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terça-feira, 1 de abril de 2014

O GOLPE DE 1964


Entre os principais fatos que antecederam e foram utilizados como justificativa para o golpe de estado perpetrado por militares e setores da sociedade civil, em 1964, é possível traçar ou revisitar, de modo sintético, o calendário e episódios históricos, ilustrados com imagens e fac-símiles de capas de jornais e revistas da época.
Agosto/1961 – Menos de sete meses após tomar posse, Jânio Quadros renuncia à Presidência da República. Alega que "forças terríveis" tinham se levantado contra ele. Analistas políticos creem que Jânio contava com o veto dos ministros militares ao vice-presidente, João Goulart, e com uma reação popular que o levasse de volta à Presidência, dessa vez com superpoderes.
Setembro/1961 – Depois das reações ao veto dos militares, uma solução de compromisso garante a posse de Goulart sob regime parlamentarista. Com a apressada emenda à Constituição, Goulart irá dividir o poder com o primeiro-ministro. Tancredo Neves é o primeiro a assumir o cargo.
Dezembro/1962 – Apresentação do Plano Trienal, elaborado pelo ministro Celso Furtado. Os objetivos centrais do plano eram o combate à inflação sem comprometer o crescimento econômico e buscar promover a realização das reformas necessárias para um desenvolvimento sustentado.
Janeiro/1963 – O sistema parlamentarista é derrotado em plebiscito e Goulart recupera os plenos poderes da Presidência.
Setembro/1963 – Após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) suspendendo o mandato dos sargentos eleitos no ano anterior, centenas de sargentos, fuzileiros e soldados se rebelam em Brasília. Tomam vários prédios públicos e prendem o presidente interino da Câmara dos Deputados e um ministro do STF. A rebelião é sufocada em poucas horas, com o saldo de um militar e um civil mortos. A quebra da disciplina e da hierarquia causa forte reação na alta oficialidade.
Outubro/1963 – Goulart pede ao Congresso autorização para decretar o estado de sítio por 30 dias. Não consegue apoio para a medida já que tanto as forças políticas de esquerda como as de direita temiam ser alvo dos poderes emergenciais.
Janeiro/1964 – Goulart regulamenta a Lei de Remessas de Lucros, que limitava as transferências de divisas para o exterior, contrariando os interesses dos investidores estrangeiros.
13 de março – Pelo menos 200 mil pessoas comparecem ao comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, no que seria o início de uma nova campanha em favor das reformas sociais.
No comício Goulart assina dois decretos: o primeiro nacionalizava todas as refinarias de petróleo particulares, o segundo tornava sujeitas à desapropriação propriedades rurais numa faixa de 10 km à margem de rodovias ou ferrovias federais.
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19 de março – Milhares de pessoas participam da Marcha da Família com Deus pela Liberdade, organizada por várias entidades conservadoras, entre elas a SRB (Sociedade Rural Brasileira) e a UCF (União Cívica Feminina). Segundo fontes divergentes, os participantes ficaram entre 200 mil e 500 mil pessoas.
20 de março – O general Castelo Branco, chefe do Estado-Maior do Exército e um dos coordenadores da conspiração contra o governo democrático, lança uma circular reservada aos oficiais advertindo sobre o que considerava como perigo latente nas recentes medidas do presidente da República.
25 de março – Ministro da Marinha, Sílvio Mota, manda prender dirigentes da Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais. A tropa enviada para fazer a prisão se recusa a atacar os colegas e vários fuzileiros se juntam aos insubordinados, no episódio conhecido como a Revolta dos Marinheiros.
Mota pede demissão. Após negociações, os marinheiros se entregam e são presos, mas logo depois são libertados e anistiados.
O episódio aumenta a irritação dos militares ainda legalistas com a quebra da hierarquia e disciplina.
30 de março – Goulart discursa em reunião de sargentos, no Automóvel Clube, no Rio de Janeiro.
