terça-feira, 12 de abril de 2011

Corrupção começa com fraudes nas licitações

Dyelle Menezes
Do Contas Abertas

Quando alerta que “as fraudes nas licitações públicas são herança maldita, transmitida de uma administração para outra”, o professor Inaldo de Vasconcelos Soares sabe muito bem sobre o peso da afirmação. Especialista na área de controle de orçamentos, Inaldo, hoje, é auditor independente. Mas já atuou como Secretário de Controle Interno do Tribunal Superior Eleitoral, do Supremo Tribunal Federal e foi coordenador-geral de auditoria dos Ministérios da Fazenda, Planejamento, Comunicação e Transporte.

Com tal currículo, que inclui passagem pela Infraero, esse professor dos cursos de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas já traçou um triste diagnóstico da gestão pública, que pode ser lido no livro que escreveu em 2005: “Fraudes nas gestões públicas e privadas”. Trata-se de um roteiro didático de fácil leitura, inclusive, para leigos no assunto, mostrando os diferentes caminhos da ilegalidade na gestão pública.

Em entrevista ao site Contas Abertas, Inaldo revelou que os meios para fraudar as licitações, utilizados por quadrilhas organizadas, são os mais sofisticados esquemas de inteligência.  No outro extremo, a fiscalização pública não consegue acompanhar a agilidade da ação dos fraudadores, muitas vezes até por negligência. Segundo Inaldo, os contratos de informática e terceirização de mão-de-obra lideram o ranking das fraudes.

Esta entrevista vem a propósito das dezenas de denúncias da imprensa sobre o atraso nas obras para o Brasil receber a Copa 2014. Os problemas, frente às exigências de rigorosos cronogramas, sugerem pular etapas legais na contratação de serviços, como as licitações, tal qual aconteceu nas três esferas de governo federal, estadual e municipal, por ocasião dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro, conforme relatórios do Tribunal de Contas da União. Assim, fugindo de etapas importantes para o uso de verbas públicas, revela-se uma das formas de fraudar a Lei 8.666/1993, das Licitações e se concretizar a prática da corrupção.

Especificamente sobre Copa e Olimpíada, Inaldo acredita que as irregularidades são possíveis: “Pode acontecer com todos os eventos internacionais” E alerta: “A sociedade precisa ficar atenta às grandes obras de infraestrutura  que serão realizadas. Estradas, portos, aeroportos, estádios, tudo deve ser acompanhado de perto e fiscalizado em profundidade”.

Confira a entrevista:

CA - Quais são as situações que mais indicam irregularidades nas licitações?

Vasconcelos - O maior índice de irregularidade ocorre na contratação dos serviços, em decorrência da ausência de critérios técnicos.  Os critérios devem seguir os princípios de legalidade e legitimidade. Além de ter duas peculiaridades: a motivação e a necessidade. É sempre essencial, conforme a lei, um parecer emitido pela consultoria jurídica, sendo esse opinativo, e não decisório. O Direito Administrativo determina que o poder público tem o poder discricionário para decidir, desde que tal decisão atenda ao interesse público. Os contratos de informática, obras e terceirização de mão-de-obra lideram o ranking em questão de volume de fraudes.

CA - O Estado possui meios para controle da Administração Pública. Isto tem funcionado?

Vasconcelos - Sim, o Estado possui meios para o controle, mas se torna ausente quando não os aplica.  A ausência do acompanhamento e da fiscalização, a questão do despreparo, da negligência e de interesses não-públicos permitem que os ilícitos continuem a acontecer. Os meios de controle não funcionam pela falta de uma gestão ativa, voltada para o interesse público. O que também é um descumprimento legal, haja vista que a lei tem instrumentos coibidores da fraude (Art. 13 do Decreto Lei 200/67).

CA - A Controladoria Geral da União e o Tribunal de Contas da União têm atuado com eficiência no combate à corrupção nas licitações?

