Extratos da comunicação de Mia Couto na Academia brasileira de
Letras, sobre João Guimarães Rosa (Rio de Janeiro,
Agosto de 2004).
É
importante situarem que contextohistórico João Guimarães Rosa escreve a sua
obra. LivroscomoGrande Sertão: veredassãoescritosquando os brasileirosfazemnascer do “nada” uma
capital no interiordesse sertão (Brasília estava a acabar de serconstruída) e
se consumavaumprocesso de controlocentralizadodessarealidademúltipla e fugidia.
Na realidade, o “sertão” é erguidoemmito para
contrariarumacertaidéiauniformizante e modernizante de umBrasilemascensão. (…)
Um sertão cheio de histórias para contrariar o curso da História. (…)
Grande sertão: veredasrevelaumposicionamentopolítico, não porque se constrói a partir
de umaideologia mas porque, na próprialinguagem, João Guimarães Rosa
sugereumautopia, umaideia de futuro que está para alémdaquilo que
eledenunciacomoumatentativa de ‘misériamelhorada’. Estalinguagemmediada entre
classes cultas e os sertanejosnãoexistia no Brasil. João Guimarães Rosa
sugereumBrasilem que os excluídospossamparticipar da invenção da sua História.”.
O dever do escritor para com a
língua é recriá-la, salvando-a dos processos de banalização que o
usocomumvaiestabelecendo. Para Guimarães Rosa, a línguanecessitava ‘fugir da
esclerose dos lugares-comuns, escapar à viscosidade, à sonolência.’ Nãoerauma
simples questãoestética mas era para ele, o própriosentido da escrita. Explorar
as potencialidades do idioma, desafiando os processosconvencionais da narração,
deixando que a escrita fosse penetradapelomítico e pela oralidade.
Rosa
obedeceuassim a umprojeto de libertar a escrita do peso dos
seusprópriosregulamentos. Para issoele fez de tudo: do neologismo, da
desarticulação da frase feita, da reinvenção de provérbios, do resgatar dos
materiais da oralidade para os colocaremfunçãonãocomoanotação marginal mas como
a alma do próprio texto.”
…
O que acontecequandonão se fecha a historia ? A multidão que assiste ficadoente,
contaminadaporumaenfermedade que se chama a doença de sonhar. JoãoGuimarães Rosa é umcontador que nãofechou
a historia. Ficamosdoentes, nós
que o escutamos; E nos apaixonamosporessadoença,
esse encantamento, essaaptidão para a fantasia.
Estamosenfim,
na presençanãoapenas de umcriador de palavras mas de umpoetareinventando a
prosa. Hácomoumterramotono
chao da escrita, umalinguagememestado de transe, como o taldançarinoafricano
que se prepara para a possessão. Surpreendemos oactonessemomentoem que jánão é dança para se
converteremtransferência de alma e corpo. Linguagemcriadora de desordem, capaz
de converter a lingua numestado de caosinicial, ela supportaumtranstorno que é
fundamental porque fundadorde um reinício. JoãoGuimarães Rosa é um mestre, umensinador de ignorâncias de que
tantocarecemos para entenderummundo que só é
legível na margem dos códigos da escrita.
Discordo em 90% do entendimento do Mia Couto sobre Guimarães, embora não uma especialista no autor.
ResponderExcluirO contexto que ele inventou do Grande Sertão é risível.
A mulherada é que gosta e incensa porque o moçambicano é bonitão.
Vou até copiar para mandar aos estudiosos dele.
Dele Guimarães, bem entendido.
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