31 de março – O general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª Região Militar, sediada em Juiz de Fora (MG), dá início ao golpe ao movimentar – antes do esperado pelos próprios conspiradores – suas tropas em direção ao Rio de Janeiro, onde se encontrava o presidente. Goulart envia tropas do Rio para deter a sublevação e tenta articular apoio militar entre os comandantes do Exército.
1º de abril – Após a adesão aos revoltosos pelas tropas enviadas do Rio de Janeiro, Goulart decide deixar o Rio e ir para Brasília. Sem condições de organizar uma resistência efetiva, decide ir para Porto Alegre. O golpe seria perpetrado com os apoios da Câmara, através do anúncio do senador Aldo Moura Andrade, dando a vacância da presidência, embora Jango ainda estivesse no Brasil; pelo STF, reconhecendo o presidente da Câmara, deputado Ranieri Mazzili como novo presidente da República e com a mobilização da 4ª Frota dos Estados Unidos para a costa brasileira.
O presidente do STF, Álvaro Moutinho da Costa, filho de general e irmão de coronéis, foi à posse de Ranieri Mazzilli na noite de 1º de abril, rompendo, também, a constitucionalidade na medida em que João Goulart ainda estava em território brasileiro. No dia 17, 48 horas após a posse de Castelo Branco, Moutinho o receberia no Supremo. Em suma, o golpe decorreu de um cerco militar (interno e externo) sustentado pelo Congresso, pelo Judiciário e sob o apoio de setores da classe média e  da imprensa.
Dentre 19 periódicos oriundos de cinco Estados, 17 eram jornais diários, alguns dos quais já não circulam, e dois são revistas hoje extintas.
Apenas três se pronunciaram em defesa da Constituição: “Última Hora”, “A Noite” e “Diário Carioca”. Nos idos de 1964, os dois últimos não tinham muitos leitores. Os outros 16, em diferentes tons, desfraldaram a bandeira golpista.
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2 de abril – Desrespeitando a Constituição do país à época, já que Goulart se encontrava em território nacional, o presidente do Congresso, senador Auro de Moura Andrade, declara vaga a Presidência e empossa interinamente no cargo o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli.
Em Porto Alegre, apesar dos apelos de seu cunhado e ex-governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, para que resistisse,  Goulart percebeu que não havia mais condições para uma reação ao golpe.
4 de abril – Sem que houvesse renunciado ao cargo, Goulart deixa o Brasil e pede asilo no Uruguai.
11 de abril – Um Congresso Nacional já expurgado com as primeiras cassações elege "respeitosamente" o general Castelo Branco presidente da República.
O regime militar
O GOVERNO DO GENERAL CASTELO BRANCO
Em 1964, o Comando Supremo da Revolução, nos primeiros dias de abril, edita o Ato Institucional nº 1, suspendendo as garantias constitucionais estabeleceu eleições indiretas e o Executivo passou a ter direito de cassar mandatos políticos e decretar estado de sítio, sem consultar o Congresso.
Essas medidas atingiram principalmente os líderes do regime deposto e as organizações que exigiam as reformas de base como a CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), a PUA (Pacto de Unidade e Ação) e as Ligas Camponesas. Após estas medidas foram instaurados inquéritos seguidos de processos políticos a cargo da Justiça Militar.
O movimento vitorioso justificava-se como restaurador da economia, abalada pelas constantes greves, e favorável à definição de um padrão de desenvolvimento baseado na livre empresa e associado ao capital estrangeiro.
Politicamente, o projeto do General Humberto de Alencar Castelo Branco, escolhido como presidente, incluía o fortalecimento do Executivo e a segurança do Estado, para os quais foram criados órgãos como o Serviço Nacional de Informações (SNI). A segurança nacional foi o argumento usado para justificar as arbitrariedades praticadas.
 
A repressão do regime militar configurou o nascimento de uma ditadura desde o dia 2 de abril de 1964, com a perseguição a todos que se opunham à nova ordem. Nessa data,  antes mesmo de João Goulart seguir para o exílio, foi organizado em regime de urgência o autodenominado “Comando Supremo da Revolução”, composto por três membros: o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica), o vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha) e o general Artur da Costa e Silva, representante do Exército e homem-forte do triunvirato. Essa junta permaneceria no poder por duas semanas".
