sábado, 9 de julho de 2011
A QUEDA DA VEZ
Terremoto em Brasília.
Por Malu Fontes
Nem bem o humor da presidente da República tivera tempo para restabelecer-se da queda de Antônio Palocci de seu ministério no primeiro semestre de governo, eis que outra comédia de erros tem lugar no Planalto, e com cores ainda mais fortes e poluídas. Com uma cabeleira literalmente mais negra que a asa da graúna, emerge na tela nossa de cada dia a figura soturna do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, um tipo de aparência semelhante à dos vilões de meia idade das novelas mexicanas no SBT. Perto do lamaçal em que Nascimento e seus comparsas de partido submergiram em menos de uma semana, as águas turvas de Palocci parecem agora equivaler a um lago de cisnes.
Se o país se assustou com a geometria do aumento patrimonial de Palocci, de 20 vezes em quatro anos, o que dizer da matemática miraculosa que se operou sobre o patrimônio de Gustavo de Morais Pereira, que aumentou 86.500% em dois anos, conforme repetiam em coro todos os jornais e telejornais da semana? Comparado ao de Gustavo, o ritmo da multiplicação do patrimônio de Palocci parece um punhado de moedas guardáveis em um cofrinho de barro em forma de porco.
Apenas dois anos após a criação, com um capital de apenas R$ 60 mil, a empresa Forma Construções, do rebento do ministro, acumulou um patrimônio de R$ 50 milhões.
CANASTRÃO - Em um país em que as estradas ou são como queijo suíço, a ameaçar a vida dos motoristas, ou estão sendo pedagiadas a intervalos geográficos cada vez mais curtos, o fato de uma farra de corrupção e cobrança de taxa de sucesso a empreiteiras operar dentro do Ministério dos Transportes torna o escândalo político da vez ainda mais abjeto. Como se fosse pouco ler toda a sorte de desmandos atribuídos ao senador-ministro agora caído da segunda função, na quarta-feira aparece uma cereja no bolo: um vídeo obtido pela revista Istoé, compartilhado com todas as emissoras de TV e postado no site da revista, mostra a conversa mole de Nascimento negociando obras com um deputado do Maranhão, antes deste oficializar sua mudança de partido, do PDT para o PR, o partido do ministro, um das bases de apoio do governo no Congresso.
O tom mafioso da conversa é claro: é só mudar de partido que haverá mais dinheiro, travestido de orçamento de obras milionárias de interesse público mas que dificilmente saem do papel. E, quando saem, custa 10 vezes mais e cumprem 10 vezes menos das promessas constantes no orçamento inicial. Para tornar a cena ainda mais politicamente pornográfica, quem intermediava a negociação da compra de novos parlamentares para o PR, na cena do vídeo e na rotina do Ministério dos Transportes, era o impagável Valdemar Costa Neto, outro canastrão de vida e fôlego longos na história recente da corrupção brasileira, um dos réus do mensalão e cujo enriquecimento com dinheiro público já obteve a proeza até de ir parar nas colunas sociais, quando sua ex-mulher, uma socialite paulista, Maria Cristina Mendes Caldeira, num desses acessos de ex, contou o que sabia e mais um pouco. Neto acabou renunciando ao mandato para não perder os direitos políticos e, claro, na próxima eleição conquistou o mandato de volta, graças à benevolência dessa categoria sempre tão compreensiva da sociedade brasileira, o eleitorado.
MAFALDA E O PIG - O fato é que a queda do segundo ministro em menos de um mês não soa nem um pouco agradável para Dilma Roussef, sobretudo porque é bom não esquecer que ambos caíram de podre não por iniciativa, mão firme ou vigilância bem sucedida do próprio governo, mas porque a imprensa denunciou. A multiplicação dos dinheiros de Palocci veio à tona em manchete da Folha de S. Paulo em maio e os episódios de corrupção explícita foram tornados públicos pela revista Veja da semana passada.
Como diz a precoce Mafalda em uma das tirinhas geniais de Quino, deve ser “horrível bater em alguém que tem razão”. Ou seja, a parte do governo e da própria imprensa que reivindica para si a alcunha de blogueiros progressitas podem até repetir a cantilena de que a Veja e a Folha fazem parte do Partido da Imprensa Golpista, o tal PIG, mas não há como negar que a ribanceira em que Palocci e Nascimento colocaram o Governo Dilma não foi invenção de porquinhos nas redações dos dois veículos para desestabilizar o governo.
Malu Fontes é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura e professora da Facom-UFBA. Texto publicado originalmente em 10 de julho de 2011, no jornal A Tarde, Salvador/BA. maluzes@gmail.com
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