Nunca tive a menor afinidade com burocracia e
papelada. Assim que nunca consegui entender
com clareza como funcionam os editais. Hoje você tropeça nesta palavra a
cada instante, especialmente nos meios ligados a cultura.
O que é um edital? Para as autoridades uma
forma democrática de realisar projetos. Para outros uma excelente forma dos
responsáveis pela cultura empurrar com a barriga e nunca enfrentar polémicas.
Assim que no final de cada ano recebo, em casa
e com serviço personalizado de entrega, um monte de livros que ninguem leu, CDs
que ninguem ouvirá nunca e DVDs de artistas que seguirão desconhecidos. Com os
votos de felicidade para o Ano Novo da Secretaria de Cultura.
Tudo pago com nosso dinheiro.
Como funciona este belo exemplo de democracia?
O secretário escolhe meia dúzia de “especialistas” para analizar os projetos,
dentro dos magros orçamentos previstos, dá um prazo para a seleção dos
contemplados e, depois algum tempo, publica os resultados, aguardando apláusos.
O problema, quando é assunto estadual ou
municipal, reside na escolha dos jurados. Anônimos ou não, numa boa terrinha
como a nossa, sempre acaba filtrando informações de fora para dentro e
vice-versa. Primo, madrinha, cunhado, colega, cada um tem lá seus porquês que a
ética oficial desconhece, a carne é fraca e ninguem é de ferro.
Posso dar um exemplo.
Em fins de Agosto fui até o atelier do Murilo,
lá na rua do Carmo, falar de uma ideia que ocupava minha cuca durante minhas
insônias. Usar as paredes dos dois imóveis do Plano Inclinado do Pilar para
retratar os dois maiores eventos do bairro de Santo Antônio: O desfile do 2 de
Julho na parte de cima, junto a Cruz do Pascoal, e, na parte inferior, a
procissão de Santa Luzia.
Vãrios argumentos a favor deste projeto:
O Murilo é o único artista que usa, na Bahia,
uma linguagem figurativa, despojada de artifícios, para retratar o povo baiano.
É um contador de histórias que podemos colocar algures entre os gravadores de
literatura de cordel nordestinos e os muralistas mexicanos como Diego Rivera ou
David Siqueiros.
O bairro de Santo Antônio está evoluindo de
referência turística para reduto da boemia soteropolitana. Cada semana, mais
artistas, jornalistas, poetas, atores e cineastas vêm morar, abrir uma galeria
ou um espaço cultural.
O Plano Inclinado pode ser muito mais que um
bondinho. Pode se transformar em obligatório ponto de convergência popular e
turistico.
O Santo Antônio pode ser nosso Bairro Alto,
nosso Marais, nosso San Telmo. É só haver um pequeno incentivo das autoridades.
Pois é... O Murilo gostou do desafio. Entrou
num edital municipal para conseguir os modestos R$30 mil que seriam invetidos
no aluguel dos andáimes, na compra dos pinceis e tintas. Retribuição pessoal?
Nenhuma. Trabalharia de graça.
Se fosse uma encomenda, para realisar tal obra
numa superficie superior á 120 m2, nenhum artista no auge de sua profissão
aceitaria menos de R$300.000,00.
Mas os tais jurados acharam a proposta de
pouco interesse para a comunidade. Não sei quem são nem quero saber. Mais uma
vez deram aqui uma prova do provincianismo vigente na primeira capital do
Brasil e a cidade perdeu uma bela oportunidade de enriquecer seu patrimônio
artístico.
Sorria...
Nenhum comentário:
Postar um comentário