Uma moeda romana encontrada aos cinco anos, nas ruínas de Volubilis, foi a primeira peça de minha – muito modesta e eclética – coleção. Nunca mais parei, nunca me preocupei com angústias do tipo “Onde vou colocar? Será que vai combinar com o resto?”. Muito já se escreveu sobre o espírito do colecionador. Afinal, quais são as motivações? Quais fantasmas ou traumas permeam a ansiosa bulimia de quem amontoa objetos e obras de arte? Não estou falando do dono de polpuda conta bancária que expõe na sua residência porcelanas da Companhia das Índias, pratarias portuguesas ou mulatas de Di, somente para evidenciar seu pretenso requinte e sua posição social. Não. Estou falando do apaixonado, daquele que acorda no meio da noite para elaborar a compra do objeto desejado, faz e refaz contas, avalia sua autenticidade. Estou falando do fanático que não pode viver sem vasculhar todos os antiquários, sebos e brechós, os ateliês dos artistas mais obscuros da cidade onde mora e de qualquer outra por onde passe.
Na Bahia, exemplo extremo e obsessivo foi o Marcelino Nascimento. Não conseguia falar senão de cartões postais. Admirável colecionador, o pernambucano Abelardo Rodrigues, que não se contentava em adquirir qualquer rica imagem sacra. Sabia exercitar um olhar perspicaz e sensível. Cada uma das esculturas que compõem o belo conjunto apresentado no Solar do Ferrão é prova de uma investigação que ia sempre mais longe, procurava personalidade e diferencial, muito além dos elementares critérios de raridade e antiguidade, as duas pilastras que sustentam qualquer coleção envolvendo memória.
Outros, como os barões Thyssen, podem impressionar pelo rosário de nomes famosos, mas não enganam quem sabe analisar criteriosamente museus e salões. O imponente imóvel madrilenho da Castellana não passa de templo de ostentação. Diametralmente opostos, a Wallace Collection em Londres, o Nissim de Camondo em Paris, a Casa do Pontal no Rio, a Bonnet House em Fort Lauderdale ou a Fundação Gilberto Freyre no Recife, são exemplos de colecionadores apaixonados.
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