segunda-feira, 23 de setembro de 2013

AFRONTA A CONSCIÊNCIA NACIONAL

JC Teixeira Gomes

A decisão do Supremo, admitindo novos embargos no prolongado julgamento do mensalão, pode ser encarada de várias maneiras: para o juiz Celso de Mello, o dia foi de triunfo da retórica excessiva, que explica a lentidão e o congestionamento dos tribunais; para os criminosos do PT e seus patrocinadores, um dia de vitória e de desafogo; para os brasileiros, mais um dia de humilhação, desencanto e vergonha.
     A exaustiva veemência com que Mello defendeu os embargos infringentes, que se utilizam contra decisões não unânimes, poderia passar a impressão de que os réus do mensalão já condenados haviam sido injustiçados por aquela Corte. Nada mais enganoso. Durante vários anos, todos eles usaram fartamente um poderoso arsenal de manobras para fugir das punições. Houve um verdadeiro dilúvio de questionamentos, intervenções, medidas protelatórias, usados sem cessar por um batalhão de advogados, pagos a peso de ouro (não raro com sobras do próprio mensalão) para escapar da lei.
    Quando parecia que esse arsenal tinha sido exaurido, a aparição, no cenário jurídico, de novos juízes, como Roberto Barroso e Teori Zavascki, logo apontados como simpáticos à causa dos condenados, definiu, afinal, a aplicação dos embargos “salvadores”, com a entusiasmada adesão dos juízes Lewandowski e Toffoli, menos juízes no processo do que advogados de defesa dos beneficiários da corrupção.
    O primeiro erro que o STF cometeu nesse processo foi o de questionar a vigência dos embargos infringentes. A questão que deveria ter sido logo colocada era saber se, na fase a que tinha chegado o processo, não era afrontosa a aceitação ética de um instrumento notoriamente protelatório, destinado sobretudo a evitar a prisão  dos ladrões dos cofres públicos.
    Sete anos se passaram com a defesa dos réus plenamente assegurada. Nunca, antes, no Brasil, um julgamento se fez tão às claras, com o povo acompanhando diariamente os debates, que levaram a decisões ajustadas ao vasto elenco dos fatos divulgados. Tudo evidenciando a necessidade de condenação das lideranças petistas comprometidas com o publicitário Valério na ladroagem do dinheiro público. Do dinheiro farto, que estava faltando para construir escolas, aparelhar hospitais, aumentar a segurança pública, reorganizar a vida urbana, levar o progresso ao interior e ao campo.
    Abalado com mais essa protelação, obrasileiro não consegue entender por que os condenadosterão o direito de insistir em novos recursos, se todos aqueles até agora amplamente utilizados não foram capazes de eliminar a convicção geral da sua culpabilidade. As mágicas dos setores comprometidos não podem mascarar a evidência dos fatos. A esquerda fanática ou interesseira, que gosta de inventar heróis, não conseguirá transformar Genoíno no Robin Hood do Araguaia, nem Dirceu no campeão da pobreza desassistida. O primeiro foi elogiado no plenário do STF pelo novato juiz Barroso,em atitude insólita, pois continuará julgando o homem que, presidindo o PT, autorizava o publicitário Valério a tomar os empréstimos fraudulentos. E Dirceu era o ministro que, na sala contígua à dopresidente Lula, assegurava o suborno parlamentar, a compra dos votosque esfacelava nossa frágil democracia.
    Esse raro e impressionante julgamento, que começou com a gravidade de uma tragédia de Shakespeare, ameaça terminar como uma pantomina circense. Não é bom para o país que um juiz se comporte como um robô jurídico, infenso ao “clamor das ruas”, principalmente se, no país em questão, a Justiça, tradicionalmente, se mostra sensível à pressão do poder. Punir é sempre doloroso, mas o ladrão dos recursos públicos já puniu a sociedade.

    A crença na justiça independente que o STF plantou nos brasileiros com as condenações de 2012 desabou na última quarta-feira, soterrada pelo verbo diluvial do ministro Mello. Tudo deixa claro que a insensibilidade dos tribunais na aplicação das leis pode favorecer a dissolução moral da sociedade, diante do afrontoso triunfo da impunidade que, na vida pública, é o mais danoso, persistente e irremediável dos males brasileiros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts with Thumbnails