segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

CNJ age contra corrupção no Judiciário ...

... e gera reação corporativa de juízes
Beatriz Bulla - 26/12/2010 - 11h30

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) enfrenta, desde quando foi criado em 2004, a resistência de juízes, desembargadores e até mesmo ministros que não compreendem ou aceitam a existência de um órgão de controle externo para o Judiciário.

Contudo, foi só a partir de 2009 que essa reação corporativa ganhou corpo, justamente quando o Conselho, através da Corregedoria Nacional de Justiça, passou a ter uma atuação disciplinar mais firme, investigando e punindo magistrados acusados de desvio de função ou suspeitos de envolvimento em atos de corrupção.
Nos seus quatro primeiros anos, quando a Corregedoria foi comandada pelos ministros Antonio Pádua Ribeiro (aposentado) e César Asfor Rocha, foram abertas apenas 28 sindicâncias para investigar magistrados. Com a posse de Gilson Dipp, em setembro de 2008, esse número chegou a 113, em um único ano. Essa tendência foi confirmada pela sucessora de Dipp na Corregedoria, a ministra Eliana Calmon, que assumiu o cargo em setembro de 2010.
Logo no início deste ano, 11 desembargadores e juízes do Mato Grosso foram aposentados compulsoriamente por desvio de dinheiro do Tribunal.  Foram punidos ainda dois juízes do Amazonas, um juiz do Maranhão, um ex-presidente da Ajufer (Associação dos Juízes Federais da 1ª Região), um corregedor do TJ do Rio de Janeiro e, em decisão inédita, um ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) foi afastado do cargo por ordem do CNJ.
A decisão dos conselheiros de afastar, em novembro, um juiz de Minas Gerais por preconceito contra a mulher foi a mais polêmica e incomum: a punição se deu pelas declarações machistas que o magistrado proferiu em decisões judiciais.
No total, nos dois últimos anos, o CNJ puniu 34 magistrados, sendo que 18 deles foram aposentados compulsoriamente, a "pena" máxima prevista atualmente pela Loman (Lei Orgânica da Magistratura).
Reações
A reação não demorou a chegar. A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) entrou com uma ação de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) argumentando que a competência para investigar juízes e desembargadores é do próprio tribunal local e não do CNJ, que teria atuação apenas complementar. Essa tese tem apoio dentro classe, com o suporte de pelo menos três ministros Supremo: Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Cezar Peluso.
Peluso, que é o atual presidente do CNJ, tem ficado sucessivamente vencido nos casos em que os demais conselheiros decidem punir magistrados independentemente de haver ou não investigação em curso na Corregedoria do Tribunal de origem. Celso de Mello e Marco Aurélio já concederam liminares a magistrados contra afastamentos e aposentadorias compulsórias estabelecidas pelo CNJ.
Para Eliana Calmon, caso o Supremo limite o poder de investigação do Conselho será o começo do seu declínio. A corregedora argumenta que não é possível imaginar que um do desembargador tenha a liberdade e isenção suficientes para julgar um colega. Ela cita ainda a possibilidade de um Tribunal inteiro estar contaminado por um esquema de corrupção, como no caso de Mato Grosso, o que impediria a atuação de um controle disciplinar.
Caso da Maçonaria
O “caso da maçonaria”, como ficou conhecido, foi o que levou o CNJ a aposentar compulsoriamente dez juízes e desembargadores do Mato Grosso por terem desviado R$ 1,5 milhão do Tribunal de Justiça para cobrir prejuízos de uma casa maçônica.
Entre os afastados estava o então presidente do TJ-MT (Tribunal de Justiça do Mato Grosso), desembargador Mariano Travassos.
Na mesma sessão, o CNJ também afastou da função o ex-corregedor geral de Justiça do TJ-AM (Tribunal de Justiça do Amazonas). O desembargador Jovaldo dos Santos Aguiar foi acusado de vender sentenças e retardar investigações contra outros magistrados.
Exatamente um mês depois, em março, o CNJ condenou mais um magistrado do Mato Grosso com a pena máxima de aposentadoria compulsória. A decisão unânime tomada afastou o desembargador José Jurandir Lima, ex-presidente do TJ-MT, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Ele foi acusado de dar emprego aos dois filhos, em cargos de comissão, sem que eles prestassem de fato os serviços ao tribunal.
Na esteira desse caso, o Senado aprovou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 89/2003, que remove da Constituição Federal uma das punições aplicáveis a magistrados que cometeram faltas graves, conhecida como "aposentadoria por interesse público".
Proposta pela senadora Ideli Salvatti (PT-SC), a PEC recebeu aprovação unânime. Na justificação da proposta, Ideli afirma que a aposentadoria por interesse público é um absurdo, já que, em vez de servir como punição, funciona como prêmio. Para a senadora, a vitaliciedade não deve ser um obstáculo para a responsabilização do magistrado que comete desvios funcionais ou crimes.
A proposta deve ser analisada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania). Se aprovada, será encaminhada a uma comissão especial e depois ao plenário, onde deverá ser votada em dois turnos.
Mais punições
Em agosto, depois de cinco anos de existência, o Conselho pela primeira vez julgou e condenou, por unanimidade, um ministro de tribunal superior. Acusado de participar de um esquema de venda de sentenças para beneficiar empresas de máquinas de caça-níqueis e donos de bingos no Rio de Janeiro, o ministro do STJ Paulo Medina foi aposentado compulsoriamente. Ele já estava afastado do cargo desde que o STF recebeu denúncia contra ele.
Em novembro, a sucessora de Dipp,  ministra Eliana Calmon, afastou o juiz Moacir Ferreira Ramos, ex-presidente da Ajufer. A ministra também determinou investigação sobre o acúmulo irregular de dívidas pela associação, inclusive durante a gestão de outros ex-presidentes. A Ajufer acumulou uma dívida de R$ 23 milhões com a Fundação Habitacional do Exército  (Poupex). Há a suspeita de que pelo menos 235 juízes tiveram seus nomes usados indevidamente em contratos fictícios.
Preconceito em decisões
O juiz Edilson Rumbelsperger Rodrigues, da Comarca de Sete Lagoas, em Minas Gerais, foi punido em novembro pelo CNJ com a pena de disponibilidade compulsória - por meio da qual o magistrado também fica impossibilitado de advogar por dois anos, mas continua recebendo os salários. Rodrigues foi acusado de fazer declarações machistas em decisões que se tratavam de violência contra a mulher.
De acordo com informações do CNJ, em sentença proferida em 2007, o juiz deu declarações incitando que as mulheres seriam inferiores aos homens. "O mundo é masculino e assim deve permanecer", por exemplo, entre outras afirmações de discriminação de gênero.
Para a maioria dos conselheiros, esse tipo de conduta é incompatível com o exercício da magistratura e, portanto, o juiz deve ser afastado. Após o período de dois anos, Edimilson Rodrigues poderá solicitar, ao Conselho, o retorno à prática

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