O Papa Francisco ouvindo discurso eleitoral com evangélica paciência
O papa Francisco viu tudo – mas, homem educado e gentil, fará aos brasileiros a gentileza de esquecer aquilo que viu.
O papa percebeu, antes ainda de descer no Brasil, o quanto um Governo pode ser grosseiro. A presidente Dilma não se deu ao trabalho de chegar ao Rio mais cedo, para receber o visitante. Saiu de Brasília na última hora. Para que o protocolo se cumprisse, o avião do papa precisou dar voltas sobre Valença, no Estado do Rio, esperando que o avião de Dilma pousasse antes e ela pudesse recebê-lo.
O papa sentiu, já no Brasil, o quanto a falta de noção resvala para a inconveniência. Aos 76 anos, depois de viajar de Roma ao Rio, depois de enfrentar o trânsito carioca, teve de ouvir meia hora de discurso eleitoral da anfitriã a respeito das maravilhas de seu Governo – justo Francisco, que nem vota no Brasil! Como comparação: seu próprio discurso, bonito e preciso, durou 15 minutos.
O papa viu que a loucura por uma foto a seu lado (que terá, sem dúvida, alto valor eleitoral) superou qualquer outra consideração. Cardeais, arcebispos e bispos não tiveram oportunidade, no Palácio Guanabara, de aproximar-se de seu dirigente espiritual: todos os espaços estavam ocupados por José Eduardo Cardozo, Renan Calheiros, Henrique Alves, os próceres de sempre da República.
O papa foi testemunha próxima de uma imensa grosseria: o presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, o cumprimentou e, em seguida, passou direto pela presidente Dilma, sem olhá-la. Foi um desrespeito à mulher e à presidente.
Guerra aberta
É fato que boa parte do Governo concentra esforços em tentar desmontar a imagem do ministro Joaquim Barbosa, considerado uma ameaça à reeleição da presidente. Os jornalistas de sempre se dedicam a divulgar que o ministro costuma almoçar e jantar, e que isso é um escândalo inominável num país em que – antes da salvação trazida pelos Governos petistas – havia gente passando fome.
Mas a causa da imperdoável descortesia do ministro, ao negar cumprimento à presidente, vem sendo atribuída à história do apartamento de quarto e sala que comprou em Miami. Atribui-se ao Governo Federal a entrega à imprensa de informações (por lei, sigilosas) sobre a forma de compra do imóvel nos EUA.
Os novos milagres
Já há piadas sobre a visita do papa e os milagres a ele atribuídos. Ficou preso num congestionamento no Rio, de janela aberta, e não foi assaltado; cumprimentou toda aquela gente importante que vimos na TV e continua com seu anel de prata; fez com que o governador Sérgio Cabral andasse de carro; foi fotografado sem que a cabeça do ministro Mercadante aparecesse em seu ombro direito.
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