Jean Wyllys, em entrevista: "Sou gay, preto e não vou me calar"O deputado fala sobre temas polêmicos como preconceito, maconha, Copa do Mundo e manifestações
Publicação: 06/07/2014 10:41 Atualização: 06/07/2014 12:36
Quando sai de casa, o baiano Jean Wyllys precisa olhar para os dois lados da rua. A luta em prol de algumas causas controversas, como da homossexualidade e da prostituição, lhe valeu bons inimigos. E, da mesma forma, um grau de admiração. Por dia, a assessoria do escritor, professor e atual deputado recebe cerca de mil mensagens. Elogios, congratulações, declarações de amor. Mas, também, ameaças, insultos e ofensas. No gabinete 646, no Anexo IV da Câmara dos Deputados, o ex-BBB, mestre em letras, recebeu o Correio para uma conversa franca sobre preconceito, maconha, Copa do Mundo, manifestações.. Tudo que permeia a dor e a delícia de ser Jean Wyllys.
Podemos falar de assuntos pontuais?
Sim.
Acredita que o debate acerca da legalização da maconha possa avançar?
Está avançando! Muita gente saiu do armário para defender essa questão. São tantos, nesse país, que usam, mas poucos admitem.
Você defende o uso recreativo e medicinal?
Sim! A ideia é torná-la legal. Atualmente, nós temos duas drogas legais, e eu insisto em usar esse termo, porque tabaco e álcool são drogas. A imprensa, e aí eu me incluo porque eu sou jornalista, usa “droga” como sinônimo de droga ilícita. Rivotril, tabaco e alcool são drogas lícitas muito consumidas. A sugestão é incluir a maconha entre elas. Ou seja, todo o regulamento de comércio e consumo passará a valer também para maconha, com as devidas especificidades, como a quantidade permissível de consumo. Quanto ao lado medicinal, defendo que uma mãe que tem um filho com epilepsia, por exemplo, possa recorrer aos benefícios para reduzir os danos e os efeitos da doença. Não defendo a maconha prensada, manipulada. Acho fundamental que um rótulo acompanhe o produto, trazendo os impactos que possam ser gerados pelo uso.
E o que o motiva a comprar essa briga?
A liberdade individual. Eu posso fazer uso do meu corpo do jeito que eu bem entender! O meu pai teve câncer na língua por causa do uso de tabaco. Desenvolveu e morreu com 57. Meu pai sabia que o cigarro fazia mal a ele. É um direito do cidadão, é a liberdade. Ele foi informado dos males, então ele decide.
Esse conceito de “a escolha é minha” não abre um perigoso preceito de que a pessoa possa fazer uso de qualquer substância? Da maconha à heroína?
Em última instância, abre sim. Mas devemos encarar isso. Existem drogas maléficas que são vendidas em farmácias. Somos uma sociedade drogada, de certa forma. Se não de álcool, tabaco e maconha, temos as tarjas pretas. Enfim, precisamos regulamentar e fomentar outra forma de vida.
Você já consumiu maconha?
Eu já consumi recreativamente. Não tenho problema nenhum em admitir isso. Consumi na época da faculdade, e diria que não consumo, hoje, porque não é legal. Talvez, quando for legalizada e regulamentada, eu volte a usar. Eu consumi na época da faculdade, estava no contexto de liberdade, das contestações universitárias. Mas depois não.
Outro ponto controverso é a sua tentativa de regulamentar a prostituição. Por que o assunto gera tanto incômodo?
As pessoas são hipócritas do mesmo jeito que acontece com as drogas. Existe uma demanda muito alta de pessoas que se utilizam dos serviços das prostitutas, mas ao mesmo querem mantê-las na marginalidade. Isso é surreal.
Você acha bacana a ideia de pensarmos na prostituição como uma opção de carreira profissional?
Eu não acho isso bacana não. As escolhas são de cada pessoa. Nem acho que isso deve ser estimulado. Isso não existe. É loucura achar que a regulamentação de uma profissão vai aumentar o número de prostituas. A profissão de antropólogos foi regulamentada e nem por isso o número de antropólogos aumentou. As pessoas tem uma fantasia muito maluca. E tudo isso é fruto da marginalização da prostituição. Vivemos em uma sociedade que construiu muitos tabus ao redor do sexo. As pessoas não vivem livremente a sua sexualidade, e a ainda querem policiar a alheia. Onde já se viu isso?
Falemos da questão da homossexualidade. Com tanta intolerância e episódios de violência, o sair do armário está se tornando mais arriscado?
