sábado, 12 de março de 2016

A JARARACÁ, O BISPO E A BBB

MALU FONTES

Entre os milhões de pessoas que, hoje, atacam-se verbal, moral e até fisicamente, na imprensa, nas redes sociais e em protestos nas ruas, por conta do clima de ódio que se estabeleceu em função do clima político em que vive o país, muita gente ainda deve ter inscritos na memória os vestígios do que é viver sob uma ditadura militar.
Outros milhões, que também se agridem do mesmo modo, pegaram apenas o rescaldo dessa ditadura, gente que nasceu já no regime militar e viveu pelo menos duas décadas sem saber o que era uma eleição para a Presidência da República.
Até chegar ao que nos acostumamos a chamar hoje de democracia, vieram etapas de nomes estranhos. Os atos institucionais que aprofundaram a ditadura, os anos de chumbo de Médici, a distensão, a reabertura, a frustração das diretas, as indiretas, a morte de Tancredo, a posse de Sarney e, finalmente o primeiro voto para presidente, o primeiro desses que hoje se estapeiam de dois lados de um ringue com um traço no meio separando coxinhas e petralhas.
Elegeram um caçador de marajás que, ainda por cima, gabava-se de ter o saco roxo, codinome e atributo que já davam sinais de esquisitice suficiente para dar no que deu. Uma geração chamada de caras pintadas foi considerada a antena da consciência e da maturidade política do Brasil e levou a fama por ter varrido (ou pensado que varreu) Fernando Collor do poder, lá nos idos de 1992. 
PROSTÍBULO
Tanto na luta contra a ditadura, como no processo de impeachment contra Collor e agora nesse clima de instabilidade econômica e política repetido como cantilena em todos os meios, o que aparece em comum é uma aposta numa teoria do consolo de acolá, lá e aqui tudo está acontecendo para que o país renasça melhor, para que as futuras gerações recebam um país decente, mais justo, honesto, digno.
Resultado de imagem para caricaturas de lulaQue levantem a mão os jovens adultos que nasceram no Brasil em 1989, quando caía o Muro de Berlim, Collor se ouriçava e comemorava-se a volta da democracia. Esses homens e mulheres têm orgulho do país em que vivem hoje? A geração anterior lhes deu o que lhes prometeu? Difícil enxergar sim para essas perguntas. A ditadura caiu de podre e uma canalhice partidária confundiu o jogo político com jogatina de prostíbulo, fenômeno que se arrasta até aqui.
Como se já não vivêssemos atolados de metáforas, logo após depor sob condução coercitiva, Lula anuncia à nação que ele é uma jararaca que está mais viva do que nunca após terem tentado matá-la. O golpe de morte acertou-lhe o rabo, não a cabeça.
Prudência e sensatez parecem ter fugido do navio Brasil, cedendo lugar a ratos que riem, fazem muito barulho e aprofundam o caos. Há um separatismo de boteco que clama por pancada, sangue e chorume e embora desconheça o sentido da palavra maniqueísmo, só em nome dela milita. Já começam a querer espancar jornalistas nas ruas. E que fique claro: o descontrole é dos dois lados. 
Enquanto o assombro é geral com o poder que uma ratazana bípede tem sobre o Legislativo, eis que entra em cena nesse teatro de vampiros um bispo católico fazendo uma tradução torta da Bíblia e inserindo nela a palavra jararaca, coincidentemente, claro, a mesma usada por Lula para metaforizar-se. O bispo auxiliar da Diocese de Aparecida (SP), que atende pelo doce e dócil nome de Dom Darci, conclamou os fiéis, na missa do fim de semana, a perseguir e esmagar a cabeça das serpentes que se autodenominam jararacas, como fez Maria, sem que o mal lhe tocasse.
SERPENTES
Num país em que já se pega e mata e come, literalmente, em que se chacina por gosto, tudo o que não se precisa é de um bispo que parece inspirar-se mais no elenco de tresloucados do BBB, com seus tapas na cara, do que no frescor do papa Francisco. É esse país de ódio e raiva que vai parir coisa melhor? Por enquanto, o som da banda está mais favorável para as Ana Paulas e os Dons Darcis. Para que tanta marra se a vida é um sopro?
Malu Fontes 
 jornalista 
professora de jornalismo 
da Facom-Ufba

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