POR MALU FONTES*
Os beneficiários do Bolsa Família, o principal programa social e de distribuição de renda do governo federal, foram objeto de grande destaque na imprensa e nas redes sociais na última semana em função de três episódios distintos. O primeiro foi o boato fenomenal que atingiu 12 estados do país e gerou caos em casas lotéricas e agências da Caixa Econômica Federal, com direito a tumultos, embates com a polícia e vidros destroçados em agências. A confusão foi gerada por uma informação que não se sabe direito de onde, como e por que partiu (a Polícia Federal aponta até agora para uma empresa de telemarketing do Rio) dizendo que o benefício seria extinto e que o dia 18 de maio era a última data para o saque. O boato acrescentava ainda um detalhe: o valor estava na conta com um bônus especial pelo Dia das Mães.
Em tempos de internet, redes sociais e 0800 para quaisquer serviço público, não houve quem convencesse as multidões de todas as idades que madrugaram e anoiteceram em filas quilométricas para fazer o saque a voltar pra casa antes de inserir seus cartões nos caixas eletrônicos. Muito menos serviram os cartazes nas portas da Caixa negando a informação. E não é que, mesmo sendo boato e 18 de maio sendo uma data distante do calendário de pagamento do Bolsa Família, todos que insistiram na fila até o caixa acharam o valor do benefício na conta e o sacaram?
O segundo transtorno de grandes proporções envolvendo o programa foi a convocação dos beneficiários pelas prefeituras de todo o país, dessa vez verdadeira, para comparecer aos postos de saúde a fim de fazer o acompanhamento condicional da saúde de mulheres e crianças do primeiro semestre do ano. Embora o prazo vá até o dia 28 de junho, o fato é que, talvez com medo de perder o benefício, na maioria das grandes cidades praticamente todo mundo correu para os postos no primeiro dia, gerando outro caos na mesma semana, com gente desmaiando e passando mal em filas desumanas.
Finalmente, o programa foi destaque por um episódio pitoresco. Foi parar nas redes sociais o depoimento de uma senhora do Maranhão aparentemente (pois a fala foi editada e não se sabe que pergunta ela ouviu para dar tal resposta diante de uma câmera de TV) reclamando da falta de reajuste e do valor do benefício. No vídeo, a senhorinha diz que o valor não lhe permite sequer comprar uma calça jeans de R$ 300 para a sua filha, já que, segundo ela, uma calça jeans para uma adolescente custa esse valor. Foi um Deus nos acuda, com Deus e o diabo considerando a mulher um monstro consumista preguiçoso desejando grifes ao custo dos cofres públicos.
Ora, quem combinou com os pobres do Bolsa Família que eles não podem desejar aquilo que a televisão, a publicidade e as bulas do consumismo lhes acenam todos os dias como sendo os ingressos para o paraíso batizado com orgulho econômico pelo país como sendo o reino da nova classe C? Por que raios a TV de plasma na sala dos pobres, bem como o aumento vertiginoso do consumo de produtos ‘diferenciados’, que vão do iogurte para soltar os intestinos até a geladeira frost free em 24 prestações, são comemorados como sinais de pujança da economia e, ao mesmo tempo, uma mulher que sonha com uma calça de R$ 300 para a filha é vista como uma mistura de Geni com Maria Madalena? Os phynos das redes sociais que fiquem aí pendurados em seus lustres achando que beneficiário do Bolsa Família só quer comida.
* Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da Ufba
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