Viver com medo é viver pela metade. Não tem armário que esconda. O armário nunca é suficiente, o armário sempre tem um cupim corroendo, o armário sempre é de vidro. É melhor você fazer essa passagem da vergonha para o orgulho. É melhor estar aqui fora, sair dos mistérios dolorosos, para vir para os mistérios gozosos . Eu não questiono a heterossexualidade de ninguém, porque as pessoas tem que questionar a minha homossexualidade? Por que elas tem que achar que eu sou um sujeito menor, que merece menos direitos por causa da maneira que eu amo? Que história é essa?
Você recebe muito ódio, ameaças… Teme por sua integridade física?
Eu temo porque é muita gente maluca no mundo. Esses ódios e preconceitos são muito arraigados nas pessoas… É gente maluca que adoece por conta dessas repressões sexuais, que elas não conseguem lidar… Eu tomo sim os meus cuidados. Mas também não vou sair da cena pública por causa disso. Não vou me calar. Estamos em um processo de transformação e esse processo vai seguir. Independente de mim.
Já apanhou por ser gay?
Desde que eu me entendo por gente, eu sou alvo de ódio, de deboche, da chacota. Uma vez indo para a igreja, um cara veio do nada e me deu um soco. E é claro que ele me deu esse soco porque ele viu que eu era gay pelos meus trejeitos. Discriminação… isso já aconteceu muitas vezes na minha vida. Mesmo hoje aqui, no Congresso. Mas, tenho humor, ironia e deboche para desconstruir os escroques. Eles comem dobrado comigo aqui. Eu me fiz um homem com repertório vasto de conhecimento, e essa é a minha grande arte e arma.
Outro preconceito que você combate é o racismo…
Não sou branco, me considero negro, sempre me afirmei como negro. Mas não posso ser ingênuo de acreditar que eu e uma pessoa de pele preta estamos no mesmo patamar. Uma pessoa de pele preta sofre mais discriminação, é óbvio. Sou absolutamente solidário a causa do movimento negro.
Não é errado dizer “preto”?
“Preto” não tem porque não falar! Acho tão curioso… porque ninguém faz deboche com pessoas que estão em posições superiores? Macho, piadas com brancos, ricos, magros, bonitos. Nunca há. O politicamente correto é sempre evocado para dar freio às lutas das minorias. O desrespeito, na verdade, vem na forma da piada, do insulto.. E aí temos que lembrar de Chico César quando diz: “Respeitem meus cabelos, brancos”. Há uma vírgula ali, um vocativo. Quando o preto fala, o branco cala, ou deixa a sala com o veludo nos tamancos.
João Cabral de Melo Neto, no leito da morte, aceitou que pudesse ter errado… Não corre esse risco?
Não sei dizer, porque eu não estou no leito na morte (risos). Mas eu errei em tantas coisas, eu não quero ser infalível. Eu sou de carne e osso, admito minhas falhas e as minhas arestas. O que eu posso dizer, com segurança é que eu sou uma pessoa boa. Eu não sou uma pessoa má. Não tenho ódio e rancor no meu coração. Não quero mal aos outros. E se eu fizer mal a alguém é para me defender.
Quando foi a última vez que você chorou?
Na morte do Alex (garoto morto pelo pai, que não admitia que a criança tivesse trejeitos afeminados).
Consegue se relacionar, nas horas vagas?
A madrugada é o meu horário de ler, de assistir séries, sou louco por Game of Thrones! Tenho muito pouco tempo para paquerar. A minha situação atual dificulta muito a paquera.
No Congresso, não é possível um flerte?
Pelo amor de Deus! (risos) O Congresso é o lugar muito mais difícil para paquerar. Quando as pessoas me vêem nos corredores, passam correndo. (risos).
Há muitos gays no Congresso?
Tem pessoas no armário, mas nenhum armário fecha totalmente a orientação sexual . E a saída do armário é a decisão de cada um. Eu não posso forçar ninguém a sair do armário. As pessoas tem o seu tempo.
O seu novo livro se chama Tempo bom, tempo ruim. Como você definiria o momento atual?
Peguei essa frase de Caetano Veloso para retratar esse tempo que a gente vive. Temos um amadurecimento da democracia, as manifestações de junho, o rolezinho acontecendo, o funk emergindo como uma força cultural da periferia e da favela, novos ativistas do movimento LGBT, vivemos uma efervescência política e ao mesmo tempo temos um fundamentalismo religioso, temos justiçamento com as próprias mãos, temos um recrudescimento do conservadorismo, um avanço do agronegócio, um capitalismo cada vez mais selvagem … São tempos muito ambivalentes. Estamos vivendo tempos bons e ruins simultaneamente.