1965
Em 1965, realizaram-se eleições para governador em 11 estados e o governo perde em cinco deles. Em resposta, é editado o AI-2, decreto que permitia a intervenção do governo nos estados e municípios e que o Executivo legislasse através de “Decretos-Lei”. Também extingui os partidos políticos e cancela seus registros. A partir daí, passaram a existir apenas dois partidos, a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro).
O
Ato Institucional nº 3 foi decretado logo em seguida, eliminando qualquer vestígio de democracia no país. Esse Ato estabelecia o fim das eleições diretas para governadores e prefeitos das capitais. A partir de então os governadores seriam indicados pelo presidente para a aprovação das Assembleias Legislativas. E os prefeitos seriam indicados pelos governadores.
Em 1966, o Congresso Nacional é fechado, o que provocou a reação de muitos que se identificavam com o movimento. As cassações de mandatos continuaram. Decretou-se também o Ato Institucional nº 4, que dava ao governo poderes para elaborar uma nova Constituição.
No início de 1967, O Congresso foi reaberto, desfalcado de alguns parlamentares, e aprovou uma nova Constituição elaborada por juristas do governo. As atribuições do poder Executivo foram consideravelmente aumentadas e a autonomia dos estados diminuída. O regime instituiu, ainda, um Tribunal Militar para julgar os civis.
Desta forma, o Marechal Castelo Branco pode contar com um Congresso bastante submisso. Foi essa submissão que possibilitou a aprovação de novos atos ditatoriais, como a limitação do direito de greve e a deposição dos governadores de Goiás, Amazonas e Rio de Janeiro.
Não foram apenas líderes políticos e sindicais os perseguidos pelo regime militar. Intelectuais, funcionários públicos, militares e artistas foram demitidos ou sofreram perseguições porque a ditadura os considerava perigosos. Acreditavam que impedindo essas pessoas de exercer sua profissão estariam combatendo o Comunismo. Ao final do governo Castelo Branco, quase quatro mil pessoas já haviam sido punidas.
Mesmo com a institucionalização da ”Revolução”, como desejava o presidente Castelo Branco, a democracia estava longe de ser garantida. Os partidos não representavam os diferentes interesses em jogo, dificultando a participação popular.
Ao nível econômico, o Governo Federal, procurou exercer controle sobre a inflação, incentivou as exportações e passou a atrair investimentos externos. Para controlar a inflação houve uma queda nos salários, o aumento das tarifas públicas e uma diminuição dos gastos do Estado. Essa política favoreceu a negociação do Governo com o FMI, obtendo empréstimos. Os EUA renegociaram a dívida externa do Brasil e várias empresas norte-americanas instalaram-se no país.
O desenvolvimento capitalista brasileiro, do qual se beneficiavam a burguesia e as empresas estrangeiras ou associadas ao capital estrangeiro, precisava das Forças Armadas e dos tecnocratas para exercer funções de controle no plano social e modernizadoras, no plano administrativo.
Ao final do governo Castelo Branco o Alto Comando Militar, escolheu como novo presidente o marechal Artur da Costa e Silva, que era o Ministro da Guerra. Essa escolha foi confirmada pelos membros da ARENA no Congresso Nacional. Para registrar seu protesto o MDB retirou-se do local da votação.
 
O GOVERNO DO MARECHAL ARTUR DA COSTA E SILVA
O Marechal Artur da Costa e Silva tomou posse em 31 de janeiro de 1967. No seu governo, foi criado o PED (Plano Econômico de Desenvolvimento), que continuaria a prática econômica do governo anterior, porem corrigindo os possíveis erros da política de combate à inflação. A política econômico-financeira era dirigida pelo ministro da fazenda Antonio Delfim Neto.
