A primavera ainda não
tem uma semana de vida e já chegaram os primeiros calores. De repente, vejam
só, a brisa fresquinha pára e um bafo vulcânico vem anunciar janeiro. E nem
começaram as natalinas propagandas Ô, Ô, Ô!
Após duas semanas de insistência em oferecer em vão – e de
graça! – no facebook, eis que, hoje, sábado, finalmente, um monte de gente
tocou o timbre de minha casa para pegar filhotes de palmeiras rabo-de-peixe, de
palmeiras imperiais, de pés de jasmim e de pitanga... Levaram uma floresta completa
de meu modesto jardim.
Não é bom contribuir para uma cidade mais verde?
De manhã fiz uma geléia de limão da ilha. Não é tão fácil
como parece. Saiu ótima!
De tarde, como tantas vezes, fui tomar meu expresso no Cafelier
e refazer o mundo com o amigo Paulo. Lá encontro o Eckenberger entre duas
deprés, as irmãs Rita e Cecília, sempre caprichando no visual, a Sandra, a
Reré, sempre de vestido novo, o Renato... Vez ou outra aparece o Bernard Attal
e sua linda Gel. Como o meu bairro mudou desde os anos 70...
Na ampla mesa oval, pego um modesto programa. Anuncia um carnavalito no largo. Vamos lá?
proponho ao velho amigo parisiense, o pintor Bruno.
Vamos! Debaixo das últimas
árvores que as diversas prefeituras esqueceram de arrancar, vários tambores,
prenuncio de uma banda. Como pano de fundo, o forte iluminado. Mais a direita,
a igreja. Nossos antepassados nos deixaram um bairro tão charmoso... Durante
quase quatro décadas, aqui me senti num provinciano povoado, longe da cidade
tentacular. Que pena, após tantos anos, o bairro decretado patrimônio mundial pela
Unesco, continuar maltratado por nossos “irresponsáveis”, se assemelhando cada
dia mais á Massaranduba ou Liberdade!
Pequenos grupos correm pelas ruas pedindo informações
bizarras sobre detalhes das casas do bairro. É o “Botongrafia”, jogo inventado
por uma mocinha de chapéu de feltro que faz curiosas interferências no bairro.
Neste caso uma forma original de levar os moradores a conhecerem melhor seu
bairro e, portanto, a amar-lo. A premiação será oficializada no correto, talvez
o último da capital.
Mas a alma desta nova safra de moradores é um jovem músico,
que carrega sobre seus sólidos ombros a banda “Água no feijão”. Não tardarão em sair do largo, anunciados pelo estranho inseto, longo de uns quinze metros, que adolescentes distraídos devem ter inventado, aguardando um vôo improvável, haja visto os inúmeros buracos.
De repente, toda a rua se transforma num palco alegre e
feliz. Abrem-se portas e janelas para ilustrar a canção de Chico Buarque.
Carro
de som pra quê? Basta algo semelhante a um carrinho de café para aumentar o som
na justa medida. Todos os componentes deste grito de carnaval são, sem dúvida,
de meios culturais, e quase todos moradores do Santo Antônio.
Enquanto vou
fotografando, minhas divagações me levam aos anos 70, quando aqui pousei com minhas
malas e meus sonhos. Súbita emoção por ver o velho bairro renascer, graças a
estes jovens que entenderam a beleza do tradicional casario e, aos poucos, lhe restituem
as magias esquecidas.
Acompanharemos por um bom tempo este momento mágico, singelo
e poético...
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