Vasconcelos - Evidencia-se uma melhor preparação desses órgãos de controle interno (CGU) e externo (TCU). Porém, eles ainda patinam na luta contra a corrupção. As fraudes nas licitações constituem herança maldita, transmitida de uma administração para outra. O fato é passível de comprovação devido ao ainda elevado número de transações consideradas ilícitas pelo TCU e confirmadas por decisões judiciais. Os ilícitos e as fraudes afetam o erário público. Vide os acontecimentos de irregularidades narrados pela  mídia.

CA - Com tempo as fraudes ficaram mais sofisticadas. Como evoluíram os sistemas de controle?

Vasconcelos - Sim, as fraudes são complexos esquemas produzidos por quadrilhas organizadas.  Se antes a fraude acontecia de maneira singular (apenas um agente), hoje ela é feita de forma plural, com a participação de pessoas de dentro e de fora do sistema. Os meios para fraudar as licitações utilizadas pelas quadrilhas organizadas envolvem os mais sofisticados esquemas de inteligência. Os sistemas de fiscalização não evoluem na mesma proporção.

CA - Existem muitos projetos para mudanças na Lei de Licitações? Quais os melhores em tramitação no sentido de melhorar esta lei?

Vasconcelos  - A questão não é ausência de legislação, as leis existem. Deve-se levar em conta a morosidade da aplicação da lei de improbidade administrativa no âmbito do poder Judiciário. Além disso, a pouca celeridade da apuração dos ilícitos pelo poder Judiciário e os recursos que protelam, contribuem para o ritmo lento. Um recurso leva dez, às vezes, quinze anos para ser julgado.


CA - Existem riscos decorrentes das mudanças que o governo federal pretende fazer na legislação, para agilizar as obras com a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016?

Vasconcelos - O grande risco é a ausência de planejamento, que possa prejudicar a realização de licitações públicas consistentes. A falta de programação destas contratações de bens, serviços e obras - fugindo das licitações - pode gerar contratação emergencial, que é o grande perigo.CA - Em 2007, o governo extrapolou em mais de dez vezes o orçamento estipulado com o Pan do Rio.

CA - O senhor acredita que isto possa acontecer com a Copa do Mundo e as Olimpíadas?

Vasconcelos -   Pode acontecer com todos os eventos internacionais. A sociedade precisa ficar atenta às grandes obras de infraestrutura  que são realizadas, devido às necessidades dos megaeventos que estão por vir. Estradas, portos, aeroportos, estádios, tudo deve ser acompanhado de perto e fiscalizado em profundidade.

CA - O que é necessário para evitar tais abusos?

Vasconcelos  -  Urgem providências imediatas de forma a se proceder à feitura de uma programação transparente, inclusive com a maior participação dos órgãos de controle. Como no caso do estádio Maracanã, que o TCU já criticou, e da programação em outras obras de estádios de futebol.

CA - Como reduzir os problemas? E como adiantar as licitações, sem riscos para a sociedade?

Vasconcelos  -  É necessária ação eficiente do governo para a realização dos processos de contratação de obras de forma transparente, com acompanhamento e fiscalização em tempo real. Sem gerar prejuízo ao cronograma dos eventos e ao bolso do contribuinte.

Para saber mais: http://www.inaldosoares.com.br/index.asp

Livros: Fraudes nas gestões públicas e privadas – 2005 – Editora Brasília Jurídica/Brasília A gestão eficaz de licitação e contratos administrativos – 2010 – Gráfica e Editora Ideal Ltda/Brasília

Fonte: http://contasabertas.uol.com.br/WebSite/Noticias/DetalheNoticias.aspx?Id=481

Mas claro que é verdade só para o resto do Brasil! Sim, porque aqui temos empresas acima de qualquer suspeita. E se algume ousar afirmar o contrário, será processado. E perderá.
O poder económico é um rolo-compressor...

Um comentário:

  1. Infelizmente a corrupção em licitações é generalizada, seja por parte do Poder Público, seja por empresas particulares que "rateiam" as obras antes mesmo da abertura do edital.

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