A partir de 1968 o governo Costa e Silva marcou-se pelo rigor com que reprimia as agitações. O então ministro da Justiça, Gama e Silva, desarticulou um movimento conhecido como Frente Ampla, composto por políticos cassados, representantes do MDB, do governo deposto em 64, estudantes e trabalhadores. O programa da Frente era exclusivamente político, exigindo anistia geral, elaboração de uma constituição democrática e restabelecimento das eleições diretas em todos os níveis. Devido à sua diversidade, a coesão ficou dificultada, levando-a ao fracasso. Mas era um sintoma do descontentamento que havia em relação aos caminhos que o regime estava tomando.
No Rio de Janeiro, em 1968, mais de 100 mil pessoas saíram nas ruas em passeata, protestando contra o assassinato do estudante Edson Luís , de 18 anos, no restaurante Calabouço, pela polícia. Também surgiram greves operárias, como a de Osasco, em São Paulo, e Contagem, em Minas Gerais.
O Congresso Nacional foi fechado e, a 13 de dezembro de 1968, editado Ato Institucional nº 5, o mais severo de todos. O AI-5 dava ao presidente da República poderes totais para perseguir e reprimir as oposições. Podia decretar estado de sitio, intervir nos estados e municípios, cassar mandatos e suspender direitos políticos, demitir funcionários, confiscar bens.
Tamanho passou a ser o poder do presidente que seus atos não necesitavam sequer ser submetidos à apreciação do Judiciário. Utilizando o AI-5, o governo prendeu milhares de pessoas em todo o país, entre elas o ex-governador Carlos Lacerda, o marechal Lott e o ex-presidente Juscelino Kubistchek. Fechou o Congresso Nacional por prazo indeterminado. Cassou os mandatos de 110 deputados federais, 160 deputados estaduais, 163 vereadores, 22 prefeitos. Afastou quatro ministros do Supremo Tribunal Federal.
Mesmo sendo um militar linha-dura, Costa e Silva não queria passar para a história como o criador do AI-5. por isso, confiou ao seu vice-presidente Pedro Aleixo, que fora contrário ao AI-5, a missão de elaborar uma nova constituição que substituísse toda aquela legislação arbitrária.
A nova Constituição estava praticamente concluída, quando Costa e Silva ficou gravemente doente e afastou-se da presidência. Uma Junta militar, composta pelos ministros do Exército, da Marinha, e da Aeronáutica, impediu o vice–presidente Pedro Aleixo de assumir o poder. Não confiava no político civil. A Junta Militar governou durante dois meses, de 31 de agosto a 22 de Outubro de 1969.
Nesse curto período, alterou profundamente a Constituição de 1967, dando origem ao novo texto constitucional de 1969, que reforçava ainda mais o poder do Executivo, o mandato presidencial era de cinco anos, foram mantidos todos os atos institucionais decretados depois de 1967, foi estabelecida a pena de morte e o banimento do território nacional para os casos de subversão.
Reconhecendo a impossibilidade de Costa e Silva recuperar a saúde, a junta militar declarou a extinção de seu mandato. E indicou o seu sucessor: o general Emílio Garrastazu Médici. Em 22 de Outubro de 1969, o Congresso foi reaberto depois de 10 meses. Nele não mais estavam presentes os antigos deputados federais, pois haviam sido cassados pelo AI-5.
O GOVERNO DO GENERAL EMÍLIO GARRASTAZU MÉDICI
O general Médici foi eleito indiretamente, ou seja, escolhido pelo Congresso Nacional, tomando posse em 30 de Outubro de 1969. Seu mandato caracterizou-se pelo endurecimento político, com a implantação de censura. A censura tinha como objetivo impedir a divulgação de qualquer notícia que comprometesse a imagem do governo ou mostrasse os problemas do país.
Alguns jornais, como o Estado de São Paulo, por exemplo, não aceitavam a imposição da censura, e em vez de substituir matérias censuradas, deixavam o espaço em branco ou colocavam poesias, em sinal de protesto à decisão do governo. Os jornais que desobedecessem eram proibidos de circular. Dessa forma o povo tinha uma imagem falsa do país, e era levado a acreditar que vivíamos no melhor dos mundos e que seus governantes eram sábios e honestos.
