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sábado, 7 de março de 2015

O SONHO ACABOU

Apaixonados pelo Brasil, Michel e Rose* abriram no princípio dos anos 70 uma agência especializada em terras brasilis na Rue Sainte-Anne, entre o Museu do Louvre e a Ópera de Paris. Pão de açúcar, cataratas, Aleijadinho, o frevo e o maracatu, pato no tucupi e Niemeyer viraram arroz e feijão cotidiano do casal. 
Mas o xodó, o xamego, era sem dúvida alguma a Bahia. Caymmi, Itapõa, moqueca e samba de roda. Graças ao casal, quantos franceses sobrevoaram as dunas do Abaeté em mais de três décadas? Quantos se encantaram com o bambuzal ao sair do aeroporto 2 de Julho? Quantos cartesianos gauleses se emocionaram ao deixar a “Boa Terra”? Quantos entenderam o significado da palavra saudade na fila do check-in de volta ás brumas do Sena? 
Durante anos, Rose e Michel louvaram o Recôncavo e o Porto da Barra. Criaram seus filhos numa idolatria a nossa cultura, nossas areias.
Perto da aposentadoria, veio a realização do sonho tão sonhado. Compraram um terreno no município de Mata de São João. Do lado do interior, já que as economias não permitiam o litoral. Suficiente, porém, para construir uma bela casa avarandada com vista para o futuro quintal de coqueiros, pitangueiras e bananeiras.
Após ansiedades mil - quem construiu casa de veraneio sabe a dor de cabeça - chegou o dia D. A inauguração do sítio, com os dois filhos e amigos vindos especialmente da França. 
Fim de tarde. Abre-se a garrafa de Veuve Cliquot, levantam-se as taças e... e entram seis assaltantes armados. Um com rosto tapado, sem dúvida, um operário da obra recém terminada. Levam laptops, celulares, relógios, jóias, cartões bancários e dinheiro. Distribuem alguns tapas. Adivinhe como se sentiram nossos amigos... 
Aconteceu há pouco mais de um ano. Até hoje não se sabe de inquérito nenhum da polícia.                                           
Michel e Rose não voltaram mais ao Brasil. 
O sitio está a venda. 
O sonho acabou.

*Nomes fictícios.

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