Esquerdização
da Grécia
JC Teixeira
Gomes
A Europa é
hoje um continente inseguro e decadente, que se deixa abalar por um fato
realmente grave como o atentando ao Charlie Hebdo, mas também pelo resultado de
simples eleições em um país em crise, como a Grécia. Para avaliação dos leitores,
eis aqui a manchete do jornal de Madri “El Mundo”, do último dia 27: “El
efectoSyrizagolpea a lavieja Europa”. Li com meus olhos que essa foi a tônica
do noticiário internacional, não só no jornalismo impresso como nos canais de
televisão.
O triunfo da esquerda chegou a criar em certas
áreas uma sensação de pânico, como se toda a Europa estivesse conformada com a
presença dos seus chefes políticos pró-direita, coniventes e submissos em geral
com o poderio econômico norte-americano e apavorados com o ímpeto do
terrorismo.
A vitória do líder de esquerda Syriza foi
um novo “presente de grego” da política helênica para as economias europeias, ainda hoje fragilizadas
pelas graves crises que os bancos norte-americanos espalharam pelo mundo a
partir de 2008.Países frágeis como Portugal e Espanha logo se atrelaram à ajuda
internacional que é um verdadeiro garrote, consubstanciada num tripé de órgãos
poderosos como o FMI, o Eurogrupo e o conglomerado BCE, que impuseram com mão
de ferro a tradicional política de “austeridade”. É fácil de explicar, os
brasileiros conhecem bem essa palavra: depois que os governos gastam sem
critérios, roubam os cofres públicos e se endividam além da conta,
“austeridade” significa punir o povo indefeso e vítima dos desmandos
financeiros com compressão salarial, perda de vantagens históricas, rígido
controle no pagamento de pensões e benefícios do mesmo gênero, subtraçõesnos
planos de saúde, aumento geral de impostos, taxas e tarifas nos serviços
públicos, desemprego generalizado.
Todas essas práticas se tornaram habituais
no capitalismo triunfante depois da globalização, pois já não havia o mecanismo
regulador do temor do comunismo. O que os defensores da economia de marcado não
conseguem explicar é como as crises continuam tão comuns e periódicas,
atingindo brutalmente países que em nada contribuíram para criá-las, mas que se
tornam solidários na desgraça.
Não sou adepto da ideia de que os “grandes
homens” são seres iluminados, surgidos para conduzir os destinos do mundo. Essa
ficção nasce na cabeça dos criadores de mitos, pois as sociedades evoluem pela
força da energia coletiva, do trabalho anônimo e laborioso do povo. As “grandes
famílias” da nobreza europeia (continente particularmente belicoso) o que
fizeram foi provocar as guerras nas quais mandavam o povo se entredevorar.
Promotoras de carnificinas, que assistiam na segurança dos seus palácios. Mas
não há dúvida de que hoje o mundo se ressente de falta de lideranças capazes. A
história não se repete, mas estou convencido de que os anões que hoje dirigem o
planeta nos fazem nostálgicos da presença de homens com a estatura de Roosevelt,
Churchill, De Gaulle, Tito, entre poucos outros, na modernidade.
O grande susto que a Grécia vem dando às
economias da Europa dependentes dos favores da chamada “Troika” – palavra russa
que evoca realidades sinistras, mas que é usada para designar a vinculação das
três entidades que nomeei acima – decorre do fato de que o vitorioso Syrizachefia
forças de esquerda, embora em coligações não muito consistentes e até
duvidosas. Mas prevalece, no momento, o susto. O povo grego, espoliado, se uniu
para dar um recado: chega da austeridade mentirosa. “Não somos dívida!” –
escrevemos europeus inconformados nas ruas das principais cidades, respondendo
aos economistas. Está claro que não: são seres humanos
desrespeitados em seus direitos fundamentais pelo complô dos banqueiros
gananciosos, das lideranças fracassadas e da imprensa corrupta que os apoia e
sustenta.
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