Por último, a Copa. Você endossa as críticas de parte da população, contrárias ao Mundial?
Para mim a Copa foi muito bem vinda. A Copa despertou uma parcela expressiva da população brasileira para uma série de questões como, por exemplo, os gastos públicos, o destino dos recursos do orçamento. A Copa nos ajudou a pensar isso. Eu acho que a demanda pela transparência pública aconteceu por causa do Mundial. Nesse sentido, só ganhamos. Exclusivamente nesse sentido.
E no que tange à Fifa?
É muito importante questionar a centralidade e o poder da FIFA. Escutar, do povo: “Que história é essa? Futebol é uma arte e nos pertence! Como você chega aqui e define, em um raio de tantos quilômetros, quem vende, quem não vende, o que pode o que não pode?!”. Vemos como a Rede Globo dá uma trégua na dura crítica ao governo para promover a Copa do Mundo. Eles não podem deixar de promover o evento, pois ganham muito com ele. A Globo vinha batendo no governo, neste governo que trouxe a Fifa, a Copa… Aí, chega um ponto em que a crítica cessa, para não prejudicar os lucros…. Estamos questionando como o futebol é gerido pelos cartolas, pelos conglomerados de comunicação e pelas grande marcas. Endosso todos os questionamentos. Não me meto para dizer se o Neymar joga mal ou joga bem. Mas, sou um amante do meu país e quero transparência.
O “gigante” dormiu?
O gigante nunca dormiu. Quem diz que o gigante dormiu não conhece a história. Nunca ouviu falar da Revolta dos Emboadas, da Guerra dos Mascates, da resistência na ditadura militar… Quem estava desperto, lutando por um país melhor, de formas diversas, continua esperto. Não tem o volume de pessoas que teve em junho (de 2013), mas existem manifestações acontecendo no país inteiro. Garis, metalúrgicos, metroviários, estudantes… Há convulsões em todo lugar. As novas tecnologias da comunicação e da informação transformaram as nossas estruturas cognitivas, a nossa maneira de lidar com o mundo e com as pessoas. É irreversível, não há controle.
Iria para as ruas?
Estou nas ruas há tanto tempo. Estou nas ruas desde o movimento pastoral. Estive nas ruas em um movimento que deu origem aos movimentos de junho, que foram as comissões extraordinárias de direitos humanos. Eu estou nas ruas! Eu sou um deputado que reconheço e obedeço a liturgia do cargo que eu ocupo, mas também sou um ativista. Tenho uma relação intensa com os movimentos sociais e quero mantê-la sempre. Sempre!
Podemos falar de assuntos pontuais?
Sim.
Acredita que o debate acerca da legalização da maconha possa avançar?
Está avançando! Muita gente saiu do armário para defender essa questão. São tantos, nesse país, que usam, mas poucos admitem.
Você defende o uso recreativo e medicinal?
Sim! A ideia é torná-la legal. Atualmente, nós temos duas drogas legais, e eu insisto em usar esse termo, porque tabaco e álcool são drogas. A imprensa, e aí eu me incluo porque eu sou jornalista, usa “droga” como sinônimo de droga ilícita. Rivotril, tabaco e alcool são drogas lícitas muito consumidas. A sugestão é incluir a maconha entre elas. Ou seja, todo o regulamento de comércio e consumo passará a valer também para maconha, com as devidas especificidades, como a quantidade permissível de consumo. Quanto ao lado medicinal, defendo que uma mãe que tem um filho com epilepsia, por exemplo, possa recorrer aos benefícios para reduzir os danos e os efeitos da doença. Não defendo a maconha prensada, manipulada. Acho fundamental que um rótulo acompanhe o produto, trazendo os impactos que possam ser gerados pelo uso.
"As pessoas são hipócritas do mesmo jeito que acontece com as drogas" |
A liberdade individual. Eu posso fazer uso do meu corpo do jeito que eu bem entender! O meu pai teve câncer na língua por causa do uso de tabaco. Desenvolveu e morreu com 57. Meu pai sabia que o cigarro fazia mal a ele. É um direito do cidadão, é a liberdade. Ele foi informado dos males, então ele decide.
Esse conceito de “a escolha é minha” não abre um perigoso preceito de que a pessoa possa fazer uso de qualquer substância? Da maconha à heroína?
