Por mais que não tentemos nos envolver com política, devemos ter consciência de que ela nos afeta diretamente em nosso cotidiano.
Não podemos mais ficar em silêncio diante do verdadeiro menosprezo que o governo tem tido para com o real artista brasileiro, ou seja: aquele que não está na mídia, não conta com apoio empresarial e não se sujeita a trabalhar de graça.
Continuemos com a discussão acerca das Políticas Públicas de Cultura no Brasil, tendo em mente as questões debatidas no Grupo de Estudos em Administração Musical da UFMA. Aqui, levantam-se mais problemas e perguntas do que respostas e soluções, mas acredito que a criação deste espaço de discussão já é por si só uma vitória.
Creio que todos estão sabendo da aprovação de um projeto da vocalista "Claudia Leitte" de cerca de 5,9 milhões na Lei Rouanet, artista há muito já reconhecida pelas mídias empresariais. Veja uma das reportagens aqui. Tentei ver a planilha de projetos aprovados, porém, o acesso é difícil - e obscuro - pois fica dentro do sistema "SalicWeb" utilizado pela página do MinC.
Mais uma vez, confirma-se toda a discussão que tem ocorrido acerca das lógicas de "apoio" ou "incentivo" à Cultura no Brasil. Primeiro: não se sabe definir conceitualmente o que é cultura, mas uma coisa é certa: da forma como é concebida nas Políticas Públicas, esta é vista como produto de mercado, levando empresas a "investir" (entre aspas porque o dinheiro não provém do lucro delas, mas de impostos, ou seja: é público) sempre no que dá maior "visibilidade". Obviamente, os profissionais responsáveis pela seleção trabalham criteriosamente sobre os projetos - que certamente são bem formulados, pois são escritos por especialistas que se dedicam exclusivamente a isso.
Assim, a grande pergunta que se faz é: quando os artistas em geral vão ter espaço de fato em meio a esta verdadeira indústria de captação de recursos? Certamente os artistas emergentes ou que se propõem a trabalhar com uma estética que não está "em alta no mercado da Música" não tem dinheiro para contratar produtores culturais capazes de captar recursos, além de não possuir conhecimento específico para tal - fato justificável, uma vez que devem se dedicar à produção artística, a futura "mercadoria" que desperta olhares cobiçosos de empresários e produtores culturais. Assim, a própria legislação exclui grande parte da produção artística nacional. E quem ganha não são os artistas, mas as empresas (mais publicidade), empresários e produtores culturais (captam recursos). A sociedade, então, fica condicionada a ouvir as mesmas produções que invadem seus domicílios a partir da televisão e do rádio e, assim, também não ganha. Em piores condições que a Educação no Brasil, só mesmo a Cultura.
Ao pensarmos em Democracia, sabemos que todos são iguais perante a Constituição. Assim, a Constituição trata de forma diferenciada as diversas etnias, religiões, condições trabalhistas, históricas e fisiológicas - entre outras - para garantirigualdade de oportunidades a todos. Mulheres grávidas possuem questões próprias na legislação, para lhes dar condições de igualdade em relação aos homens. E na Cultura, o que temos? Precisamos falar em IGUALDADE DE ACESSO À DIVERSIDADE CULTURAL, a partir de Leis para apoio principalmente a artistas- e não a empresários, produtores culturais ou demais oportunistas de plantão - que não dispõem de privilégios da iniciativa privada e das mídias empresariais.
A UNESCO possui um documento chamado "Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural", que deve (ou deveria) ser conhecido por todos aqueles que atuam na área de Cultura. Recomendo esta leitura.
Para finalizar, recordo o assunto discutido na Lista da ANPPOM: o recrutamento voluntário de artistas para se apresentar na Copa do Mundo de 2014, outro verdadeiro absurdo idealizado pelo Ministério da Cultura - aquele que deveria ser o primeiro a defender a seriedade e profissionalismo para a classe artística. E o pior: várias pessoas que jamais quiseram trabalhar com Arte irão se candidatar, principalmente aquelas que não tem compromisso com o trabalho artístico e irão usá-lo como oportunidade para tentar alguma coisa... e assim se perpetua o que se chama de "Arte de má qualidade", que é na verdade a arte produzida sem o compromisso de um artista sério, conhecedor da história, das técnicas e do significado cultural de sua produção artística. Assim, perpetua-se a concepção de "Arte" como "qualquer um faz qualquer coisa".
Temos sim que protestar e falar! Mesmo que nada seja feito, que ouçam boas verdades. A classe artística não pode mais ficar estática diante dos seguidos escândalos com relação ao verdadeiro amadorismo e desprezo com que o governo, a iniciativa privada e - consequentemente - a sociedade trata o verdadeiro artista. Ainda, é fundamental reforçar que os artistas "famosos" são mais valorizados por seu poder de influência midiática do que por sua produção artística em si, pois este é o interesse dos contratantes.
A ARTE DEVE SER UM BEM IMATERIAL!
Daniel Lemos Cerqueira
Coordenador de Música
Coordenador do PIBID de Artes
Membro da COPEVE
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
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