A censura não atingiu somente os meios de comunicação. Também as artes sofreram nas mãos dos censores. Compositores como Chico Buarque, Geraldo Vandré, Gilberto Gil e muitos outros, foram impedidos de gravar ou tiveram suas músicas proibidas de tocar no rádio e na TV. Vários filmes estrangeiros, que os militares consideravam subversivos, foram impedidos de ser exibidos. Textos de teatro foram vetados e montagens suspensas.
Até mesmo a TV sofreu cortes na programação. A censura não tinha limites. Sobre a classe operária, era exercida forte vigilância policial, a fim de evitar qualquer manifestação de protesto. Sobre os estudantes e professores, pairava o ameaçador decreto 477, mediante o qual o governo podia expulsar e demitir professores considerados “perigosos”.
Para estimular o patriotismo, o governo empreendeu agressivas campanhas publicitárias e introduziu no currículo escolar, matérias como Educação Moral e Cívica, Organização Social e Política Brasileira (OSPB) e Estudo dos Problemas Brasileiros (EPB).
A ditadura não admitia criticas nem oposição pacifica. Em meio a isso, um setor da oposição partiu para o enfrentamento armado com o regime. Surgiram vários grupos clandestinos que praticavam ações armadas em algumas cidades. Entre esses grupos estava a Ação Libertadora Nacional (ANL) e o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8). Liderada por Carlos Marighella, e a Vanguarda Popular Revolucionaria (VRP), comandada por Carlos Lamarca. Um outro grupo, vinculado ao PC do B, organizou no inicio da década de 70 um movimento guerrilheiro no Araguaia, sul do Pará. Esses grupos realizaram diversos assaltos a bancos, em busca de dinheiro para financiar a luta política.
Sequestraram diplomatas estrangeiros para trocá-los por companheiros presos, que estavam sendo torturados nos porões dos órgãos de segurança. Todos os lideres desses grupos foram esmagados pela repressão militar. Os militares queriam passar a ideia de que eram patriotas.
O patriotismo foi usado como arma ideológica para combater as oposições. Foi o tempo do “Brasil, ame-o ou deixe-o”. No plano econômico, o governo Médici foi marcado por um período de desenvolvimento que a propaganda oficial chamou de ”Milagre Econômico”. A base dele foi uma gigantesca expansão do setor industrial. Desde 1967, o governo já vinha tomando inúmeras medidas para promover o desenvolvimento econômico.
As industrias foram beneficiadas com isenções de impostos e a ampliação do credito para os consumidores. Com a redução dos custos e o aumento das vendas, as indústrias prosperavam, Além disso, o governo vendia títulos, e com o dinheiro arrecadado, financiava grandes obras. O setor da construção civil foi estimulado com a edificação de milhares de residências, através de financiamentos do Banco Nacional de Habitação (BNH).
Assim, desde o final de 1967, a economia brasileira vinha apresentando grandes índices de crescimento. Esse crescimento beneficiou enormemente os empresários de todos os setores. Mas beneficiou também a classe média, pois significou mais possibilidade de empregos e maiores salários. Com a ampliação dos lucros dos empresários e da renda da classe media, cresceu a demanda por bens industriais, especialmente automóveis.
A grande expansão das vendas no setor automobilístico teve efeitos sobre outros setores industriais. Mas, alem do crescimento recorde no setor industrial, um outro fator que contribuiu para o Milagre Econômico foi a construção de gigantescas obras publicas, como a ponte Rio-Niterói, a duplicação da ponte Ercílio Luz (SC), os metrôs do Rio e de São Paulo, o elevado Costa e Silva, a Rodovia dos Imigrantes, a Transamazônica e a Hidrelétrica de Itaipu.
A construção das grandes obras acelerou o ritmo da expansão econômica. As obras significaram emprego para milhões de pessoas e encomendas para as industrias e empresas de prestação de serviço. Mais gente empregada e mais lucro para as empresas significaram mais consumo p-ara a industria de bens de consumo duráveis, não-duráveis e para a agricultura.
O comércio também se expandiu. Os supermercados e os shoppings centers passaram a fazer parte do cenário das grandes cidades.
