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sábado, 8 de agosto de 2015

SALVAR A FONTE DA BICA

NILTON NASCIMENTO

Sempre se diz que o processo de favelização, que atinge não só as metrópoles, mas também as cidades de médio e pequeno portes, é, juntamente com a violência que aterroriza o Brasil, os dois principais males da urbanização sem critérios dos dias atuais.
Só que, nessa generalização, não se avalia o papel culposo, em muitos casos até criminoso, de alguns administradores públicos no processo de favelização das cidades. Como?  Veja o leitor esse caso que está acontecendo em Itaparica.
Em uma roda de conversa no Mercado Municipal, local de encontro da intelectualidade e da cidadania itaparicana, recebemos a informação de que a Fonte da Bica, o maior monumento natural de Itaparica, está sob grave ameaça de contaminação das suas nascentes.
As nascentes da famosa água mineral baiana especialíssima pela exclusividade de ser, como nenhuma outra do Brasil, “carbonatada e sulfatada-sódica”, e por isso medicinal, conforme a análise apresentada ao imperador, nos idos de 1878, pelo médico baiano Domingos Carlos, ficam situadas na encosta de uma pequena colina rochosa de 40 metros de altura, coberta por um bosque tropical, quase no centro da cidade.

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Dei-me ao trabalho de ir ao local constatar, in situ, a denúncia. No topo desta colina, que é uma área pública protegida, está crescendo uma favela. Não são barracos miseráveis e sim, vários casas de alvenaria em construção, com seus vários elementos contaminantes do meio ambiente. Uma verdadeira aberração!
Mas, pasme o leitor: a invasão da área foi autorizada e garantida por uma autoridade da administração municipal, em exercício da função, que almeja suceder o atual prefeito no cargo. Segundo uma fonte, a “otoridade municipal” teria permitido, de viva voz, em uma reunião, o cometimento do crime ambiental, como parte da sua campanha à prefeitura de Itaparica. Já imaginaram que belo prefeito ele será se eleito, hein?
A Fonte da Bica é uma das maravilhas da cidade. É uma servidão de mais de 350 anos e já existia quando, em meados do século XVI, foi fundada a povoação da Ponta das Baleias, que deu origem à cidade. As suas águas sempre tiveram ampla utilização medicinal e a sua pureza sempre foi cantada por poetas e prosadores. Frei Manuel de Santa Maria Itaparica, um dos principais poetas do barroco baiano, escrevia sobre as águas de Itaparica:
“Tão cristalinas são que aqui difusa,
Parece nascer a Fonte de Aretusa”.

Portanto, a atitude danosa ao patrimônio público dessa autoridade coloca o atual prefeito de Itaparica numa saia-justa e exige, sem dúvida, a intervenção imediata do Ministério Público. Por ser um tumor no tecido urbano, mas diagnosticado ainda no inicio, as construções que estão invadindo as nascentes da Fonte da Bica precisam ser sumariamente demolidas e a área recomposta, evitando-se, assim, que o mal se alastre. Ou em breve não poderemos mais dizer, como está inscrito no frontispício do parque hidromineral de Itaparica: “Eh! Água fina. Faz véia virá minina”.

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