A saga dos activos do Grupo Espírito Santo (GES) contabilizados a preços exorbitantes para esconder a real exposição do BES a negócios imobiliários em Angola conheceu um desenvolvimento importante no chamado projecto Acquaville.
Imóvel em Talatona foi avaliado acima do preço real para esconder dificuldades no negócio imobiliário em Angola.
Tal como o SOL revelou na semana passada, em 2013 houve um conjunto de cinco transferências de créditos da Escom para sociedades-veículo, através do BES Angola (BESA).
Essas transacções, executadas no mesmo dia, atingiram valores surreais e tinham como finalidade criar, no papel, preços mais apelativos para os activos. No fundo, uma espécie de perdão de dívida encapotado à Escom que, com a artimanha, se libertava de dívida. Em contrapartida, essas operações seriam, a prazo, penalizadoras para as contas do BESA, na altura presidido por Rui Guerra. Como estava a financiar projectos acima do preço real, mais tarde teria de registar perdas contabilísticas.
Um dos cinco projectos envolveu um primo de José Sócrates e terrenos em Benguela, como o SOL já noticiou. Acquaville, um empreendimento habitacional em Talatona, no Município de Belas, a 14 quilómetros de Luanda, é outro dos cinco projectos que serviram para camuflar o rombo da empresa.
Neste caso, o imóvel foi avaliado por mais de 170 milhões de dólares para que o BESA pudesse conceder um empréstimo à empresa Prismodico, sociedade-fantasma que ficaria com o activo.
Litígios em tribunal
Neste caso, o imóvel foi avaliado por mais de 170 milhões de dólares para que o BESA pudesse conceder um empréstimo à empresa Prismodico, sociedade-fantasma que ficaria com o activo.
Litígios em tribunal
Mas os pressupostos assumidos na avaliação do condomínio contrariam a realidade. No relatório entregue ao banco, a empresa que avaliou o empreendimento assume que este se encontra «livre de ónus e encargos». No entanto, além dos sucessivos atrasos nas obras, algumas fracções foram sendo vendidas com entradas do respectivo sinal e os litígios em tribunal que se sucederam e arrastam até hoje fizeram com que o grosso do capital por parte dos compradores não tenha entrado na empresa. Com esta manobra, o que foi transferido da Escom para a Prismodico foi mais uma vez um crédito malparado de grande dimensão, à custa do BESA.
Além de fazer tábua rasa dos litígios em curso, o crédito concedido pelo banco assume que a totalidade do prédio está a mudar de dono, quando apenas uma parte ainda não foi vendida. E a Prismodico, que tem como única fonte de rendimento a venda de apartamentos, não tem receitas para fazer face ao empréstimo contraído junto do BESA. A Escom, essa, lavou as mãos com uma redução artificial de dívida.
Neste empreendimento, foram construídas casas entre T3 e penthouse. A avaliação - a cargo da consultora Proprime, a mesma que fez a avaliação dos terrenos do primo de José Sócrates - destaca que o preço do imóvel é também sustentado pela envolvência do projecto. As casas estão em redor de uma praça central ajardinada, com piscina, e os acessos são fáceis. «Caracterizada por ser uma zona nova da Cidade de Luanda, encontra-se por isso em grande expansão», indica o relatório de avaliação.
Na verdade, o condomínio, situado nos subúrbios da capital, não passa de umas quantas torres desabitadas, iguais a tantas outras de uma cidade-dormitório, com dois únicos luxos comuns num país de grandes contrastes: a recepção e o guarda.
Num esclarecimento entretanto enviado ao SOL, a Proprime explica que «é o cliente que apresenta à Proprime os pressupostos do negócio, no sentido que é o cliente que define as razões e as condicionantes da avaliação». A empresa acrescenta que foi contratada pela Escom para fazer a avaliação e que desconhecia «qualquer operação de financiamento em relação aos imóveis avaliados».
felicia.cabrita@sol.pt
joao.madeira@sol.pt
joao.madeira@sol.pt
Nenhum comentário:
Postar um comentário