Se o comercio interno ia bem, o externo ia ainda melhor. O Brasil deixou de ser essencialmente um país exportador de produtos primários. Uma grande parte das nossas exportações era de manufaturados.
Evidentemente, com todos os setores da economia vivendo um período de grande expansão, o clima só poderia ser de euforia. Otimismo reforçado pela conquista, em 1970, do tricampeonato mundial de futebol.
 
Mas mesmo com todo o crescimento da economia, já havia, entre muitas pessoas, a percepção de que nem tudo andava bem. Afinal, foi o próprio presidente Médici quem afirmou que a economia ia bem, mas o povo ia mal.
A principal vitima do milagre econômico foi a classe operária. Durante o governo Médici, o arrocho salarial foi mantido. O governo manipulava os índices oficiais de inflação de modo que os aumentos salariais sempre ficassem bem abaixo da inflação real.
A região amazônica também foi outra grande vitima do milagre econômico. A pressa de fazer do Brasil uma grande potência levou o governo a permitir uma ocupação desordenada e predatória da região. O governo abriu a Amazônia aos grandes projetos agropecuários. Milhares de hectares da floresta foram queimados e deram origem à enormes propriedades onde o boi ocupava o espaço do homem.
Mas o milagre econômico trouxe problemas graves para a economia brasileira. O financiamento das grandes obras foi feito através de um crescente endividamento externo e interno. A divida externa, alem de aumentar o poder dos banqueiros internacionais sobre a economia brasileira, obrigava o país a consumir uma parcela enorme das suas receitas de exportação a titulo de pagamento de juros. Isso ia colocando obstáculos ao prosseguimento do nosso desenvolvimento.
O governo recorreu também ao endividamento interno. Como gastava bem mais do que arrecadava, freqüentemente tinha que lançar mão da venda de títulos ou emitir dinheiro. O resultado desses dois expedientes foi o retorno da inflação.
 Em 1947, já estava claro que o Brasil necessitaria de outro milagre para sair da crise provocada pelo primeiro.
 Euforia na ditadura
Em 1970, no domingo em que o capitão Carlos Alberto fez o quarto gol contra a Itália, na Copa do México, e deu à seleção a Taça Jules Rimet, e o cobiçado tricampeonato mundial, andar de carro nas ruas brasileiras sem uma bandeira verde-amarela tornou-se uma imprudência.
Os adesivos “Brasil: ame-o ou deixe-o” grudaram em todas as faces de um país em que o PIB subia 10% ao ano, as bolsas disparavam, as obras da Transamazônica começavam e 160 milhões de dólares eram torrados na compra de 16 aviões supersônicos Mirage.
O Brasil estava contagiado pela emoção. Mas o momento inesquecível de autoestima nacional estava aplicado sobre um fundo falso. O “Brasil Grande” era apenas imaginário. Assim, Médici chorou diante da seca nordestina, ao descobrir que a economia ia bem, mas o povo ia mal. A Transamazônica até hoje é uma miragem de empreiteiro.
A classe média, entretanto, comemorava as novas possibilidades de consumo. O paraíso nos anos 70 consistia em tirar o automóvel Corcel da garagem, fazer compras no supermercado, ver futebol na maravilha do ano, a TV em cores, e sonhar com a nova viagem à Bariloche, na Argentina.
GOVERNO GEISEL 1974-1979
O sucessor do presidente Médici foi outro general, indicado pelo alto comando militar e referendado pela ARENA. Ernesto Geisel integrava um grupo dos oficiais militares favoráveis à devolução gradual dos poderes aos covis. Quer dizer, o novo presidente estava disposto a promover conforme suas palavras, um processo gradual, lento e seguro de abertura democrática.
O governo começou sua ação democratizante diminuindo a severa ação de censura sobre os meios de comunicação. Depois garantiu a realização de eleições livres para senadores, deputados e vereadores em 1974. O MDB, único partido de oposição, alcançou uma vitória significativa sobre a ARENA, o partido do governo. Os militares de linha-dura assustaram-se com a vitória das oposições. Os comandantes dos órgãos de repressão do regime militar não suportavam a ideia de uma abertura democrática. Por isso, continuavam agindo com a mesma violência do período anterior.