Em última instância, abre sim. Mas devemos encarar isso. Existem drogas maléficas que são vendidas em farmácias. Somos uma sociedade drogada, de certa forma. Se não de álcool, tabaco e maconha, temos as tarjas pretas. Enfim, precisamos regulamentar e fomentar outra forma de vida.
Você já consumiu maconha?
Eu já consumi recreativamente. Não tenho problema nenhum em admitir isso. Consumi na época da faculdade, e diria que não consumo, hoje, porque não é legal. Talvez, quando for legalizada e regulamentada, eu volte a usar. Eu consumi na época da faculdade, estava no contexto de liberdade, das contestações universitárias. Mas depois não.
Outro ponto controverso é a sua tentativa de regulamentar a prostituição. Por que o assunto gera tanto incômodo?
As pessoas são hipócritas do mesmo jeito que acontece com as drogas. Existe uma demanda muito alta de pessoas que se utilizam dos serviços das prostitutas, mas ao mesmo querem mantê-las na marginalidade. Isso é surreal.
Você acha bacana a ideia de pensarmos na prostituição como uma opção de carreira profissional?
Eu não acho isso bacana não. As escolhas são de cada pessoa. Nem acho que isso deve ser estimulado. Isso não existe. É loucura achar que a regulamentação de uma profissão vai aumentar o número de prostituas. A profissão de antropólogos foi regulamentada e nem por isso o número de antropólogos aumentou. As pessoas tem uma fantasia muito maluca. E tudo isso é fruto da marginalização da prostituição. Vivemos em uma sociedade que construiu muitos tabus ao redor do sexo. As pessoas não vivem livremente a sua sexualidade, e a ainda querem policiar a alheia. Onde já se viu isso?
Falemos da questão da homossexualidade. Com tanta intolerância e episódios de violência, o sair do armário está se tornando mais arriscado?
Viver com medo é viver pela metade. Não tem armário que esconda. O armário nunca é suficiente, o armário sempre tem um cupim corroendo, o armário sempre é de vidro. É melhor você fazer essa passagem da vergonha para o orgulho. É melhor estar aqui fora, sair dos mistérios dolorosos, para vir para os mistérios gozosos . Eu não questiono a heterossexualidade de ninguém, porque as pessoas tem que questionar a minha homossexualidade? Por que elas tem que achar que eu sou um sujeito menor, que merece menos direitos por causa da maneira que eu amo? Que história é essa?
Você recebe muito ódio, ameaças… Teme por sua integridade física?
Eu temo porque é muita gente maluca no mundo. Esses ódios e preconceitos são muito arraigados nas pessoas… É gente maluca que adoece por conta dessas repressões sexuais, que elas não conseguem lidar… Eu tomo sim os meus cuidados. Mas também não vou sair da cena pública por causa disso. Não vou me calar. Estamos em um processo de transformação e esse processo vai seguir. Independente de mim.
Já apanhou por ser gay?
Desde que eu me entendo por gente, eu sou alvo de ódio, de deboche, da chacota. Uma vez indo para a igreja, um cara veio do nada e me deu um soco. E é claro que ele me deu esse soco porque ele viu que eu era gay pelos meus trejeitos. Discriminação… isso já aconteceu muitas vezes na minha vida. Mesmo hoje aqui, no Congresso. Mas, tenho humor, ironia e deboche para desconstruir os escroques. Eles comem dobrado comigo aqui. Eu me fiz um homem com repertório vasto de conhecimento, e essa é a minha grande arte e arma.
Outro preconceito que você combate é o racismo…
Não sou branco, me considero negro, sempre me afirmei como negro. Mas não posso ser ingênuo de acreditar que eu e uma pessoa de pele preta estamos no mesmo patamar. Uma pessoa de pele preta sofre mais discriminação, é óbvio. Sou absolutamente solidário a causa do movimento negro.
Não é errado dizer “preto”?
“Preto” não tem porque não falar! Acho tão curioso… porque ninguém faz deboche com pessoas que estão em posições superiores? Macho, piadas com brancos, ricos, magros, bonitos. Nunca há. O politicamente correto é sempre evocado para dar freio às lutas das minorias. O desrespeito, na verdade, vem na forma da piada, do insulto.. E aí temos que lembrar de Chico César quando diz: “Respeitem meus cabelos, brancos”. Há uma vírgula ali, um vocativo. Quando o preto fala, o branco cala, ou deixa a sala com o veludo nos tamancos.
João Cabral de Melo Neto, no leito da morte, aceitou que pudesse ter errado… Não corre esse risco?
