quinta-feira, 29 de maio de 2014

BRASIL, PAÍS DE ÍNDIOS

Coluna A Tarde: Brasil, país de índio
SAMUEL CELESTINO

Observou-se, dentre os países em processo de desenvolvimento e consideradas integrantes do grupo das dez maiores potências do mundo, um fato inusitado que só poderia acontecer mesmo no Brasil. E não é negativo, pelo contrário. Os índios, que permanentemente são encontrados em Brasília em razão da proximidade com suas tribos, principalmente situadas em Mato Grosso, em trabalho constante de reivindicações para assegurar a defesa de suas terras, deram-se conta de que estava a acontecer, nesta última terça, uma manifestação contra a Copa do Mundo. Não pensaram duas vezes. Munidos de arcos, flechas e alguns com bordunas, fizeram rodas de dança, conforme suas tradições, e, sem pestanejar, imiscuíram-se nos protestos. Ora, os índios, em face dos valores altíssimos dos ingressos, estão afastados da Copa, assim como as classes média e baixa. É o “padrão Fifa” de arenas caríssimas, gastos imensos, exigências além do que se imaginava além do controle do Brasil (já descontrolado) pelo menos durante a competição. É o que parece demonstrar.
 
Os índios, embora considerados incapazes ou semi-incapazes pela legislação civil, são constantemente espoliados e assistem à invasão de suas terras por posseiros ou pelos garimpeiros. Entenderam, porém, que naquela manifestação que passava à frente de 300 deles, eles eram também brasileiros e engrossaram o movimento, enfrentando a cavalaria da polícia militar, demonstrando a sua cidadania, porque foram os primeiros a habitar estas terras de Pindorama. Depois, suas tribos ou foram integradas à dita civilização, ou eles foram dizimados, em grande parte, pelos brancos, mestiços e até mamelucos. Conta a bela lenda indígena sobre a existência na floresta da Sucupira, um moleque de pés para trás que, em razão, também andava deste modo. Era um ente das matas que os ajudavam a enganar os brancos que também os escravizavam, fazendo-os se perderem em caminhos inexistentes, portanto desconhecidos.
   
Nenhum país pode exibir imagens como tais para o exterior, ornando com um fato inusitado as manifestações contra a gastança com a Copa, em detrimento à educação e à saúde carentes que são oferecidos ao povo brasileiro, no que pese uma altíssima carga tributária. Um dos índios, enfrentando a cavalaria da PM, flechou um dos soldados que saiu ferido do confronto. Foi preso, mas, de imediato, solto. Afinal, ele usara a arma que tinha contra as bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha. Ou apanhava ou batia. Preferiram o confronto e assim aconteceu numa cena diferenciada daquelas que se observam nas principais capitais do país, principalmente Rio de Janeiro e São Paulo, onde os vândalos do Black Block apedrejam e destroem o que encontram à frente, matam com aconteceu com o fotografo da Record, além de não respeitarem propriedades públicas ou privadas. Estes são ditos “civilizados”.
   
Tudo isso faz parte do cenário da Copa do Mundo que, espera-se, acabe por ser realizada sem protestos desta ordem, com civilidades nas ruas das cidades sede dos jogos. Pelo menos durante a competição. Os índios, protestando na capital do país, deram um toque diferente às manifestações que  acontecem com violências, colocando a pretensa paz de pernas para o ar, virada ao avesso, num país de contrários que resolveu protestar contra o “status quo”.
     
Não é preciso reforçar com os estorvos das seguidas greves que maltratam a população, muitas delas justas, outras não, mas a maioria aproveitando o período propício do pré-Copa do Mundo. Há, no meio dessas verdades, também um estado de quase desgoverno, de descomando, na União e em diversos estados e cidades brasileiras, além da amarga dor da cidadania diante das corrupções abertas e protegidas, conhecidas no aparelho governamental. Tudo isso concorre para atiçar e incendiar este período que no momento se observa.
       
Os índios em manifestações contra a Copa e a favor da saúde e educação públicas, talvez não soubessem por que protestavam. Seu protesto, porém, era um grito pelo descaso com a população desses povos que têm pouca atenção. Se eles não sabiam, o que dizer dos civilizados de países avançados que chocaram pela falta de conhecimento, oferecendo conselhos absurdos aos seus cidadãos que, como turistas, pretendem vir ao Brasil para os jogos da competição mundial? Um deles, o Canadá,  não somente falou sobre a violência e dos homicídios que grassam no Brasil,  como na Bahia que está colocada, no quesito, em quarto lugar. Neste aspecto, eles têm razão nos conselhos aos seus  turistas, porque, de fato, a segurança não é das melhores, mas não chega ao extremo.
           
Entre muitas bobagens, o governo do Canadá pediu aos seus cidadãos viajantes que tomassem cuidado com as cobras e os macacos que podem ser encontrados nas ruas do Rio de Janeiro. A Chancelaria brasileira não deu resposta. Silenciou. Agora eles ficam sabendo, que em plena capital brasileira, a belíssima Brasília, os índios “comandam” manifestações.
     
Que bom que nós sejamos um país de índios. Demonstra, apenas, que somos um resultado da mistura racial e que, embora os desgovernos, nós também somos um país democrata. Nós não somos do gelo. Somos tropicais.

*Coluna de Samuel Celestino publicada no jornal A Tarde desta quinta-feira (29). 

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