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terça-feira, 13 de janeiro de 2015

DIETA MEDITERRÂNICA

Portugueses mais interessados na dieta mediterrânica
 

 

O reconhecimento pela Unesco da dieta mediterrânica como Património Cultural Imaterial da Humanidade aumentou o interesse dos portugueses por aquele modelo alimentar, diz o sociólogo Jorge Queiroz em entrevista ao “Diário do Alentejo”. Apesar disso, há ainda um árduo trabalho de investigação, valorização e divulgação a realizar, salienta o autor, que lançou recentemente o livro Dieta Mediterrânica – Uma herança milenar para a humanidade. 

Texto Alberto Franco

Um ano decorrido sobre a declaração da Unesco que elevou a dieta mediterrânica a Património Cultural Imaterial da Humanidade, os portugueses mostram um crescente interesse por aquele padrão alimentar. Segundo o sociólogo Jorge Queiroz, que lançou recentemente o livro Dieta Mediterrânica – Uma herança milenar para a humanidade (Althum.com), tem-se assistido ao “reactivar dos mercados locais”, a “uma procura crescente dos produtos locais e de proximidade e a um renovado interesse pela cozinha tradicional”. Há ainda a registar “muitas iniciativas de associações ligadas ao património, à agricultura, à nutrição, à gastronomia e ao turismo.”
Director do Museu Municipal de Tavira, Jorge Queiroz interessa-se há muito pelo estudo da cultura mediterrânica, tendo participado como coordenador técnico no processo de candidatura. Na sua opinião, a decisão da Unesco “teve resultados orientados para o que é central e decisivo”, ou seja, “um plano de salvaguarda que garanta que o elemento é preservado e transmitido às próximas gerações. É um trabalho que inclui investigação, inventário, proteção, valorização e divulgação, participação de muitas organizações públicas e privadas e sobretudo dos cidadãos.”
A cozinha do Alentejo, exemplo da dieta mediterrânica, “tem um importantíssimo papel neste projecto de valorização da nossa cultura, não apenas no âmbito da restauração e do turismo, mas também na agricultura, no plano educativo e na promoção da saúde das populações”, realça Jorge Queiroz. Tal como o Algarve, região da mesma matriz cultural, o Alentejo tem “as suas comidas de Inverno e de Verão, a riqueza das sopas bem aromatizadas, as migas, as açordas de alho, os gaspachos e as saladas frias, os queijos, a carne de caça e de aves, o consumo do porco preto e do borrego, os peixes de rio…. Os coentros, a hortelã da ribeira, os orégãos, as ‘silarcas’ e tantas outras plantas aromáticas e alimentares são elementos sempre presentes. A doçaria conventual integra a comida de festa e tem o seu papel. Mas importa referir que o excesso alimentar é de natureza festiva e não o quotidiano da dieta mediterrânica”.
É o equilíbrio do modelo alimentar mediterrânico que o torna um dos mais saudáveis do mundo. A dieta mediterrânica “é uma sabedoria milenar de comunidades de camponeses e pescadores, o saber ‘fazer muito com poucos recursos’ praticada por gerações sucessivas”. Ela representa “o equilíbrio entre o homem e a natureza, a protecção da biodiversidade, o consumo de produtos frescos de acordo com a época do ano, cereais, vegetais, legumes e frutas, uso do azeite, vinho, aromáticas, frutos secos.” Sempre que possível, utilizam-se “alimentos produzidos localmente, o que fortalece a economia.”
Mas a dieta mediterrânica é mais do que um modelo alimentar. Ela é “sobretudo um modelo cultural que se expressa nas paisagens, no urbanismo e arquitetura, nas convivialidades, nas artes e nas festividades cíclicas intimamente ligadas aos alimentos.” Nesse modelo inserem-se formas de expressão musical como o cante alentejano, “que está ligado às culturas camponesas, ao convívio social e aos comeres, nas quais a mesa e a música são indissociáveis.”
É possível levar os portugueses, nomeadamente os jovens, a trocarem o actual modelo dominante de regime alimentar pela dieta mediterrânica? Para Jorge Queiroz, “este é um problema de cultura e de saúde pública, não exclusivo dos jovens, mas de todos nós. A alteração passa por uma tomada  de consciência dos problemas, por programas educativos e curriculares de nutrição nas escolas, de prevenção e aconselhamento familiar, legislação protectora da nossa cultura e da língua, da agricultura familiar e dos mercados locais, das paisagens culturais e das sociabilidades. Ao adoptarmos uma ‘cultura de imitação’, seguindo valores, comportamentos sociais e modelos alimentares alheios, estamos a contribuir para a dependência económica do País porque importamos o que podemos produzir e porque facilitamos desequilíbrios alimentares atingem a saúde das populações. Há em Portugal um problema grave de obesidade infantil a par do crescimento das ‘doenças da civilização’, como a hipertensão, a diabetes (6,5 por cento, alguns tipos de cancro. Em suma estamos a ficar mais pobres e doentes”.
A dieta mediterrânica, conclui Jorge Queiroz no seu livro, “não é a nostalgia do retorno a economias de subsistência ou a busca de um paraíso terrestre de vidas solares em mares azul-turquesa”. Nem “será ainda uma ‘mezinha’ para os sérios riscos socioambientais que a humanidade enfrenta”, pois estes requerem soluções diversificadas. Mas ela pode “ajudar a reabilitar comportamentos e práticas de protecção da biodiversidade, de agricultura sustentável, de estilos de vidas saudáveis, de cooperação entre as pessoas e respeito pelas culturas locais.”

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