Em São Paulo foram presos e mortos, nas dependências do II Exercito, o jornalista Vladimir Herzog (1975) e, posteriormente, o operário Manuel Fiel Filho (1976). A sociedade brasileira ficou escandalizada com os atos brutais dos órgãos militares, que diziam agir em nome da “Segurança Nacional”.
O presidente Geisel afastou o general comandante do II Exercito para por fim à onda de violência que indignava a nação. Em abril de 77, prevendo a derrota que o governo sofreria nas eleições de 1978, Geisel decretou um conjunto de medidas que ficou conhecido como Pacote de Abril, colocando o Congresso em recesso temporário, para que fossem feitas respostas políticas. Criou a figura do senador biônico, onde 1\3 do Senado passou a ser composto por senadores nomeados pelo presidente, como forma de garantir a maioria de votos favoráveis ao governo.
O pacote também aumentou o mandato presidencial para 6 anos. A política econômica de Geisel foi desenvolvimentista. Para isso recorreu-se, como de praxe, a empréstimos externos (o Brasil tornou-se um dos maiores devedores do mundo) e ao aumento de impostos, acentuando o descontentamento da população.
Em outubro de 1978, o presidente Geisel extinguiu o AI-5 e os demais atos institucionais que marcaram a legislação arbitrária da ditadura. Ao final do governo Geisel, pode-se dizer que houve certa disputa na eleição indireta para Presidente da República.
Em nome da ARENA disputaram os candidatos a presidente o general João Baptista de Oliveira Figueiredo e como vice Aureliano Chaves. Em nome do MDB, disputaram os candidatos a presidente o general Euler Bentes Monteiro e como vice Paulo Brossard. O Colégio Eleitoral conferiu 335 votos ao general Figueiredo contra 266 dados ao general Euler.
GOVERNO FIGUEIREDO 1979-1985
O presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo iniciou seu governo num momento em que crescia no país a critica política às decisões autoritárias e centralizadas do governo militar. Diversos setores da sociedade brasileira passaram a reivindicar ardentemente a redemocratização do país.
Diante das pressões de toda a sociedade, o presidente Figueiredo assumiu compromisso de realizar a abertura política e devolver a democracia ao Brasil.
Nesse clima de abertura democrática, os sindicatos voltaram a se fortalecer e ressurgiram as primeiras greves operarias contra o achatamento dos salários. Dentre elas, destacavam-se as greves dos operários metalúrgicos de São Bernardo do Campo, sob a liderança sindical de Luis Inácio Lula da Silva.
A campanha da sociedade obteve os primeiros resultados positivos:
A Lei da Anistia, que como dizia o nome anistiava a todos aqueles que foram punidos pela ditadura militar. Assim, muitos cidadãos brasileiros que ainda estavam no exílio puderam, finalmente, regressar ao país. Pessoas que tiveram seus direitos políticos cassados foram reabilitadas na sua cidadania. Mas a anistia não foi irrestrita, milhares de militares punidos não puderam voltar normalmente às forças armadas.
E também o fim do bipartidarismo restrito à ARENA ao MDB. Foram criados novos partidos para disputar as próximas eleições. Surgiram então o PDS (no lugar da ARENA) e o PMDB (no lugar do MDB). Apareceram ainda partidos como o PT, PTB e outros. Foram restabelecidas as eleições diretas para governadores.
No plano econômico, o ministro do planejamento, Delfim Neto, procurou executar o III PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) que tinha como principais preocupações promover o crescimento da renda nacional, controlar a divida externa, combater a inflação e desenvolver novas fontes de energia.
Quanto ao setor energético, o governo buscou através do Proálcool (Programa Nacional do Álcool) substituir progressivamente petróleo importado por uma fonte de combustível nacional, o álcool.
Os outros grandes objetivos do III PND não foram alcançados de forma satisfatória como a Divida Externa e a Inflação. O Brasil, tinha feito empréstimos do FMI, teve que se submeter às exigências dos banqueiros internacionais que passaram a ditar regras de ajustamento da nossa economia.
