quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O ARCEBISPO


Tudo passa tão rápido... Acho que foi há mais de quinze anos... 
O Olympio Serra me telefona: “Dimitri, dei seu endereço a um arcebispo que quer comprar uma casa no Santo Antônio”. Deus escreve por linhas tortas... 
Na manhã seguinte o Monsenhor entra na minha sala. 
Estatura média, mais para alta, corpo pesado sem ser gordo, rosto alongado. Dois olhos, pequenos, claros e colados ao nariz me lembram imediatamente uma raposa. Veste preto, rústica cruz de madeira no peito, como usam os religiosos descalços. Apresenta-se: André Poniatowski, arcebispo de ... na Austrália.

Da cidade, não entendi direito, nem imaginava que existisse. Mas do nome – de principesca origem polonesa - não posso deixar de perguntar qual o parentesco com o ex-ministro francês, Michel, ou com Helena, a mexicana “Princesa vermelha” com quem eu almoçara em Coyoacan na minha última viagem a México. Estranhamente Monsenhor desvia a conversa. 
Queria comprar uma casa no bairro, já tinha uma em vista, com piscina até! 
Aqui, neste bairro? A única que se pretende piscina não passa de uma grande banheira em quintal abandonado. E, se não for indiscrição, quanto pedem pela casa? 
“Trocentosmil..” 
Mas é um absurdo, não vale nem a metade!... 
Não importa. São bons católicos.

A este argumento, responder o quê? Mas o senhor vai fazer o quê, tão longe de casa?
Vou aproveitar para ajudar algumas obras sociais e estudar a arquitetura românica.
Aqui, na Bahia... arquitetura românica? 
Bem... Também gosto do barroco. E de qualquer forma é melhor me dedicar aos estudos que passar o dia com putas, não é? 
Não acredito o que estou ouvindo. O diálogo está mais para teatro de Ionesco. Levanto-me para significar que a audiência está encerrada.

Durante as semanas seguintes só se falou no arcebispo alemão que reservava peças do santeiro, quadros em várias galerias do Pelourinho, tentava celebrar missas em todas as igrejas e mosteiros –às vezes conseguindo - e fugia das diversas pousadas sem pagar a conta. 
Cruzava com ele, sorrindo angelicamente nas ladeiras, roupa de padre no braço, almoçando de marmita sentado no meio-fio, conversando com as piranhas mais desdentadas da Praça da Sé. 
Acabou estrela da página policial, preso, deportado pela Polícia Federal. 
Voltou. 
Foi deportado novamente.

E agora leio, no mesmo jornal, que foi detido em ato da Consciência Negra em São Paulo, onde ostentava o prestigioso nome de André Von Hohenzollern. 
Ultima família real a reinar na Alemanha. 
E com autopromoção para cardeal!

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