Na quinta-feira
19 de dezembro, o governador Jaques Wagner inaugurou a iluminação “cênica” de
três igrejas no bairro de Santo Antônio, fechando assim, na área cultural, o
sétimo ano de seu mandato.
Cada um
poderá encontrar nesta cerimônia o simbolismo que lhe convier, conforme humor
ou ideologia. Quanto a mim velho –velhíssimo – morador desta parte de Salvador,
só consigo imaginar um play-boy que escolhe com cuidado seu calçado, mas teve a
preguiça de lavar os pés.
Durante sete
anos e dois secretários – o primeiro, umbigista, só pensava em espelhos,
enquanto o segundo brilha pela ausência, a não ser nos aviões oficiais – uma
fabriqueta estatal produziu dúzias de projetos para o centro histórico,
projetos que, após breve aparição nos meios de comunicação, desapareceram para
sempre na escuridão do esquecimento. Isso é após ter devorado boa fatia de
nossos impostos. Não vou entrar agora na
listagem das obras anunciadas e nunca acabadas nem mesmo começadas. Cansei de
reclamar. Esta gente é cega e surda. Só
sabe gastar nossos milhões em viagens, discursos, obras tão faraônicas quanto
inúteis e propaganda. Ah! A propaganda!... Como ironizou um vídeo, seria tão
bom se vivêssemos numa propaganda do governo! Lá a vida é azul e rosa.
Hospitais são fábricas de saúde e sorrisos e escolas produzem pelo menos um Albert
Einstein e três Bill Gates por ano letivo.
Por falar em
milhões, Brasília acaba de anunciar uma generosa cornucópia de centenas de
milhões para a recuperação do centro histórico de Salvador e outros
penduricalhos. E como não podia deixar de acontecer, com a grana chegou a discórdia.
Em vez de canalizar uma boa fatia para o Ipac, o governo estadual achou preferível
entregar o ouro a Conder, da qual, no mínimo, só podemos evidenciar que não
entende nada de restauração de centros históricos, nem que seja de Feira de
Santana. O primeiro resultado é o pedido de demissão do Frederico Mendonça,
diretor geral do Ipac. Com justíssima razão, pois o governo se comporta como se
este arquiteto não tivesse competência para administrar as verbas. Ou pior...
Resta saber se esta dinheirama irá realmente para o centro histórico ou sofrerá
os costumeiros desvios. Em véspera de eleições, tudo é possível.
Voltemos a
meu bairro de Santo Antônio pretensamente tombado pela Unesco. Tinham anunciado
uma ampla e irrestrita reforma de toda a infra-estrutura, começando pelo mais
urgente: o enterro de toda a fiação – eletricidade, telefone etc. - sob a
pavimentação, e retirada do asfalte da Rua Direita. Tinham projetado a
recuperação paisagística do Largo de Santo Antônio. Tinham prometido alargar um
passeio para enfim respeitar os pedestres. Promessas,
promessas e mais promessas...
O pouco que
os moradores conseguiram, após muita reclamação, foi retirar o famigerado
“Ponto de Encontro” dos problemáticos narco-dependentes, idéia certa no lugar
errado, lamentável iniciativa, dizem, de
Madame Fátima.
De resto, os
mesmos moradores sofrem com a permanente e insuportável barulheira dos
guindastes - este bip-bip-bip dá comichões de Columbine - quando são pintadas
fachadas com a desenvoltura e falta de conceito de crianças na idade da creche.
Infelizmente, o resultado não é ingênuo: é somente desastroso. Feito nas coxas,
sem a mínima pesquisa sobre as cores originais – não é muito complicado: basta
raspar a superfície para chegar à primeira camada – o conjunto é grotesco e só
pode satisfazer os que vivem numa novela da Globo. A Bahia continua refém do Ô
pai, Ô. Será que a cornucópia vai mudar nossa desconfiança?
Durante
algum tempo o Secretário de Cultura II divagou sobre a idéia de um Museu do Carnaval,
recusando o óbvio: O carnaval é parte inseparável de uma mais ampla concepção
de cultura popular, sendo portanto essencial, urgente e incontornável, a
implantação de um museu ou centro das culturas populares baianas. É escandaloso
que nenhum dos inúmeros governantes que a Bahia teve nestes últimos cinqüenta
anos, tenha entendido a importância de se preservar a memória da cultura
popular baiana.
Já escrevi,
mas acho essencial insistir: somos a última grande capital brasileira que
continua desprezando sua cultura popular. E se não se respeita a cultura popular,
como iremos sedimentar expressões artísticas contemporâneas que não sejam
tristes plágios de obras pongadas em revistas importadas?
Durante sete
anos vivemos num banho tépido de provinciana mediocridade. Qual a atividade
teatral, coreográfica, audiovisual, musical, museológica, literária de peso
teve o real e decisivo apoio do governo?
Nossos
governantes passam a vida arrotando satisfação ufanista sem nada ter de
consistente e palpável para mostrar aos contribuintes. Contentam-se em oferecer
bilhões a empreiteiros gananciosos. Aqui uma ponte, lá uma transposição
fluvial, acolá um viaduto ou um estádio, divagações que serão prontamente
questionados pelos especialistas – engenheiros, arquitetos, sociólogos etc.
Infelizmente
o quadro de pretendentes a sucessão no palácio de Ondina conscientes da
importância da cultura, não é nada animador. Será que os baianos têm os políticos que
merecem?
Os baianos decididamente têm os governantes que merecem porque são os únicos políticos que conseguem fabricar, incensar e eleger.
ResponderExcluirA questão não é somente histórica.É antropológica.
Primeiramente gostaria de parabenizar o texto. Em relação à sucessão de Ondina é importante desviar os olhos dos partidos da ordem, os tradicionais, e observar mais as novidades, nesse aspecto vale dar uma oportunidade ao PSOL.
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