Malu Fontes
A Universidade Federal da Bahia (UFBA) decretou a morte do vestibular, o bicho-papão que atormentou a vida escolar e o imaginário de dezenas de gerações de universitários baianos, principalmente daqueles que nunca conseguiram ingressar numa universidade pública. A partir de 2014, todas as 4.282 vagas de graduação da UFBA serão preenchidas através das notas obtidas no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) por alunos de todo o país. Com isso, os candidatos de Salvador e da Bahia disputarão as mesmas vagas com candidatos de todo o país. Pelo Sisu, nenhum candidato precisa se deslocar de seu estado para realizar a prova, o que aumenta em muito o número de concorrentes, já que não se gasta com viagem.
Entretanto, o que num primeiro instante pode parecer uma maravilha para quem sempre teve pavor do vestibular e acha que agora vai navegar em mares tranquilos, outros elementos entraram em cena. Primeiro, a complexidade da prova do ENEM, cuja lógica e filosofia de avaliação são completamente diferentes dos formatos para os quais muitas das escolas tradicionais de Salvador treinavam a custo de ouro seus alunos desde as mais tenras séries. Os professores show men, com suas formulazinhas rimadas para facilitar a decoreba, agora estão no sal. Outros aspectos importantes e que faziam diferença entre um aluno baiano e o de outro estado disputando entre si uma vaga na UFBA eram os conteúdos culturais regionais, sobretudo ancorados na literatura e filmografia locais. Agora, adeus a essas especificidades. Estão mortos e cremados.
Há ainda outros aspectos muito pouco tocados, não merecedores até agora de uma linha sequer na imprensa: os cotistas vindos das escolas públicas de Salvador e da Bahia - e vamos nos poupar do óbvio de dizer a quantas anda tocando a banda educacional por essas plagas - não mais disputarão suas vagas com o aluno do Odorico Tavares, da escola do subúrbio ferroviário há meses sem professor de química ou física ou com os alunos do interior do estado, mas com alunos de rede pública de estados cujo ensino é muito melhor que o nosso, o que, diga-se de passagem, não é lá algo difícil de conseguir. E para não dizer que também não se falou dos potenciais prejuízos dos privilegiados, as listas e rankings das melhores escolas privadas do Brasil têm mostrado que mesmo as melhores - e mais caras - escolas de Salvador fazem feio quando emparelhadas com as melhores do Sul e do Sudeste. Neste caso, merecem aplausos duas escolas privadas de Feira de Santana, entre as melhores do país.
O último elemento que deve incomodar uns, agradar a outros, mas, certamente mudar a paisagem humana e a diversidade na UFBA, é a forasteirização da universidade, como já ocorre com outras universidades públicas do Norte e Nordeste que aderiram ao Sisu. Exemplo disso se deu na Paraíba e em Pernambuco, onde o índice de vagas ocupado por alunos de outros estados e outras regiões do país não chega hoje a ser exatamente objeto de elogio. É muito cedo para ver o desenho humano que o Sisu/ENEM esboçará na UFBA. Para uns, há o risco das universidades regionais perderem exatamente aquilo que têm de mais importante para contribuir: os investimentos em projetos locais. Para outros, algo mais arriscado: o risco dos forasteiros, mais bem formados por modelos escolares desde há muito melhores que o baiano, abocanharem legitimamente as melhores e mais disputadas vagas das universidades regionais, deixarem os cursos menos prestigiados para os nativos e, uma vez graduados ou pós, arrumarem as malas com o Lattes dentro e darem tchau para bater ponto em seus estados de origem.
O último elemento que deve incomodar uns, agradar a outros, mas, certamente mudar a paisagem humana e a diversidade na UFBA, é a forasteirização da universidade, como já ocorre com outras universidades públicas do Norte e Nordeste que aderiram ao Sisu. Exemplo disso se deu na Paraíba e em Pernambuco, onde o índice de vagas ocupado por alunos de outros estados e outras regiões do país não chega hoje a ser exatamente objeto de elogio. É muito cedo para ver o desenho humano que o Sisu/ENEM esboçará na UFBA. Para uns, há o risco das universidades regionais perderem exatamente aquilo que têm de mais importante para contribuir: os investimentos em projetos locais. Para outros, algo mais arriscado: o risco dos forasteiros, mais bem formados por modelos escolares desde há muito melhores que o baiano, abocanharem legitimamente as melhores e mais disputadas vagas das universidades regionais, deixarem os cursos menos prestigiados para os nativos e, uma vez graduados ou pós, arrumarem as malas com o Lattes dentro e darem tchau para bater ponto em seus estados de origem.
Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da UFBA.
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