terça-feira, 9 de junho de 2015

E AS PEDRAS PORTUGUESAS?

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Salvador vive um surto de primeiro-mundismo. As calçadas da primeira capital do país vêm sendo “requalificadas”, com intervenções voltadas para os deficientes físicos, notadamente, visuais. Entretanto, as pedras portuguesas, registro da nossa herança lusa, cedem lugar ao cimento, símbolo da estética árida e de gosto duvidoso das cidades interioranas, a exemplo de Feira. Será que não dava para escrever uma nova história sem apagar a passada? Será que não dava para pensar um novo conceito de cidade sem maquiá-lo com um padrão Fifa, bobo e alienígena?

Em Lisboa, no Parque das Nações, logradouro revitalizado para sediar a Expo 98, assim como em outros tantos pontos dessa encantadora urbe (preterida por muitos turistas brasileiros, frise-se de passagem), o antigo e novo convivem harmoniosamente. O que prova que é possível, sim, de um lado, desenvolver um projeto de urbanização inteligente, prático e moderno, o qual atenda aos anseios da população, e, de outro, evitar a interferência nas marcas deixadas por administrações anteriores, em especial, no caso lusitano, a que deu início, em meados do século XIX, à técnica de calcetamento chamada, na altura, de “calçada à portuguesa” e que viria a ser aprimorada e exportada com sucesso para o estrangeiro.

Para além de Lisboa, outras capitais europeias replicam essa forma de rediscutir o espaço urbano e brecam, com isso, como bem notou Caetano, a força da grana “que ergue e destrói coisas belas”. Por que, então, em Salvador, museu a céu aberto da história arquitetônica brasileira, importaríamos um modelo made in China sem antes o adequarmos à realidade local, desrespeitando, assim, o legado de nossos hermanos de além-mar? De nada adianta, afinal de contas, perseguir um ideal de fora, se, aqui dentro, a mentalidade que prevalece é a provinciana. Em suma, antes de transformar a cidade num canteiro de obras, é preciso requalificar, em primeiro lugar, o modo como pensamos.

A TARDE, segunda-feira 08/06/2015  

Gabriel de Senna Pondé
Professor e Mestre em Jornalismo, Política e História Contemporânea/Univ.Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Um comentário:

  1. Muito obrigado por compartilhar o meu texto, Dimitri! Voltarei mais vezes ao seu blog. Grande abraço!
    Gabriel Pondé

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