Ele tocou a campainha
de minha casa, num fim de tarde. Precisava desabafar. Hoje, dia feriado, o
conjunto de salas de cinema do Glauber Rocha tinha recebido 18 espectadores até
as 17h,
Quando o trânsito foi finalmente liberado, o público chegou a 870. Mas o normal, em dia feriado, seria de 1500.
Não chovia, a polícia não estava em greve, nem os rodoviários ou os taxistas.
Quando o trânsito foi finalmente liberado, o público chegou a 870. Mas o normal, em dia feriado, seria de 1500.
Não chovia, a polícia não estava em greve, nem os rodoviários ou os taxistas.
Quem abocanhava o espaço? A Globo filmando mais uma
obra-prima!
Cláudio Marques, informado por acaso das filmagens duas
semanas atrás, foi falar com o pessoal da produção. Prometeram reavaliar a
situação. Não fechariam jamais o trânsito completamente. Não filmariam por
tantos dias.
Na véspera das filmagens, mandaram o cronograma. Seriam cinco
dias, no total. Sempre nos fins de semana e feriados.
Trânsito totalmente interditado durante as horas de
filmagem. Ladeira de São Bento, Rua Carlos Gomes, Rua Rui Barbosa, Rua Chile –
desde o palácio Rio Branco - ladeira da Montanha, tudo fechado, mesmo à hora do
almoço, quando atores e técnicos iriam restaurar as energias.
Cláudio Marques estava com lágrimas nos olhos. “Quando pedi
a uma moça da produção para, pelo menos, deixar entrar os carros para o
estacionamento, ela, cínica, debochou: “O mais conveniente seria deixar eles no
quartel dos Bombeiros e subir a pé, até é bom para a saúde”.
No entanto, a administração do GR tem que pagar
funcionários, aluguel, água, energia e impostos. Será que a Globo vai indenizar
o prejuízo?
Perguntei, na minha costumeira ingenuidade: o Espaço
Unibanco não fora avisado?
Avisado? Pra quê? Eles chegam, instalam o circo e, durante cinco fins de semana, a praça não será mais do povo. Se é que ela foi algum dia. Durante cinco fins de semana, o cinema estará ocioso, como a farmácia homeopática, os antiquários, dois hotéis tradicionais, brechós e sebos, restaurantes, bares e o resto do comércio. Ninguém ganhará bulufa para a Globo realizar seus medíocres filminhos e aumentar o pé de meia.
Avisado? Pra quê? Eles chegam, instalam o circo e, durante cinco fins de semana, a praça não será mais do povo. Se é que ela foi algum dia. Durante cinco fins de semana, o cinema estará ocioso, como a farmácia homeopática, os antiquários, dois hotéis tradicionais, brechós e sebos, restaurantes, bares e o resto do comércio. Ninguém ganhará bulufa para a Globo realizar seus medíocres filminhos e aumentar o pé de meia.
Quem é responsável pelas autorizações do uso de espaços
públicos no centro histórico? A Prefeitura? O Iphan? Cada um vai empurrando com
a barriga. O Cláudio, cansado por sofrer o prejuízo dos 33 eventos religiosos
ou políticos somente esse ano, foi bater à porta da Sesp. Resposta: “Eu não
posso enfrentar os evangélicos. Se o Iphan não autorizar, eu mando suspender.”
Cláudio foi bater à porta do Solar Berquó.
Resposta do Carlos Amorim “Eu não posso enfrentar os evangélicos. Se a
prefeitura proibir, eu mando suspender”.
Mas afinal quem manda na Bahia? Não existe na Constituição
uma separação entre religião e estado? Será que voltamos a uma nova forma de
Inquisição?
A autoridade só serve para tentar impressionar quem não faz
parte da dita. Por isso é que o centro histórico de Salvador está no lamentável
estado que envergonha todos os baianos.
Tem cabimento um empreendimento de iniciativa privada do
porte do Glauber Rocha, não receber o mínimo respaldo da prefeitura e do
Estado?
Afinal, é bom lembrar, que nunca os supostos responsáveis pelo
centro histórico de Salvador conseguiram a façanha de atrair no azarado bairro,
como faz este espaço cultural - quatro salas de cinema e duas livrarias - um
público que varia mensalmente entre 18 mil e 28 mil espectadores.
Bem mais que
os orquestrados comícios, sermões e descarregos, cujos interesses não são
exatamente o bem público ou a salvação das almas.
A título de informação, os
dois festivais programados neste final de ano – o Panorama e o Walter Lima –
devem agregar mais de 10 mil participantes em pouco mais de duas semanas,
incluindo uns 50 diretores de cinema, críticos e outros essenciais formadores
de opinião como Violeta Bava, do Festival de Veneza e Miguel Valverde, do
IndieLisboa. As Secretárias estaduais de Cultura e de Turismo, alguma vez,
conseguiram tamanha adesão?
E tem mais: a cada evento, seja ele religioso ou profano, as
pedras portuguesas - que o Exterminador do Futuro odeia e que o Iphan despreza
(vide o Porto da Barra) – são retiradas para instalação de palanques, servindo
então de armas para agredir terceiros, riscar carros e atirar contra as
vitrines.
Outras perguntas se fazem necessárias. Qual será a contrapartida, quando, com
evidente facilidade, as inúmeras filmagens, os intermináveis “eventos” são
autorizadas, cada vez resultando em facadas na qualidade de vida de
soteropolitanos e turistas?
As produtoras pagam alguma taxa pelo uso do espaço público?
No bairro de Santo Antônio, que sobrevive apesar da indiferença dos órgãos
responsáveis, tornou-se uma tradição a rua Direita ou a Cruz do Pascoal serem
monopolizadas por pesados caminhões, parafernálias de cabos e holofotes, monte
de profissionais que abocanham o espaço
e desviam impiedosamente qualquer tentativa de transitar.
Nem os turistas escapam. Terão que carregar malas e mochilas
até as pousadas.
Qual é a contrapartida? Uma imperdível divulgação do
patrimônio material e humano soteropolitano? Já ouvimos a cantilena. Cansamos.
O argumento não funciona mais.
As produções usam e abusam do patrimônio publico e nada retribuem.
Basta!
Queremos paz e direito a trabalhar, descansar e andar pelas
ruas sem proibições de invasores.
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