quarta-feira, 20 de maio de 2015

I LOVE PROJAC

MALU FONTES

Resultado de imagem para FOTOS DA NOVELA I LOVE PARAISOPOLIS
Se há algo que nunca deu muito certo na televisão brasileira foi trama de novela centrada na vida de gente pobre e na periferia. Favela, então, vade retro. Isso é muito diferente de afirmar que nunca houve pobres e pobreza nas telenovelas, desde que muito bem arrumadinhos, sem faltar nenhum dente, sem melasmas e muito menos com micoses aparentes.
Os pobres, as periferias e as favelas, quando existiram nas novelas, quase sempre ficaram reduzidos a um cercadinho denominado pelos entendidos no tema como ‘núcleo pobre’. 
Na história das telenovelas, a favela com maior destaque na trama foi a Portelinha, comandada pelo caricato Juvenal Antena (Antônio Fagundes), na global Duas Caras. Coube ao SBT, em 1990, a primeira tentativa de fazer uma telenovela só com pobres, Brasileiros e Brasileiras, que resultou num retumbante fracasso de audiência porque, pelo menos naquela época, Joãozinho Trinta tinha razão: quem gosta de pobreza é intelectual. 
Com a internet e a popularização da TV a cabo, a audiência tradicional se esfacelou e as emissoras abertas não sabem hoje com quem falam, em termos de público, e muito menos sobre o que devem falar para agradar mais do que estão conseguindo.
A audiência caiu e, nesse cenário, apostar em novos temas e formatos, embora sem nenhuma garantia de certeza, é a única estratégia disponível. Em outras palavras: a TV aberta está atirando para todos os lados para ver se acerta um alvo.
Se a classe média fugiu para os tablets, smartphones e canais por assinatura e se a periferia cansou de não se ver representada nas novelas, quem sabe uma fábula sobre uma favela fake e embelezada não reconecte ambas à telinha? Afinal, alguém com o nome de Marizete, mas com a cara e o corpo de Bruna Marquezine, não incomoda nem o Morumbi nem Paraisópolis. Na frente da nova namoradinha nacional, o Brasil do andar superior até esquece seu desprezo pelo dessemelhante, o periférico.
Morar no cenário
É nesse contexto que a Globo aposta as fichas da vez em I Love Paraisópolis, a novela recém-estreada das 19h e que não teria nada demais não fosse o cenário uma mímese de uma favela de verdade, a homônima Paraisópolis, uma das maiores da América Latina, e localizada ao lado de um dos bairros mais sofisticados de São Paulo, o Morumbi.
Ou seja, na nova atração, as coisas se inverteram. A trama passa-se inteiramente na favela fake e os ricos foram reduzidos a um pequeno núcleo. E de malvados, encarnados essencialmente pelos brancos e loiros Letícia Spiller e Henri Castelli. 
O que não deixa de ser engraçado é o conteúdo do marketing de umbigo da novela, em todos os programas da emissora, do Vídeo Show ao Fantástico, passando por Ana Maria Braga e os telejornais. Não se fala em outra coisa senão na incrível semelhança entre a favela real e a fake, a do I Love, inteiramente montada no Projac, onde tudo é tão lindo quanto irreal.
Até o traficante, o Grego, não trafica. Até agora, a inspiração da novela em uma favela rendeu cenas hilárias, todas ocorridas fora da novela e exibidas em programas da emissora. Numa delas, Henri Castelli declarou ao Jornal Hoje o seu alto grau de intimidade com a real Paraisópolis. Por quê?
Porque mora perto: no Morumbi. Noutra, uma equipe do Vídeo Show leva uma moradora de Paraisópolis para visitar os cenários da favela no Projac. Ao final da visita, a senhorinha, naquele carrinho projaquiano, derrete-se: preferiria morar naquele cenário. Para fechar com chave de ouro, a última edição do Fantástico fez Maurício Kubrusly encontrar na Paraisópolis de verdade as Marizetes reais. Só faltou ir a Nova York buscá-las.  
Malu Fontes é jornalista e professora de Jornalismo da Ufba 

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