Não sei dizer, porque eu não estou no leito na morte (risos). Mas eu errei em tantas coisas, eu não quero ser infalível. Eu sou de carne e osso, admito minhas falhas e as minhas arestas. O que eu posso dizer, com segurança é que eu sou uma pessoa boa. Eu não sou uma pessoa má. Não tenho ódio e rancor no meu coração. Não quero mal aos outros. E se eu fizer mal a alguém é para me defender.
Quando foi a última vez que você chorou?
Na morte do Alex (garoto morto pelo pai, que não admitia que a criança tivesse trejeitos afeminados).
Consegue se relacionar, nas horas vagas?
A madrugada é o meu horário de ler, de assistir séries, sou louco por Game of Thrones! Tenho muito pouco tempo para paquerar. A minha situação atual dificulta muito a paquera.
No Congresso, não é possível um flerte?
Pelo amor de Deus! (risos) O Congresso é o lugar muito mais difícil para paquerar. Quando as pessoas me vêem nos corredores, passam correndo. (risos).
Há muitos gays no Congresso?
Tem pessoas no armário, mas nenhum armário fecha totalmente a orientação sexual . E a saída do armário é a decisão de cada um. Eu não posso forçar ninguém a sair do armário. As pessoas tem o seu tempo.
O seu novo livro se chama Tempo bom, tempo ruim. Como você definiria o momento atual?
Peguei essa frase de Caetano Veloso para retratar esse tempo que a gente vive. Temos um amadurecimento da democracia, as manifestações de junho, o rolezinho acontecendo, o funk emergindo como uma força cultural da periferia e da favela, novos ativistas do movimento LGBT, vivemos uma efervescência política e ao mesmo tempo temos um fundamentalismo religioso, temos justiçamento com as próprias mãos, temos um recrudescimento do conservadorismo, um avanço do agronegócio, um capitalismo cada vez mais selvagem … São tempos muito ambivalentes. Estamos vivendo tempos bons e ruins simultaneamente.
Por último, a Copa. Você endossa as críticas de parte da população, contrárias ao Mundial?
Para mim a Copa foi muito bem vinda. A Copa despertou uma parcela expressiva da população brasileira para uma série de questões como, por exemplo, os gastos públicos, o destino dos recursos do orçamento. A Copa nos ajudou a pensar isso. Eu acho que a demanda pela transparência pública aconteceu por causa do Mundial. Nesse sentido, só ganhamos. Exclusivamente nesse sentido.
E no que tange à Fifa?
É muito importante questionar a centralidade e o poder da FIFA. Escutar, do povo: “Que história é essa? Futebol é uma arte e nos pertence! Como você chega aqui e define, em um raio de tantos quilômetros, quem vende, quem não vende, o que pode o que não pode?!”. Vemos como a Rede Globo dá uma trégua na dura crítica ao governo para promover a Copa do Mundo. Eles não podem deixar de promover o evento, pois ganham muito com ele. A Globo vinha batendo no governo, neste governo que trouxe a Fifa, a Copa… Aí, chega um ponto em que a crítica cessa, para não prejudicar os lucros…. Estamos questionando como o futebol é gerido pelos cartolas, pelos conglomerados de comunicação e pelas grande marcas. Endosso todos os questionamentos. Não me meto para dizer se o Neymar joga mal ou joga bem. Mas, sou um amante do meu país e quero transparência.
O “gigante” dormiu?
O gigante nunca dormiu. Quem diz que o gigante dormiu não conhece a história. Nunca ouviu falar da Revolta dos Emboadas, da Guerra dos Mascates, da resistência na ditadura militar… Quem estava desperto, lutando por um país melhor, de formas diversas, continua esperto. Não tem o volume de pessoas que teve em junho (de 2013), mas existem manifestações acontecendo no país inteiro. Garis, metalúrgicos, metroviários, estudantes… Há convulsões em todo lugar. As novas tecnologias da comunicação e da informação transformaram as nossas estruturas cognitivas, a nossa maneira de lidar com o mundo e com as pessoas. É irreversível, não há controle.
Iria para as ruas?
Estou nas ruas há tanto tempo. Estou nas ruas desde o movimento pastoral. Estive nas ruas em um movimento que deu origem aos movimentos de junho, que foram as comissões extraordinárias de direitos humanos. Eu estou nas ruas! Eu sou um deputado que reconheço e obedeço a liturgia do cargo que eu ocupo, mas também sou um ativista. Tenho uma relação intensa com os movimentos sociais e quero mantê-la sempre. Sempre!
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