domingo, 7 de abril de 2013

AS CARCAÇAS DOS "SEM-´ÁGUA"




Se a Bahia não fizer um projeto estratégico, estruturante, para os recursos hídricos e implantá-lo,  mesmo que seja em governos sucessivos, jamais será um grande estado. Reconhece-se que um governo só é insuficiente para atender o vasto semiárido baiano, que está a pegar fogo, assim como todo o Nordeste, pela dimensão da catástrofe da seca que atinge a região. A UPB –União de Prefeituras da Bahia – alerta que 70% do território estadual sofre com o flagelo. O rebanho está sendo dizimado. Antes aos poucos, agora de forma acelerada. Em toda a região nordestina já pipocam movimentos, simbolizados por carcaças de gado que são depositadas em frente a agências do Banco do Nordeste. Aqui, está prevista uma manifestação semelhante para o dia 15, em Feira de Santana.

O “pacote” anunciado pela presidente Dilma Rousseff em Fortaleza foi um blefe, nada além disso. De maneira geral frustrou as entidades vinculada à agricultura e aos rebanhos, como a Federação da Agricultura da Bahia, presidida por João Martins, que considerou “frustrantes às expectativas gerais do setor, porque se esperavam medidas efetivas de apoio à economia, que está em processo acelerado de degradação”. A situação da Bahia é singular. Uma unidade cortada em toda a sua extensão pelo Rio São Francisco, ressente-se de água em seus rios secos que poderiam ser perenizados se houvesse uma política consistente nesse sentido.
 
Para que se tenha uma ideia, a presidente anunciou o seu “pacote”, que não tem significado para o drama que sertão está submetido, mas a verdade é que o Ceará de há muito vem tomando providências contra as estiagens prolongadas que sempre o atingiram e hoje tem armazenado 20 vezes mais água do que o estado da Bahia. Ademais, o governo baiano anunciou, numa tentativa de socorrer o rebanho que resta, 80 mil toneladas de milho, porque, de resto, não há no pasto mais nada para alimentar os rebanhos já reduzidos.
 
A princípio, pode-se imaginar que 80 mil toneladas é muita coisa. Não é. Pelo contrário. Num levantamento feito pela Federação da Agricultura, se forem distribuídos 50 sacos de milho (por produtor) em um mês para alimentar o gado, apenas 26 mil deles serão atendidos, o que representam 15% dos criadores baianos. 50 sacos por produtor pouco significa.
 
Não há nenhuma projeção de chuva para o semiárido baiano, o que gera um processo aflitivo para os criadores. Trata-se de uma das maiores secas em décadas. Possivelmente, a maior em 60 anos. Aliás, não se sabe, ao certo, há quantos anos não acontece um flagelo semelhante. Todas as medidas tomadas, como adutoras, caminhões-pipas e cisternas pouco representam. Este processo de desatenção governamental não vem de agora, mas de governos anteriores, e não poderá ser solucionado, como já citado acima, num só governo. É preciso que haja um projeto estratégico, definitivo, ou a Bahia sempre será um estado com grande parte da sua população na pobreza absoluta, até pela característica do semiárido onde as habitações são esparsas no grande sertão.
 
Lembra a grande obra de Graciliano Ramos, que conta a história de uma família de retirantes, vagando pela terra esturricada, fugindo da seca, acompanhada de uma cadela, Baleia, e de um papagaio que não falava, apenas latia, porque era o som que ouvia da cadela, mais triste do que seu dono. O livro, do ciclo pós-moderno, transformou-se em filme, que apresentou uma visão árida e correta do romance de Graciliano.
 
Esta grande seca que empobrece a Bahia e toda a região poderá ter reflexo mais adiante, nas eleições do próximo ano, até porque os prefeitos dos município atingidos preparam uma marcha para Brasília em busca de medidas rápidas e emergenciais que denominaram de “Marcha dos Sem água”. Se derem sequência às manifestações que já se registram em alguns estados nordestinos e em Feira de Santana acontecerá no dia 15, poderão levar carcaças de boi para a Praça dos Três Poderes. É um símbolo que representa com exatidão o sofrimento dos que não têm água e, em consequência, perdem os seus rebanhos.
 
Enfim, as medidas tomadas pela presidente Dilma, o esperado “pacote”, recebeu críticas generalizadas. Consideram os prefeitos que as desonerações fiscais agravam a situação, segundo eles por reduzirem o repasse para os municípios. De resto, relembro um verso do saudoso Luiz Gonzaga ao cantar o drama da seca, chorando na sua sanfona o desespero do nordestino famélico e retirante: “Seu doutor uma esmola/ para um homem que é são/ ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão.”

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