CLÁUDIO MARQUES
Nem se discute, aqui, o esboço do projeto em termos estéticos. Aparentemente terrível, mas apenas um esboço. A questão é do conceito em si, ou de sua ausência.
Se criada ao custo de R$ 25 milhões, a Arena, em pleno funcionamento, inviabilizará os demais equipamentos culturais da região. Milhares de pessoas travarão o trânsito, não haverá espaço para estacionar. As paredes do cinema, como em todo show já existente na Praça Castro Alves, se transformarão em mictório a céu aberto. O cidadão que quiser ir ao Espaço Cultural da Caixa Econômica ou ao Espaço Cultural da Barroquinha, dificilmente terá sucesso. O Espaço Itaú de Cinema – Glauber Rocha, que possui um dos melhores sistemas de som e projeção do país, e que resiste quase que solitariamente há quatro anos na Praça Castro Alves, ficará às moscas justamente aos sábados e domingos, dias em que possui maior movimento.
A SETUR afirma que a Arena irá comportar peças de teatro, também. Por qual motivo será criado um novo equipamento se já temos tantos na cidade que carecem de cuidado e manutenção? Na Praça Castro Alves, por exemplo, existe o Teatro Gregório de Mattos, que está fechado há quatro anos. O Espaço Cultural da Barroquinha, restaurado, permanece com atividades mínimas. Os dois espaços devem encontrar nova vida agora, com a gestão de Fernando Guerreiro na Fundação Gregório de Mattos, que luta para conseguir verba para colocar os dois equipamentos em funcionamento.
Já existem espaços suficientes para shows na cidade. Gastou-se um bilhão de reais na construção da Arena da Fonte Nova. Um dos argumentos para se empreender tanto dinheiro nesse projeto sempre foi que se trata de uma Arena Multiuso e que lá os mais diversos shows terão lugar.
Nas proximidades da Praça Castro Alves, existe a Concha Acústica, o Museu do Ritmo, as praças Thereza Batista e Pedro Arcanjo, o Trapiche Barnabé, o futuro palco articulado do Pelourinho..... shows, shows, shows!!!!
A lógica das festas em Salvador é onipresente e esmagadora. Estamos perigosamente reduzidos a uma fórmula que já está escancaradamente desgastada. Parece que não podemos fazer outra coisa, desenvolver outras atividades, formar novos públicos e isso nos levará à morte, culturalmente.
Temos que continuar lutando pela diversidade artística na cidade, inclusive musical. Precisamos fugir da lógica das massas. Tudo é alto, barulhento e pensado para multidões.
O Centro Histórico é um lugar precioso, um dos mais belos de todo o mundo. É necessário criar condições para moradias, para pessoas que irão zelar por aqueles espaços cotidianamente. Deve-se priorizar empreendimentos culturais de pequeno e médio portes. É improvável que alguém tenha o desejo de morar ao lado de uma Arena para shows. Mas, é fácil crer que alguém queira morar ao lado de um cinema, dois teatros, dois centros culturais e um museu.
A bagunça em que está imersa a Praça Castro Alves, hoje, afugenta empresários e artistas. Muitos sonham, mas quase todos temem a falta de ordenamento na região.
A Praça e seu entorno precisam, urgentemente, de uma revitalização. Mas, necessitam de coisas mais simples que uma Arena. A fiação elétrica do entorno precisa ser modernizada. As pedras portuguesas devem ser mantidas, mas renovadas. A população precisa de bancos e árvores, pois a praça está árida, inóspita. Precisamos de espaços para bicicletas e mais linhas de ônibus.
A população de Salvador tem o direito a desfrutar desse mirante natural, onde é possível ver o pôr-do-sol e da lua na Baía de Todos os Santos, durante o ano inteiro.
Com tanto casarão em ruínas, vamos gastar R$ 25 milhões para construir uma Arena para shows? Quando vamos começar a cuidar do que já existe?
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