ministro Teori Zavascki determina a soltura de todos os presos pela operação Lava-Jato, da Polícia Federal. O País toma um susto. No dia seguinte, o ministro revoga a sua própria decisão e determina a prisão de todos, menos do ex-diretor da Petrobrás, Paulo Roberto da Costa, que estava preso por suposto superfaturamento de contratos da estatal, que atravessa o momento mais tormentoso desde que foi fundada por Getúlio Vagas nos anos 50 do século passado.

Não foi bastante. Um juiz desconhecido atropela a Constituição, o que deixa transparecer que não a conhece, e diz que o candomblé e a umbanda não são religiões, gerando uma forte apreensão nos seus seguidores. No dia subseqüente, também muda de idéia e, para não ser punido, reforma o que disse e divulga que os cultos afro-brasileiros são religiões, sim. O Brasil está realmente desorientado.

Tão desorientado que, no Congresso, formam duas CPIs para apurar o que se passa na empresa símbolo do desenvolvimento nacionalista brasileiro. No Senado, uma CPI exclusiva chapa branca, determinada pelo Palácio do Planalto e pelo impoluto presidente da Casa, Renan Calheiros. Os oposicionistas ficaram à distância e ela se reuniu, pela primeira vez, somente com governistas, para sabatinar o ex-presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, que apenas perdeu tempo e atualizou a sua oratória. Fizeram-lhe dezenas e dezenas de perguntas, ele respondeu a todas e nenhuma foi contradita. Como a moda no Brasil é voltar atrás, como relatado no parágrafo anterior. Gabrielli que, há um mês e meio, falou claro no Congresso e disse que a presidente Dilma Rousseff teria como presidente do Conselho Deliberativo, de “assumir as suas responsabilidades no caso da refinaria Pasadena”. Na CPI somente de governistas voltou atrás. Disse que o problema estava no Conselho, “mas a presidente Dilma nada tem a ver”.

No mesmo dia, a terça feira, havia número para a formação de uma CPI mista, com parlamentares do Congresso e da Câmara. O número de integrantes neste caso é de 32, e já se contavam 19, entre oposicionistas e governistas arredios ao Palácio do Planalto. Na mesma terça feira, o PT cometeu uma bobagem: disse que não apresentava nomes. Quem pode fazer isso é a minoria. Neste caso, cabe a Renan Calheiros determinar quem representará o partido. O fato é que a CPI mista enforcará a CPI chapa branca do Senado e tudo o que Gabrielli dissera, em resposta às perguntas, ficará no esquecimento, menos para ele, naturalmente. O ex-presidente é uma peça chave no caso Pasadena que, segundo ele, foi um bom negócio quando comprada, virou um péssimo negócio com a crise mundial de 2008-2009 e agora voltou a ser um ótimo negócio. No fim do dia as ações da Petrobrás desabaram.

Agora, a CPI do Senado provavelmente será rifada e a CPI mista aguardará três sessões do Congresso. Provavelmente na próxima semana começará a funcionar. Para quê? Para nada porque terá seis meses para apresentar suas conclusões, ou seja, em novembro. Será mais um retrato do Brasil confuso. Os dois próximos meses serão de jogos da Copa indesejada, julho será mês de convenções e agosto/setembro de campanha política, com o Congresso às moscas.  Assim, ninguém saberá o que aconteceu com a Petrobrás.


*Coluna publicada na edição desta quinta-feira (22) do jornal A Tarde

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