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Diz-se que Momo reina nos dias de folia carnavalesca. Pode até reinar, mas, atualmente, quem governa e manda no carnaval de Salvador são as cervejarias.
Nossa prefeitura, há algum tempo, vem se vangloriando de ter feito parceria com duas grandes cervejarias, que, segundo o prefeito, bancariam as despesas do carnaval. O que ele não disse, mas eu já sabia desde sempre, que não sou menino, e também por ser óbvio: quem paga manda. Neste caso, como o pagamento deve ter sido bem alto, o mando tem ganhado ares de desmando. Não vou longe, cito apenas uma situação simples, quase simplória, mas que, apesar disso, exemplifica um caso de roubo do indivíduo, do folião, num dos direitos supremos rezados pela Democracia: o direito de escolha, que em sentido mais amplo refere-se à LIBERDADE de escolha.
Pois bem, está proibida, em amplíssima área desta mui hermosa cidade do Salvador, inclusive em locais fora do circuito, a venda de outras marcas de cerveja, senão as das patrocinadoras Schin e Itaipava. Portanto, problema dos milhares de foliões que não gostem das cervejas produzidas por estas. A sentença foi decretada, o que significa dizer, dane-se a preferência de vocês. Aqui manda o poder do capital, reprima sua vontade, esqueça que há liberdade, tape o nariz e engula o que não gosta. Ou não engula, fique de bico seco, problema seu. Não chega a ser ridículo?
Como graças a Deus há sempre chances de subversão, existem ambulantes vendendo outras marcas. Óbvio. Imagina se no Brasil a gente não iria dar um jeitinho. Só que a coisa se dá de forma tão camuflada e assustada, que alguns foliões se sentem como comprando droga ilícita, contrabando ou algo que o valha. Se duvidar, dá até cadeia... Na quinta-feira última, num boteco do Rio Vermelho, portanto, fora do circuito, uma amiga comprou (ilicitamente???) uma latinha de Skol e colocou sobre a mesa. A garçonete, que inclusive prestava um atendimento bastante cuidadoso e educado, alertou-nos, assustada, que era proibido e que o bar poderia ser multado. Vejam que situação.
Para mim, a gestão de Netinho começa a delinear mais claramente sua fisionomia. Uma gestão de realizações, rapidez na tomada de decisões, algumas de forma organizada, outras atabalhoadamente, fazendo ensaios de erro e acerto com a população. Mas, particularmente, uma gestão de ampliação da participação do segmento empresarial, que pode nos levar a reviver a situação que ocorre agora no carnaval, em que o supremo direito dos cidadãos será muitas vezes submetido ao interesse financeiro de poderosos empresários. Isso cheira à volta da velha marca ACM: aqui eu decido e o que eu decido tá decidido, ai de quem discordar, o que seria um retrocesso.
O que digo aqui parece papo chato de sindicalista ou esquerdista fanático. Não é. Não sou uma coisa nem outra. Trata-se apenas de alguém que está observando com olhos de quem busca ter e manter a consciência e a independência.
Detalhe 1: políticos e empresários só existem porque há eleitores que elegem os primeiros e clientes que possibilitam lucro aos segundos.
Detalhe 2: eleitores e clientes são acima de tudo pessoas, cidadãos. Pessoas e cidadãos têm inteligência e direitos. Fiquemos atentos para não permitir que nos surrupiem ambos.
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