Sem poder pagar os empréstimos obtidos, o Brasil caiu numa ciranda sem fim. Passou a pedir novos empréstimos pra saldar a divida anterior. Já a inflação foi provocada por uma serie de desequilíbrios econômicos, a inflação começou a explodir no governo de Figueiredo. Bateu recorde histórico, superando a cifra de 200% ao ano. A classe social mais prejudicada com a inflação foi a operária, que teve seu salário corroído dia a dia pela alta absurda do custo de vida.
Outro problema foi o desemprego foi o desemprego, provocado pela falta de investimentos no setor produtivo (expansão das empresas) resultou numa redução do crescimento econômico, cuja conseqüência social mais importante foi o aumento do desemprego.
Em 1983, os níveis de desemprego em são Paulo, Rio de Janeiro e outros estados atingiram uma situação desesperadora. Grupos de desempregados, para não morrer de fome, chegaram a saquear padarias e supermercados para conseguir comida para suas famílias.
Com o agravamento da crise econômica, cresceu também a insatisfação popular contra o governo. Nas eleições de 1982, o povo manifestou eu descontentamento elegendo um grande número de candidatos das oposições nos principais estados brasileiros.
Depois de 18 anos de ditadura, em 15 de março de 1983, assumiram o poder nos estados novos governadores eleitos diretamente pelo povo.
O regime militar se aproximava do fim. Com a renovada força, as oposições políticas passaram a exigir eleições diretas para a presidência da República. A Campanha pelas Diretas foi um dos maiores movimentos político-populares da nossa historia. Nas ruas, nas praças, multidões entusiasmadas, reunidas em grandes comícios, gritavam o lema DIRETAS JÁ! e cantavam o Hino Nacional.
Entretanto, uma serie de manobras de políticos ligados à ditadura militar impediu a realização das eleições diretas para presidente. O principal grupo que sabotou a emenda das diretas foi liderado pelo então deputado paulista Paulo Maluf.
Contrariada a vontade do povo brasileiro, teve prosseguimento o processo das eleições indiretas, criado pelo regime militar. Nessa fase, concorreram para a presidência dois candidatos, Paulo Maluf e Tancredo Neves.
Paulo Maluf era o candidato oficial do PDS, o partido do governo. Entretanto não contava com o apoio efetivo das forças tradicionais que estavam no poder.
Tancredo Neves então governador de Minas Gerais, era o candidato de uma confusa aliança política, composta por ex-integrantes do PDS e membros do PMDB, que se apresentava como a alternativa concreta para que a sociedade brasileira alcançasse o fim do regime militar.
Em 15 de janeiro de 1985, o Colégio Eleitoral reuniu-se em Brasília para escolher entre Tancredo e Maluf. Resultado: 480 votos para Tancredo contra 180 para Maluf e 26 abstenções. O presidente eleito, todavia, há menos de 12 horas da posse, apresenta fortes dores abdominais, febre alta, dificuldade respiratória e tremores, Tancredo Neves é internado às pressas no Hospital de Base de Brasília.
Atônito, o país assiste pela TV ao comunicado do secretário de imprensa do novo governo, Antônio Britto, informando que o presidente sofrera uma cirurgia no intestino. Trinta e oito dias e sete cirurgias depois, morria, em São Paulo, o presidente Tancredo Neves. Em seu lugar assume o vice, José Sarney.
Somente em 1989 aconteceria a primeira eleição direta para a Presidência da República após a ditadura militar e desde 1960. O pleito foi disputado por 22 candidatos - entre eles, Fernando Collor, Lula, Leonel Brizola, Mário Covas, Paulo Maluf, Ulysses Guimarães, Aureliano Chavez, Guilherme Afif Domingos, Roberto Freire, Enéas e Fernando Gabeira. Lula e Collor se enfrentaram no segundo turno. Collor venceu.

Um comentário:

  1. Vivi politicamente antes, durante e depois da ditadura dos militares golpistas. O relato é bem fiel a realidade dos fatos. Parabéns pela apresentação do texto.

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